São Paulo, sábado, 08 de maio de 2004

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Ao dizer que juros reais são os menores dos últimos dez anos, partido usou metodologia que existe apenas desde 2001

Dados do BC contradizem propaganda do PT

GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Dados do Banco Central põem em xeque a afirmação de que os atuais juros reais -ou seja, descontada a inflação- são os menores dos últimos dez anos, veiculada anteontem pelo programa nacional do PT na TV, sob o mote "isso é fato, isso é verdade".
Como é tradição na propaganda política, o programa omitiu os principais resultados negativos colhidos pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva, como a queda do PIB (Produto Interno Bruto) e o aumento do desemprego.
Mas, mesmo no caso dos juros reais, apresentado como conquista da gestão Lula, os números dão, no mínimo, margem a dúvidas.
Há três critérios principais para calcular juros reais. Por dois deles, a afirmação de que as taxas são as menores desde 1994 é insustentável, segundo estatísticas oficiais.
No terceiro critério, justamente o adotado pelo programa petista, o problema é a inexistência de números comparáveis no período de dez anos mencionado pelo PT.
Aos fatos: os juros reais de hoje superam os de 2002, último ano do governo FHC, se o cálculo levar em conta o passado -ou seja, as taxas do Banco Central acumuladas nos últimos 12 meses, descontada a inflação do período.
Segundo relatório do BC de março último, a taxa de juros reais medida dessa forma "manteve trajetória ascendente" e chegou a 14% em fevereiro deste ano. Em relatório de março do ano passado, o BC afirmou: "A taxa real acumulada em 2002 situou-se em 5,9%, a menor desde 1991".
Outra forma de fazer a conta é usar a taxa presente do BC -hoje de 16% ao ano- e descontar a inflação projetada pelo mercado para os próximos 12 meses, a partir de pesquisa feita diariamente pelo banco. Por essa metodologia, os juros reais estão em 9,8% ao ano.
Calculada dessa forma, a taxa foi menor nos últimos dois meses do governo FHC, quando, após a eleição de Lula, as expectativas de inflação do mercado dispararam (ver quadro nesta página). Em novembro e dezembro de 2002, os juros reais foram de, respectivamente, 8,41% e 7,87%.

Terceiro critério
O terceiro critério para medir juros reais é o mais sofisticado deles: comparar os juros projetados para os próximos 12 meses -a partir das operações do mercado futuro- com a inflação esperada para o período.
Com base nessa medida, governo e PT sustentam que as taxas atuais, na casa dos 9% ao ano, são as menores dos últimos dez anos.
Problema: a pesquisa do BC que apura a inflação esperada pelo mercado para os 12 meses seguintes só foi iniciada no final de 2001. Não há dados, portanto, para a enorme maioria do período mencionado pela propaganda petista.
Segundo o BC, foram feitas hipóteses para a inflação esperada em períodos passados. Numa economia instável como a brasileira, tal exercício é muito arriscado. Em 1999, por exemplo, na desvalorização do real, houve grande dispersão das projeções de inflação -um banco, o Merrill Lynch, chegou a prever um IPCA de 33% naquele ano; acabou em 8,94%.
Exageros à parte, é fato que os resultados colhidos por Lula na política monetária -queda da inflação e dos juros reais- são melhores que os obtidos no estímulo ao crescimento, na geração de empregos e nos gastos sociais.
Não é por acaso: ao priorizar o controle da inflação, com juros altos e aperto nas contas, Lula obteve reveses omitidos na propaganda: o PIB caiu 0,2% em 2003, primeira queda anual desde 1992 e o desemprego manteve-se em alta.


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