São Paulo, sábado, 08 de novembro de 2008

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Saída de Lacerda desencadeou atritos entre PF e delegado

RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

A operação realizada na última quarta-feira pela Corregedoria Geral da Polícia Federal contra policiais que atuaram na Operação Satiagraha é o ponto culminante dos atritos que marcam a relação da cúpula da PF com o delegado Protógenes Queiroz, desde o final do ano passado.
Após a saída do diretor-geral da PF, Paulo Lacerda, em setembro de 2007, o delegado passou a se queixar, intramuros, da falta de apoio institucional para a Satiagraha. A operação foi criada na gestão de Lacerda, um incentivador da carreira de Protógenes. Foi Lacerda quem o transferiu, em 2003, de São Paulo para a Diretoria de Inteligência Policial, em Brasília, uma das seis vinculadas à direção geral.
Ciente do conteúdo explosivo da Satiagraha, Protógenes esperava receber maior apoio do novo diretor-geral, Luiz Fernando Corrêa, homem de confiança do ministro da Justiça, Tarso Genro -Corrêa, gaúcho como o ministro, era o secretário nacional de Segurança.
De certa forma, o apoio a Protógenes começou a ruir antes, em março de 2007, quando o então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, deixou o cargo. Ele era o avalista político de Lacerda, que permaneceu no comando da PF por somente mais seis meses. Foi despachado logo depois que o irmão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Genival, o "Vavá", foi indiciado pela PF de Mato Grosso do Sul.
Protógenes passou a penar com a "sua" Satiagraha. Comentou com colegas que nunca foi recebido por Corrêa em audiência para falar do assunto, um sinal de desprestígio. Dizia precisar de mais policiais para analisar os documentos e as centenas de interceptações telefônicas dos investigados. Só de Nova York, por exemplo, o delegado recebeu 250 caixas de papéis sobre o banqueiro Daniel Dantas e o Opportunity.
O delegado também começou a suspeitar de vazamentos. A Folha apurou que ele temia que isso pudesse partir de colegas da administração central da PF. A prisão temporária do número dois do órgão, Romero Menezes, em setembro deste ano, sob suspeita de vazamento no Amapá, deu argumentos às suspeitas de Protógenes.
Sentindo-se isolado, ele buscou apoio na Abin (Agência Brasileira de Inteligência), então chefiada por Paulo Lacerda. Obteve o apoio de quatro oficiais de inteligência da Abin, em sistema de revezamento. Ao todo, mais de 50 servidores da Abin participaram das investigações.
Em entrevista a alunos de jornalismo da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo nesta semana, divulgada pelo site "Terra Magazine", Protógenes contou as dificuldades que disse ter encontrado após a saída de Lacerda.
"Durante a gestão do doutor Paulo Lacerda, ele fornecia todo o aparato necessário para a investigação. (...) Sabíamos que, se ele não permanecesse, haveria dificuldades. Uma troca, ainda que planejada, sempre traz prejuízos. Vide o que nos aconteceu, tivemos dificuldades que atribuo a essa troca repentina em que o novo diretor-geral não teve oportunidade para conhecer o funcionamento da PF, atrapalhando o andamento das operações."
A participação da Abin chegou à cúpula da PF de forma fortuita -um chefe do delegado deu de cara com um conhecido da agência, Márcio Seltz, trabalhando no prédio da PF.
Os chefes ficaram transtornados com a informação. Em depoimento prestado à CPI dos Grampos no dia 15 de outubro, em Brasília, Daniel Lorenz de Azevedo, diretor da DIP (Divisão de Inteligência Policial) da PF de Brasília, atacou duramente o Protógenes. "Isso nos deixa extremamente chocados, a forma desleal com que ele se portou perante o Departamento de Polícia Federal, perante mim, como diretor de Inteligência, e perante, principalmente, os seus comandados (...) Isso parece mais uma conspiração do que uma compartimentação."
Quando Protógenes passou a ser atacado por defeitos e exageros do inquérito, até em entrevista coletiva do ministro Tarso Genro, a cúpula da PF encontrou o momento para pressioná-lo a deixar a investigação. A gravação da reunião que selou seu afastamento é sigilosa.


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