São Paulo, domingo, 9 de agosto de 1998

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CELSO PINTO
Metas para o déficit público

O governo não pensa em fazer um pacote fiscal depois das eleições, mas quer dar uma sinalização mais forte em direção à austeridade. Amaury Bier, secretário de Política Econômica da Fazenda, estuda uma alternativa concreta, inspirada na experiência recente dos Estados Unidos.
A idéia seria fixar metas graduais para os próximos três ou quatro anos e transformá-las num compromisso também do Legislativo. Nos Estados Unidos, quando o déficit público saiu de controle nos anos 80, sucessivas leis levaram à redução gradual do desequilíbrio.
O acordo mais recente, de 97, previa equilíbrio em 2002, mas ele já aconteceu este ano. Com metas plurianuais, o Congresso se compromete a corrigir qualquer desvio com cortes compensatórios.
Bier está estudando esta experiência. Ele acha que algo parecido no Brasil, em que houvesse a obrigação legal de correção de desvios orçamentários, aumentaria a credibilidade de metas fiscais.
Nos últimos dois anos, o governo namorou várias vezes com a idéia de fixar metas para o déficit público. Chegou-se a imaginar a publicação de metas trimestrais, a exemplo do que acontece nos países monitorados pelo FMI.
No ano passado, a Fazenda mencionou, mas de maneira informal, a meta de chegar ao fim do ano com um superávit primário (receitas menos despesas, exceto juros) equivalente a 1,5% do PIB. O déficit real ficou em 0,92% do PIB, e o governo foi duramente cobrado.
O ministro da Fazenda, Pedro Malan, é claramente contra a fixação de metas fiscais. Acha que elas acabariam exacerbando expectativas e cobranças.
A proposta de Bier é diferente. Ele acha que as metas teriam que ser fixadas em reais e não em relação ao PIB, sujeito a variações inesperadas (por exemplo, em razão da crise asiática). Com a inflação anual em torno de 2%, seu impacto sobre as metas nominais seria mínimo.
As metas teriam que ser realistas. O déficit não pode ser eliminado com uma penada ou um pacote, diz Bier. É possível, contudo, dar um senso de direção num período de três ou quatro anos, se mecanismos legais derem credibilidade às metas. O Orçamento teria que se basear em previsões realistas de receita. No passado, receitas superestimadas acabaram gerando pressões irrealistas de despesas.
O objetivo final é claro. As receitas de privatização têm ajudado, nos últimos anos, a impedir que a pressão dos déficits públicos elevados se reflitam integralmente no estoque da dívida líquida. Em dois ou três anos, contudo, o grosso das privatizações terá acabado e, se não houver maior controle sobre o setor público, a dívida poderá crescer de forma explosiva.
Bier diz que os cálculos mostram que seria preciso gerar um superávit primário entre 1,5% e 2% do PIB, a partir deste ponto, para manter o estoque da dívida líquida estabilizado. Esta teria que ser a meta embutida no médio prazo.
E como chegar lá? Reformas e taxas razoáveis de crescimento são essenciais, diz Bier. Isso supõe sucesso político nas reformas e aumento das exportações suficiente para permitir um crescimento econômico que não esbarre em déficits externos insustentáveis.
O próximo ano começa com alguns problemas. Não se repetirão os R$ 4 bilhões de receita da concessão da banda B deste ano, o R$ 1,8 bilhão do imposto sobre aplicações financeiras e os R$ 7 bilhões da CPMF (se o imposto não for renovado).
Em contrapartida, lembra Bier, existirão receitas remanescentes da banda B (o Citibank calcula em R$ 1 bilhão), receitas das empresas-espelho da telefonia, das concessões petrolíferas e várias privatizações (entre elas Banespa, geração de energia e, talvez, saneamento).
Do lado dos Estados e municípios, ele calcula que o pleno cumprimento dos acordos de renegociação da dívida com o governo federal gerariam um superávit primário de cerca de 0,7% do PIB. Como existem muitas privatizações estaduais em 99, cujo dinheiro é usado à revelia do acordo, não dá para esperar muito do resultado dos Estados.
Bier diz que não dá para obter ganhos dramáticos a curto prazo. Importante é indicar a direção correta.

E-mail: CelPinto@uol.com.br




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