São Paulo, domingo, 9 de agosto de 1998

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DOMINGUEIRA
Fossos

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Editor de Domingo

A proposta mais imaginosa da semana, sem mencionar a que pretende tirar dos trabalhadores seu FGTS integral, veio do nobre senador baiano Antonio Carlos Magalhães: criar um fosso em torno do prédio do Congresso para evitar o assédio de manifestantes.
Por que Oscar Niemeyer não havia pensado nisso? Por que não fazer logo um muro alto, como aqueles de penitenciárias -que certamente alojaria muito bem alguns dos ilustres senhores da casa?
A proposta de ACM tem uma chocante dimensão simbólica num país onde o maior de todos os fossos impede que uma enorme massa de miseráveis tenha acesso às oportunidades de viver decentemente.


A idéia do senador bem que poderia ser adotada em Washington, não para evitar o assédio de loucos, como aconteceu recentemente no Capitólio, mas para proteger presidentes e estagiárias de outro tipo de assédio.


A novela Clinton-Monica Lewinski mostra que, apesar da crescente influência norte-americana no Brasil, um outro fosso continua separando a cultura dos dois países, já originalmente divididas na Europa entre o norte anglo-saxão e o mundo mediterrâneo.
Um caso como o que desenrola-se nos EUA, acompanhado pela mídia de todo o mundo, seria bastante improvável no Brasil.
Não que os presidentes e as estagiárias daqui possam ser mais bem comportados, mas pelas diferenças das regras que regem o mundo privado e público das duas sociedades.
Há quem veja vantagens no modo como os americanos vêm administrando as relações interpessoais, cada vez mais mediadas por códigos estritos e pela instância jurídica: as mulheres, especialmente, teriam maiores garantias contra os abusos do poder masculino.
Talvez, mas o efeito colateral é a paranóia, o enclausuramento, a deserotização das relações -uma vida, enfim, menos sedutora.
As diferenças entre esses dois universos culturais é um dos temas que o psicanalista Luiz Tenório trata no livro "Enquanto as Mulheres Mandam, os Homens Fazem o que Têm Vontade" -uma boa conversa sobre os bastidores do comportamento masculino e feminino.


Um texto que escrevi aqui, no dia da final da Copa, chacoalhando nossos cronistas esportivos, foi comentado por Matinas Suzuki Jr. e gerou uma momentosa discussão de rapazes no caderno de esportes. Espero, como acredita Juca Kfouri, que ela possa servir, apesar das caneladas (fazem parte do jogo), para levantar boas bolas na área do jornalismo esportivo -e não para isolá-las no fosso do Maracanã.
Também faz parte desse contexto a coluna de José Geraldo Couto, na sexta-feira, sobre os limites da verdade dos números na avaliação do futebol -o que mostra que o jornalismo esportivo está em movimento e transformação.




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