São Paulo, Quarta-feira, 08 de Setembro de 1999
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GOVERNO
Com FHC como o árbitro, idéia é evitar divergências públicas
Tápias e Malan firmam "pacto de não-agressão"

ELIANE CANTANHÊDE
Diretora da Sucursal de Brasília

RUI NOGUEIRA Secretário de Redação da Sucursal de Brasília

DAVID FRIEDLANDER
da Reportagem Local

O novo ministro do Desenvolvimento, Alcides Tápias, 56, fez um pacto com presidente Fernando Henrique Cardoso e a equipe econômica para assumir o cargo: o de que FHC funcione como árbitro de eventuais disputas e que elas nunca se tornem públicas.
Conforme a Folha apurou, o pacto foi selado entre FHC, Tápias e o ministro da Fazenda, Pedro Malan, na reunião do Palácio da Alvorada que precedeu o anúncio do nome de Tápias.
Os ministros Pedro Parente (Casa Civil) e Martus Tavares (Orçamento e Gestão) foram informados do acerto depois.
Também ficou combinado que as decisões, depois de tomadas, deveriam ser seguidas à risca por todo o ministério.
Tápias recebeu a primeira sondagem no último domingo à noite, por meio de um telefonema do ministro José Serra (Saúde). Na segunda-feira cedo foi procurado, primeiro pelo presidente do Banco Central, Armínio Fraga, e logo em seguida por Malan.
Tudo acertado, pouco antes de meio-dia ele falou diretamente com FHC e acertou sua vinda a Brasília às 17h.
Na reunião com FHC e Malan, porém, insistiu em saber da autonomia que teria no Desenvolvimento e dos limites da convivência da sua pasta com as demais da equipe econômica.
Malan criticou os conflitos tornados públicos e enfatizou muito a necessidade de o governo ter um pensamento afinado, evidentemente, em torno da idéia de que o desenvolvimento só é possível com a estabilidade.
O novo ministro do Desenvolvimento abriu o jogo de forma diplomática: disse que entrava no governo para trabalhar e expor suas idéias, não necessariamente iguais às dos demais membros da equipe econômica.
Tápias, que deve tomar posse na próxima terça-feira, deixou claro que assumia justamente para provocar debates, discussões, questionar rumos.
Ante o espanto dos presentes, Tápias acrescentou que considerava as divergências positivas e que o problema era quando se tornavam públicas, prejudicando a imagem do governo. E emendou o pedido para que FHC fosse o árbitro dessas eventuais divergências.
O pedido de Tápias e o reforço para que a decisão de FHC venha a ser cumprida têm um antecedente recente, envolvendo exatamente FHC, Malan e Clóvis Carvalho, a quem Tápias substitui.
Numa reunião, o Desenvolvimento pediu à Fazenda mais R$ 80 milhões para o Proex (programa de incentivo às exportações). FHC concordou e mandou acertar a liberação do dinheiro com a Fazenda. A ordem presidencial não foi cumprida até hoje.
Na reunião de anteontem, FHC pediu também a todos os presentes que, a partir de agora, a equipe toda esqueça a disputa entre "desenvolvimentistas" (os que querem o crescimento econômico e o aumento de empregos) e "monetaristas" (os que continuam mais preocupados com a estabilidade e o ajuste fiscal).
FHC vai passar essa preocupação na reunião ministerial de hoje, às 15h, no Palácio do Planalto.
O assunto principal é acertar as regras para cumprimento das metas estabelecidas no PPA (Plano Plurianual/2000-2003) e apresentar os gerentes dos principais programas.
Na avaliação de FHC e de seus ministros, o lançamento do PPA marcou uma nova fase no governo, que passou a trabalhar numa direção definida, com metas preestabelecidas e a partir de hoje com gestores que têm missões muito claras.
Tudo isso, lamentou o presidente na reunião com Tápias e a equipe econômica, acabou ficando em segundo plano na semana passada em função da crise aberta com o discurso em que Clóvis Carvalho insinuava que a política ""monetarista" seria covarde -e que ocasionou sua queda.
A intenção é usar a reunião ministerial de hoje para retomar a "agenda positiva" e as discussões sobre o PPA e tentar mostrar qual é de fato a importância do plano para o governo.
Tápias, que ainda está se desvencilhando de compromissos em São Paulo -até o convite, ocupava a presidência da Camargo Corrêa-, não deverá estar presente. O representante do Ministério do Desenvolvimento será o secretário-executivo, Milton Seligman, que ocupa a função de ministro interinamente.
Conforme a Folha apurou, Pedro Parente fez um relato para Tápias sobre as dificuldades que o governo enfrenta para recrutar bons quadros da iniciativa privada. Por isso, defendeu, o novo ministro deveria tentar manter as pessoas consideradas essenciais na equipe de Clóvis Carvalho.
Além do próprio Milton Seligman, Parente citou pelo menos dois outros colaboradores de Clóvis: Hélio Mattar, secretário de Política Industrial, e Lytha Spíndola, secretária de Comércio Exterior.
Segundo o relato de Parente para Tápias, há duas dificuldades básicas para a contratação de quadros de elite: os baixos salários do serviço público e o "risco elevadíssimo".
Isso significa, segundo ele, que os funcionários públicos estão sempre sujeitos a críticas, suspeitas e denúncias que, mesmo não comprovadas, podem prejudicar seus currículos para sempre. Tápias se disse impressionado com a descrição feita pelo futuro colega de ministério.


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