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JANIO DE FREITAS
Sons da corrupção
O mais importante na
entrevista em que o ex-secretário-geral do PT reesquenta
o escândalo do "valerioduto"
não está no que disse a Soraya
Aggege ("O Globo"). Está no fato inexplicado, mas não imotivado, do repentino rompimento
de seu retiro para um falatório
vasto e espalhafatoso, contra todo o esforço do governo e do PT
para para dar novo rumo às
atenções.
Silvio Pereira, como ele mesmo diz, tem bastante experiência política, ainda por cima adquirida na politicagem pesada
da luta de facções, comum aos
partidos ditos de esquerda. Imaginá-lo cometendo desabafos
não tem cabimento. Menos ainda, que de repente se dispusesse
a revelações comprometedoras
sobre as atividades ilegais de
que foi integrante. Participação
que nega mais uma vez, enquanto se refere a planos, métodos e cifras da corrupção que só
poderia conhecer se integrante
do esquema.
A observação inicial que a entrevista suscita diz respeito ao
senador Aloizio Mercadante.
Pela primeira vez, alguém que
fala da corrupção movida pelo
PT junta o nome de Mercadante
aos de Lula, José Dirceu e Genoino como os "que mandavam no
PT". Silvio Pereira ficou identificado como um dos petistas
mais ligados a Dirceu, que, por
sua vez, há muito é reconhecido
como adversário de Mercadante. E, por isso, adepto da indicação de Marta Suplicy como candidata do PT contra José Serra
para o governo paulista.
Por uma coincidência admirável, a entrevista de Silvio Pereira foi dada para divulgação
no mesmo domingo, anteontem, da escolha dos petistas entre os pré-candidatos Mercadante e Marta.
Servir a José Dirceu não requer oportunidade para Silvio
Pereira. Dirceu, portanto, obviamente "não recebia Marcos
Valério". Mas os arremates costumam ser traiçoeiros, como se
vê da frase completa de defesa:
"Já ministro, José Dirceu não recebia Marcos Valério nem gostava da situação". Se não gostava, é porque tinha conhecimento "da situação" que levou o PT
a dívidas, com Marcos Valério,
que "chegaram a R$ 120 milhões". O arremate do escudeiro
confirma o que Dirceu nega.
Mas a referência à dívida tem
um componente esquisito. Apesar de algumas frases que sobrecarregam Marcos Valério de
culpas, para inocentação de Delúbio Soares e outros, Silvio Pereira, ao citar aquele montante
de dívida, dá uma suspeita cobertura à cobrança judicial, de
mesma dimensão, que Valério
faz contra o PT. Um testemunho
público e autorizado em benefício do "credor" Marcos Valério.
Outra frase perdida que, de
perdida, nada tinha. Há um
ano batalhando para escapar
das acusações de manipulador
dos fundos de pensão e seus
muitos bilhões, Luiz Gushiken
foi lembrado por Silvio Pereira
para umas palavras rápidas e
explosivas: "Os maiores [fundos] ficaram com o Gushiken".
Mesmo nos bons tempos, as facções de Dirceu e de Gushiken
não guardavam aparências de
convívio nem pela frente, quanto mais, agora, pelos fundos.
Diz Silvio Pereira que "o plano
era faturar um bi", com intermediações e coberturas para falcatruas em licitações e outros
negócios do governo, dos quais
cita alguns.
Ainda que as comissões fossem muito altas, por exemplo,
na média de 20% do valor dos
negócios, o esquema precisaria
ter o controle de R$ 5 bilhões dos
negócios governamentais. O que
exigiria, provavelmente, grande
quantidade de transações sob
domínio do esquema Valério/
PT/ministérios.
A CPI dos Bingos voltou a convocar Silvio Pereira, para depor
amanhã sobre temas de sua
entrevista. Caso compareça,
nem por isso vai dizer o mais
importante em sua entrevista: o
motivo.
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