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São Paulo, quinta-feira, 09 de outubro de 2003

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CHOQUE ENTRE PODERES

Órgão defende inspeção internacional na Justiça do país

Governo endossa crítica da ONU ao Judiciário, que reage

Victor Caivano/Associated Press
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante reunião com a relatora da ONU para execuções sumárias, Asma Jahangir, em Brasília


DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A relatora da ONU (Organização das Nações Unidas) para execuções sumárias, Asma Jahangir, encerrou ontem sua visita ao país provocando uma nova discussão entre o Judiciário e o Executivo.
Jahangir sugeriu uma inspeção internacional na Justiça brasileira, no que foi apoiada pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Ambos acabaram sendo criticados pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Maurício Corrêa, que atacou ainda o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Tudo começou quando Thomaz Bastos, que participou de reunião ontem cedo com Jahangir, o ministro Nilmário Miranda (Secretaria de Direitos Humanos) e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, comentaram a sugestão da relatora da ONU de que seja enviado um outro observador do órgão para inspecionar o Judiciário, para garantir transparência.
"Todos sabemos que o Judiciário brasileiro, com todo o respeito que temos a ele, não é o Poder Judiciário dos nossos sonhos. Por isso precisamos reformá-lo", disse Thomaz Bastos.
Corrêa reagiu à tarde. Disse que Lula está com "total má vontade" com o Judiciário ao comentar a simpatia do governo pela sugestão de Jahangir -embora o presidente não tenha feito comentários diretos sobre o caso. "O que o presidente tem demonstrado é que ele, em face de críticas que eu fiz, não tem assimilado isso e tem transformado essa idiossincrasia pessoal numa idiossincrasia institucional, o que é um absurdo. Evidentemente eu repilo em nome do Judiciário o que eu entendo como verdadeira agressão à nossa independência", declarou Corrêa.
Segundo o ministro, "o presidente tem gostado de tudo o que diz respeito ao Poder Judiciário". "Ele [Lula] tem falado de caixa-preta, isso e mais aquilo. As afirmações que ele fez ao longo desse início de mandato já demonstram a sua total má vontade com o Poder Judiciário." Corrêa disse que o presidente "fez críticas contundentes" à Justiça. "Entretanto não gosta que eu faça críticas a ele. Ora, isso é um absurdo."
Corrêa também atacou a relatora da ONU. "Essa senhora está no Brasil há pouco tempo. Não conhece a estrutura do Judiciário. Portanto não tem legitimidade nenhuma para dizer que o Judiciário é bom ou é mau." Segundo o ministro, ela fez "uma afirmação indébita, atrevida".
O presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), ministro Nilson Naves, disse que o envio de representante da ONU "é uma atitude descabida e configura ingerência no Poder Judiciário". Ele acusou o governo de "oportunismo" pelo apoio à proposta.
"A idéia nos coloca no mesmo plano do Iraque. Nós somos o quê? Uma República submetida a um controle internacional?", disse o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Francisco Fausto, que também criticou a idéia.

Projeto
O governo quer acelerar a aprovação da lei que federaliza os crimes contra os direitos humanos e votar a matéria até o fim deste ano. Essa foi uma das formas encontradas por Lula para adiantar-se às críticas que Jahangir fará em seu relatório. O projeto tramita no Senado. O ministro disse que a PF já está investigando os crimes que envolvem "violação forte" aos direitos humanos e que a aprovação da lei seria a "homologação de uma coisa que já existe". Segundo o ministro, o tom da reunião com Jahangir foi "agradável" e terminou com uma sessão de fotos.
Nas últimas semanas, a relatora não teve encontros propriamente cordiais. Em São Paulo, ela criticou duramente a Febem e não foi recebida pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB). Já no Rio de Janeiro, Jahangir criticou a "falta de dados". (GABRIELA ATHIAS E SILVANA DE FREITAS)


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