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São Paulo, segunda-feira, 08 de setembro de 2003

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OPOSIÇÃO

Senador tucano diz que Lula é bem-intencionado, mas "não governa", e afirma que "nunca se fez tanta nomeação política"

Tasso vê governo "fisiológico e centralizador"

VALDO CRUZ
DIRETOR EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

No momento em que o Senado analisa a reforma da Previdência e se prepara para receber a tributária, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), 54, um dos principais líderes tucanos, se diz desapontado com o governo Lula. Em sua opinião, trata-se de um governo "centralizador" e o "mais fisiológico de todos".
As críticas partem de um tucano que, num passado recente, foi muito próximo de Luiz Inácio Lula da Silva. Chegou até a articular uma aliança entre o PSDB e o PT no ano de 1994 para as eleições presidenciais, antes de lançar a candidatura de FHC.
A reportagem da Folha apurou, inclusive, que o ex-governador do Ceará teria tido duas conversas com o presidente, no Palácio da Alvorada, o que ele nega. O certo é que, no momento, Tasso não poupa críticas ao petista. Quando é questionado sobre o principal defeito do presidente Lula, responde sem hesitar: "Não governar". Mas também faz elogios: "É um homem bem-intencionado e de grande sensibilidade"
 

Folha - Qual a expectativa do sr. em relação à reforma tributária, aprovada em 1º turno na Câmara e que logo chegará ao Senado?
Tasso Jereissati -
Ainda não digeri quais foram as modificações nesses acordos da madrugada. Mas a reforma como um todo é muito ruim. É uma não-reforma, um arranjo para atender a interesses de caixa momentâneo de alguns entes da federação. Uma reforma tributária que se preze deveria começar discutindo a questão do pacto federativo.

Folha - Ela aumenta a carga tributária?
Jereissati -
Ah, com certeza.

Folha - O governo do PT quer fazer caixa?
Jereissati -
Claro. É absolutamente centralizador. O mais centralizador de todos.

Folha - Os Estados perdem autonomia em relação à União?
Jereissati -
Essa é a questão. Na verdade, quando você não quer ceder para os Estados e municípios, isso tem implicação política profunda: significa a concentração na União, aumentar o poder político da União, o que desestrutura inclusive os partidos.

Folha - Mas os governadores conseguiram algumas concessões.
Jereissati -
Unidos. Mas tivemos chicote pra lá, chicote pra cá. Tiveram de dar uma recuada. Mas tiveram força no chicote ainda.

Folha - O sr. considera o governo Lula fisiológico?
Jereissati -
Extremamente. É o mais [fisiológico] de todos. Nunca se fez tanta nomeação política. Todos os derrotados do PT foram nomeados. O critério número um foi a nomeação de derrotados. Depois, toda a política de alianças foi feita em função de nomeação.

Folha - O governo tucano também fazia nomeações políticas.
Jereissati -
Este é mais, surpreendentemente mais, porque foi o partido que fez a sua história contra isso. O surpreendente não é que ele seja igual, é que seja mais e use isso com uma desenvoltura muito maior.

Folha - O PT está aparelhando o Estado?
Jereissati -
Tem as duas coisas: o aparelhamento e a questão dos cargos. A conjunção dos dois é um desastre.

Folha - Dê exemplos.
Jereissati -
A Funasa. Vocês sabem que um dos problemas do país é a dengue. No governo FHC, o ministro José Serra baixou uma norma segundo a qual o representante [nos municípios] tinha de ser técnico. É político hoje. A não ser a área do Palocci, não é nem área econômica, o resto é político. Difícil é dizer o que não é. O BNDES é político, hoje tem um aparelhamento lá dentro que, por tudo que a gente ouve, é uma situação de muita confusão.

Folha - Quem é o responsável por essa situação?
Jereissati -
Não sei identificar. É difícil personalizar, mas acho que é uma atitude de governo...

Folha - Dirceu, por exemplo?
Jereissati -
Tenho uma boa relação com o José Dirceu. É um homem competente, sério. Às vezes acho que ele é muito atropelador, joga duro. Por outro lado, não sei o que seria do governo se não fosse ele. Me parece que ele faz as coisas acontecerem no governo.

Folha - Qual avaliação o sr. faz do governo Lula?
Jereissati -
O governo está parado. A não ser o Palocci, não aconteceu nada. Nós já estamos em setembro, fim de ano, é o primeiro ano do governo, não aconteceu nada. O que aconteceu?

Folha - As reformas foram aprovadas na Câmara.
Jereissati -
Até agora não passou. Eu vi a entrevista do Lula dizendo que conseguiu aprovar as reformas em tantos meses. Pegou muito mal aqui ao Senado. A reforma da Previdência não tinha chegado no Senado ainda. Criou um clima: o pessoal vai ter de botar uma emenda agora, a proposta terá de voltar para a Câmara.

Folha - O acordo do governo com o PMDB, que tem ampla maioria no Senado, não vai facilitar a vida do governo?
Jereissati -
No Senado, a representação da federação tem um sentido muito mais forte do que na Câmara. Você representa o Estado. Se você enfraquecer o seu Estado, de uma maneira ou de outra, você está enfraquecendo o Senado.

Folha - O sr. parece um pouco desapontado com o governo Lula.
Jereissati -
Eu estou.

Folha - Qual a análise o sr. faz do presidente?
Jereissati -
Eu acho e continuo achando o Lula um homem muito bem-intencionado, conheço bem o Lula, não tenho a menor dúvida sobre as intenções dele, tem uma sensibilidade muito grande , mas...

Folha - Essas são as qualidades. Quais os defeitos?
Jereissati -
Não governar.

Folha - O que o sr. acha de José Serra vir a presidir o PSDB?
Jereissati -
Eu acho que o Serra é uma das lideranças do partido, foi candidato à Presidência da República e tem todas as condições de ser o presidente do partido.

Folha - É o candidato do sr.?
Jereissati -
Eu não diria que ele é o meu candidato porque eu acho que a questão a gente tem de discutir mais. A gente não pode fechar o caminho assim de maneira tão simples. Mas o Serra é hoje o mais provável presidente do partido, tendo o meu apoio.

Folha - O que levou o PSDB a perder as eleições? Foi a divisão interna do partido?
Jereissati -
Não. Qualquer candidato que fosse perderia a eleição. O poder é como um avião, tem fadiga em determinado momento e é preciso haver uma renovação. Do ponto de vista histórico, foi fantástico para o país. Você ter um operário, de esquerda, sindicalista, presidente da República. Para nós, foi bom porque estava ficando muito desigual a campanha. Eu ia para rua sempre como o mau e eles como bons, era a luta do bem contra o mal. O sujeito era mau porque não dava aumento de salário. Essa discussão acabou, vamos ter uma discussão política muito mais madura nas campanhas de agora em diante.


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