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Lula vai propor nova cúpula ambiental
Sugestão é que conferência, cuja idéia será levada hoje ao G8, ocorra no Rio em 2012, quando expira prazo do Protocolo de Kyoto
Lula gostaria que a reunião hoje dos sete países mais ricos e a Rússia fosse para discutir exclusivamente o etanol e o biocombustível
DO ENVIADO À ALEMANHA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva proporá hoje ao G8, o
clube das sete maiores economias do mundo mais a Rússia, a
convocação de uma nova conferência ambiental, também no
Rio de Janeiro, a Rio+20, porque a data sugerida é 2012, 20
anos depois da Eco-92, o primeiro grande esforço sob o
guarda-chuva das Nações Unidas para enfrentar a mudança
climática.
É também o ano em que perde validade o Protocolo de Kyoto, destinado a enfrentar o
aquecimento global, mas que
acabou produzindo reduzidos
efeitos, na medida em que não
foi assinado pelos Estados Unidos, justamente o maior emissor dos gases que produzem o
efeito estufa e geram o aquecimento global.
No ano que vem, o Brasil será
a sede de uma outra conferência global, também com presença de chefes de Estado, exclusivamente destinada a discutir os biocombustíveis, pelos
quais o presidente se confessa
um "fanático".
Uma das razões para Lula
propor a seus pares uma nova
grande reunião internacional é
o seu temor de que a discussão
no âmbito restrito do G8 "fique
apenas na pirotecnia".
"O que me incomoda é que os
países ricos parecem tomar decisões muito mais para prestar
conta aos movimentos ambientalistas que são muito mais fortes [na Europa e nos Estados
Unidos] do que em qualquer
outra parte do mundo", reclama o presidente Lula.
Por "pirotecnia", pode-se entender o fato, mencionado pelo
presidente, de que os Estados
Unidos não assinaram o acordo
de Kyoto e a Rússia só o fez
mais tarde. Os dois são membros do G8, ao lado de Japão,
Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá.
O tema ambiente ocupou
metade do tempo da conversa
de Lula com a Folha, acompanhada pelo chanceler Celso
Amorim, pelo assessor diplomático da Presidência, Marco
Aurélio Garcia, e pelo ministro
da Comunicação Social, Franklin Martins, enquanto a TV
mostrava os gols dos jogos de
quarta-feira pelas eliminatórias da Eurocopa.
Lula diz que, se dependesse
exclusivamente dele, na reunião de hoje com o G8 "só falaria de etanol e biocombustíveis". São estes os principais temas da conversa com o presidente, divididos por tópicos.
BIOCOMBUSTÍVEIS
O presidente sabe que entra
para a reunião de hoje com o assunto aquecimento global já esgotado, nas reuniões entre os líderes do G8. Mas avisa:
"Eu vou ter dez minutos, cinco minutos que seja, vou ter um
almoço com eles, e quer queiram quer não vão ter que me
ouvir falar de biodiesel, de etanol, de energia limpa".
Lula acha que "o Brasil tem
cacife para colocar a questão do
etanol" em um debate que, até
ontem, ficou centrado no estabelecimento de metas para evitar que o aumento da temperatura média do planeta seja superior a 2C, o que exigiria, segundo proposta alemã derrotada pelos EUA, que houvesse
uma redução de 50% (sobre os
níveis de 1990) na emissão de
gases do efeito estufa até 2050.
A tese do presidente brasileiro vai por outro caminho, assim
descrito por ele:
"Eu compreendo a situação
dos países ricos. Eles têm um
padrão de desenvolvimento,
tem um padrão energético, tem
um padrão de combustível e
não querem mudar. Às vezes,
preferem jogar a culpa nos países em desenvolvimento, o que
é transferir a responsabilidade
de quem de fato a tem".
Passo seguinte: "O biocombustível é uma questão inexorável. Pode levar dez anos, 20
anos, mas o mundo terá que
adotar o biocombustível, seja
por conta do preço do petróleo,
seja por necessidade de ter um
combustível mais limpo".
Corolário: "Se eles vão aceitar mudar a matriz energética,
eu não sei. Mas o dado concreto
é que nunca se discutiu tanto
biocombustível como agora".
Lula folheia os papéis que leva consigo a toda reunião internacional, com números sobre o
uso de combustíveis no Brasil
(16% é álcool anidro ou hidratado, mais limpo que os derivados do petróleo) e sobre a matriz energética. "Nosso quadro
é exatamente o inverso do deles. No Brasil, 89% da energia
procede de hidrelétricas [fonte
renovável], ao passo que nos
países da OCDE, só 12% vem de
fontes renováveis" (a OCDE é a
Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento, formada pelos 30 países
mais ricos do mundo).
O presidente e seu chanceler
lutam com os papéis até descobrirem um dado vital na discussão: em 2003, quando o biocombustível ainda estava engatinhando no Brasil, só a mistura de 23% na gasolina "evitou a
emissão de 27,5 milhões de toneladas de gás carbônico, o que
corresponde à emissão anual
da Noruega", diz Amorim.
Marco Aurélio Garcia reforça, no seu canto: "E a Noruega
produz petróleo leve" (portanto, menos poluente).
Amorim diz também que "a
grande diferença entre a proposta brasileira e a da Alemanha "é que nós vamos diretamente aos meios de combater o
aquecimento", ou seja, pelo uso
dos biocombustíveis em vez
dos combustíveis fósseis (leia-se: petróleo).
DISCURSO DOS RICOS
Lula vai ao ataque até na
questão do desmatamento da
Amazônia, em que o Brasil
sempre ficou na posição de vilão aos olhos do mundo. "O
mundo desenvolvido acha que
pode fazer um discurso e a gente tem que tomá-lo como a palavra final e obedecer", diz.
Depois cita pesquisa feita pela Embrapa com "50 e poucos
cientistas do mundo inteiro",
para analisar o desmatamento
do planeta nos últimos 8.000
anos. Deu o seguinte resultado,
relata Lula: "O Brasil ainda tem
69% de sua floresta original. A
Europa, só 0,03%. E a América
do Norte só fica com uns 20 e
poucos por cento por causa do
Canadá".
FOLHA - Mas eles dizem que não é
por causa dos erros que fizeram no
passado que países como o Brasil
podem agora ficar livres para fazer
os mesmos erros.
LULA - Temos outra proposta
para eles: que o custo do não
desmatamento implique um
novo modelo de desenvolvimento. Quero saber se os países
ricos estão dispostos a financiar os países pobres que resolverem ser mais responsáveis
que eles e não desmatarem.
DESMATAMENTO
O presidente defende a criação de um fundo, pelos países
ricos, para que os países pobres
possam evitar o desmatamento. "Vamos ver se eles topam fazer. Eu estou cheio de criação
de fundo que não funciona.
Fundo é o que mais se cria.
Quanto ao desmatamento na
Amazônica, Lula repete sempre que em dois anos o desmatamento foi reduzido em 52%.
Diz que o próprio Brasil tem interesse em diminuir mais ainda
e anuncia que um satélite a ser
lançado em setembro, em acordo com a China, permitirá receber fotos de duas em duas horas
e, com isso, monitorar com
muito mais precisão a região
amazônica.
(CLÓVIS ROSSI)
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