São Paulo, segunda-feira, 09 de setembro de 2002

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PRESIDENTE

FORÇA DO AÇUCAR

Ministério da Agricultura sofreu pressão para concessão de pacote, que seria reação ao contato entre produtores e o PT

Governo libera R$ 400 mi a usineiros do NE

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Às vésperas da eleição presidencial, o governo federal está liberando um pacote de R$ 400 milhões para os produtores de cana-de-açúcar do Nordeste.
Trata-se da retomada do programa de equalização dos custos de produção de cana na região, suspenso desde a safra de 1998/99, quando foram denunciadas as suspeitas de irregularidades na concessão desses subsídios.
A Folha apurou que houve fortes pressões políticas no Ministério da Agricultura, num lobby que pretendia ver aprovada a concessão de um pacote mais amplo de incentivos para favorecer produtores de outras regiões.
O mecanismo de equalização consiste no pagamento de um subsídio de R$ 5,07 por tonelada de cana para compensar as diferenças de custo de produção do Nordeste e do Centro-Sul.
"Isso não tem nada a ver com eleição ou com política", diz o deputado federal José Múcio Monteiro Filho (PSDB-PE), fornecedor de cana, ex-dirigente do PFL pernambucano, e que atua junto à "Frente Parlamentar Sucroalcooleira", no Congresso.
Monteiro diz que os recursos aprovados são bem menores do que havia sido negociado. "Foi fechado um acordo. Esses recursos nasceram sob uma lei específica, votada em plenário. O Ministério da Agricultura fiscalizou as empresas. Parlamentares e presidentes de sindicatos do Nordeste trabalharam ao longo do ano. Houve uma barganha [pelo governo]: "Ou vocês aceitam [R$ 400 milhões" ou a gente não paga'", diz.
O presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool de Pernambuco, Renato Cunha, 44, diz que houve "negociação" na Casa Civil. "O valor total deveria ser R$ 530 milhões, mas demos um desconto de R$ 130 milhões", diz. Para Cunha, o calendário eleitoral é uma "coincidência". "Querem transformar uma questão econômica líquida e certa em decisão eleitoral", diz Monteiro.

Poder eleitoral
Embora não exibam a mesma influência política dos anos do regime autoritário, os produtores nordestinos mantêm poder eleitoral. Os usineiros alagoanos ajudaram a conduzir à Presidência o então candidato Fernando Collor de Mello, em 1989, e também apoiaram Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1994.
Naquele ano, usineiros de Pernambuco, ligados ao PSB de Miguel Arraes, apoiaram o candidato Luiz Inácio Lula da Silva.
Os empresários do setor sucroalcooleiro contam com uma das maiores bancadas no Legislativo. A bandeira da retomada do Proálcool -programa instituído no início dos anos 80 para incentivar a produção do álcool combustível- ampliou o lobby político.
Foram incorporados representantes de partidos de oposição -como José Machado (PT) e Aldo Rebelo (PC do B), que vêem no combustível alternativo um incentivo à criação de empregos, e parlamentares preocupados com a questão ambiental, como Fernando Gabeira (PV-RJ).
A defesa do Proálcool é citada nos programas de José Serra (PSDB) e, com maior ênfase, no de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Os usineiros paulistas vêm mantendo, há um bom tempo, contatos constantes com assessores econômicos dos candidatos tucano e petista. Não teriam interlocutores mais próximos nas assessorias dos candidatos Ciro Gomes (Frente Trabalhista) e Anthony Garotinho (PSB).

Reação
A retomada dos incentivos aos usineiros nordestinos pode ser interpretada como uma reação do governo à aproximação do setor com representantes do PT.
Nos últimos anos, o Partido dos Trabalhadores e os usineiros paulistas estreitaram as relações desenvolvendo o que os empresários chamam de "conquista mútua". Nas eleições de 1998, os usineiros do Centro-Sul apoiaram abertamente os candidatos petistas que se comprometiam com o Proálcool.
Nas eleições de 2000, usineiros paulistas fizeram campanha e deram dinheiro para eleger candidatos a prefeito do PT afinados com a defesa do Proálcool, entre os quais o prefeito de Ribeirão Preto, Antônio Palocci Filho, que foi reeleito e hoje é o coordenador do programa de governo do petista Luiz Inácio Lula da Silva.
Calculava-se, então, que metade da produção paulista de cana-de-açúcar já provinha de regiões lideradas por prefeitos do PT.



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