São Paulo, segunda-feira, 09 de outubro de 2000

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GOVERNO
Presidente afirma que não fará abertura da economia sem levar em conta as empresas

Setor produtivo será ouvido, diz FHC

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A HAIA

O presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que seu governo não fará nenhuma abertura adicional da economia brasileira sem levar "em consideração, em profundidade, os interesses do setor produtivo brasileiro".
FHC disse que a tendência é sim a de uma maior abertura, mas "o caminho para chegar lá tem que ser um caminho que leve em consideração o nosso interesse".
O presidente voltou a criticar a política de abertura adotada pelo governo Fernando Collor, a partir de 1990, que considera "precipitada". "Você não pode pedir ao Brasil que faça o que foi feito e que achei precipitado: de repente, cair tarifas, porque você vai ter desemprego, vai ter problemas. Há aí, portanto, toda uma navegação que não é fácil", afirmou FHC.
As declarações do presidente foram feitas ao término de uma visita de hora e meia ao Museu Kröller-Müller, encravado no Parque Nacional Hoge Veluwe, a 110 quilômetros de Haia, a capital holandesa, onde FHC desembarcou por volta de 12h (8h em Brasília).
O presidente foi cobrado pela Folha sobre uma aparente contradição entre o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, que propõe, em entrevista publicada ontem pelo "Estado de S. Paulo", uma abertura ainda maior, à la chilena, e o chanceler Luiz Felipe Lampreia, que repete sempre que a economia brasileira "não está preparada para um segundo choque liberal" (o primeiro foi o do governo Collor).

Tendência
O presidente insistiu em que a tendência é, de fato, a apontada por Armínio, mas com todas as restrições e cuidados que FHC apontou.
No caso específico do entendimento com o Chile, diz o presidente, "o que foi proposto é um cronograma de tal maneira que pudéssemos avançar na integração do Chile ao Mercosul".
O Chile cobra tarifas de importação de, no máximo, 9%, ao passo que a tarifa média brasileira é de 14%, embora o presidente diga que a efetivamente praticada "deva ser da ordem de 7% ou 8%".
Mas o próprio FHC lembra que há alguns setores no Brasil em que as tarifas vão até 35%, como no caso dos automóveis, "o que não se pode deixar à margem em uma negociação". O chanceler Lampreia, que acompanha o presidente na visita, disse que há uma "diferença conceitual" entre ele e Armínio Fraga.

Juros
Lampreia acha que o Brasil não pode abrir mais sua economia enquanto a taxa de juros não for compatível com as internacionais e enquanto não houver uma reforma tributária, que desonere as exportações. O chanceler diz que uma abertura sem tais precondições levaria os produtores nacionais ao "suicídio".
A Folha apurou que há mais que uma diferença conceitual entre o pensamento da equipe econômica, da qual Armínio Fraga faz parte, e o de outros setores do governo.
O presidente do BC prega uma rápida e unilateral abertura da economia, antes mesmo de que comece para valer a negociação com os Estados Unidos em torno da Alca (Área de Livre Comércio das Américas, que englobará os 34 países americanos, exceto Cuba). O Itamaraty, ao contrário, entende que uma abertura adicional é uma carta que deve ser guardada para as futuras negociações.
Fernando Henrique também tocou no tema Alca e em seu contraponto, as negociações com a União Européia para a formação de uma zona de livre comércio com o Mercosul.
"Vi nos jornais que o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo voltou dos EUA dizendo que acredita que o Brasil precisa se preparar para a Alca porque é uma coisa que virá. É natural, então, que a gente tenha a preocupação de, o mais depressa possível, ter um acordo com a Europa, porque teríamos como balancear o nosso relacionamento com a Alca", afirmou FHC.
Traduzindo: o governo brasileiro quer ter abertas as duas portas, a de um acordo com a Europa e a de um acordo com os EUA, em vez de se ver empurrado para um entendimento com os Estados Unidos em que o peso norte-americano seria esmagador.

Barreiras
Mas o acordo com a Europa passa pela derrubada das barreiras às importações de produtos agrícolas, que FHC chamou ontem de "escandalosas".
É nisso que o presidente bateu na Alemanha, promete fazer de novo na Holanda e, mais para o fim do mês, na Espanha, quando de sua viagem para receber prêmio concedido pelo governo espanhol.
Mas o próprio FHC diz que o grande obstáculo para a abertura agrícola européia não é nenhum desses três países, mas a França. O presidente admite: "É claro que, antes das eleições francesas, é difícil que você tenha alguma abertura ampla por parte da França".


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