São Paulo, terça, 9 de junho de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CASO PC
Investigações sobre ligações do ex-tesoureiro de Collor com a máfia mostram vinda de criminosos para o país
Brasil combate "migração' de mafiosos

LUCAS FIGUEIREDO
da Sucursal de Brasília

As investigações feitas em conjunto pelo Brasil e pela Itália que procuram esclarecer ligações do empresário alagoano Paulo César Farias com a máfia têm endereço certo: combater o recente fenômeno da transferência de mafiosos para o Brasil.
A Interpol (polícia internacional) e as polícias dos dois países descobriram que, em razão do aumento da repressão à máfia nas últimas duas décadas, criminosos estão fugindo da Itália e se instalando no Brasil, onde encontram refúgio para continuar atuando no globalizado mundo do crime.
O trabalho conjunto já começa a dar resultados. No ano passado, a pedido da Justiça da Itália, 13 italianos foram presos no Brasil, sendo que 2 foram soltos depois (veja quadro). Entre 94 e 96, o número de prisões não passou de 9.
O resultado, que significa um aumento de 333% no número de prisões, não foi obtido por sorte, mas por ações cuidadosamente calculadas a partir da Itália.
Na maioria dos casos, quando os pedidos de prisão chegavam ao Brasil, os criminosos já estavam sendo seguidos pela Interpol e pela Polícia Federal brasileira.
Foi o caso da prisão, em maio de 97, no Rio, de Mario Baratta, um dos chefes da Cosenza, família mafiosa da "Ndrangheta (máfia da Calábria, sul da Itália).
Considerado um dos 500 mafiosos mais perigosos e procurados pela Itália, de acordo com lista elaborada pelo Ministério do Interior italiano, Baratta era procurado no mundo inteiro desde 94.
Condenado à prisão perpétua na Itália por homicídio, agiotagem e tráfico de drogas, Baratta viveu três anos no Brasil com visto de permanência falso e apartamento próprio em Copacabana, até ser descoberto pela Interpol e pela PF.
De acordo com o IBGF (Instituto Brasileiro Giovanni Falcone), que estuda o assunto e estimula o combate à máfia no Brasil, outros 50 mafiosos vivem no país.
O IBGF, que mantém estreitos laços com órgãos antimáfia da Itália, afirma que esses mafiosos vivem em apartamentos de luxo e casas de campo, e trabalham na montagem do tráfico de cocaína e heroína e lavagem de dinheiro.
A maioria pertenceria a famílias mafiosas da Cosa Nostra, da Sicília, e da Camorra, de Nápoles. No Brasil, o Nordeste (Ceará, Bahia e Pernambuco) e o Estado de São Paulo são os locais mais visados.

Doce exílio
Mas por que fugir para o Brasil? Os motivos são vários, segundo investigadores brasileiros e italianos ouvidos pela Folha.
Desde a década de 80, a máfia vem se associando aos cartéis de droga da Colômbia para levar cocaína para a Europa. O Brasil é um excelente ponto para articular esse tipo de negócio.
A Justiça e a polícia do Brasil não estão preparadas para combater o crime organizado. Além disso, no Brasil, um bom advogado pode solucionar grande parte dos problemas com a Justiça.
A legislação antidroga e o combate à lavagem de dinheiro no Brasil estão atrasados em comparação com Europa e Estados Unidos.
Em 95, o Ministério da Justiça começou a ter os primeiros sinais de que a máfia estava entrando no Brasil pelo aumento de pedidos de cidadania de italianos com base em casamentos. Os processos foram "congelados" e passaram a receber uma análise especial.
Grande parte dos pedidos tinha as mesmas características: separação de bens, diferença de idade acentuada, ausência de cerimônia religiosa e matrimônio próximo à data de desembarque do noivo no Brasil, em alguns casos com diferença de somente um dia.
A PF foi acionada e descobriu que muitas das noivas eram dançarinas de boates. Resultado: pedidos de cidadania de italianos passaram a sofrer triagem rigorosa.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.