São Paulo, domingo, 09 de outubro de 2005

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JANIO DE FREITAS

Do começo ao fim

O presidente que faz - na própria sede da Presidência da República - uma manifestação de solidariedade a políticos praticantes de comprovada improbidade comete, mais do que a provocação que pretendeu fazer à sociedade toda, um passo que o leva para fora da responsabilidade constitucional.
O passionalismo (e certa esperteza) dos petistas históricos tem falado de um "golpe branco", a pretexto das investigações de corrupção, para derrubar Lula. Não fosse, porém, a existência de uma conspiração para proteger (bloquear é a palavra do mau gosto em moda) Lula e Palocci, contornando na mídia e nas CPIs o que quer que possa comprometer um ou outro, ambos iriam responder pelo ato e pelas declarações de solidariedade à corrupção política e contra as leis nacionais.
Antonio Palocci não se limitou à conivência verbal: "Gostaria de manifestar total solidariedade aos envolvidos, que estão pagando um preço alto por práticas irregulares do partido", é a sua frase, narrada a repórteres por presentes ao ato de congraçamento. Sua frase é uma inverdade: as práticas não foram do partido, foram de parlamentares que apanharam ou mandaram apanhar dinheiro, altas quantias, de cuja ilegalidade tinham plena consciência, tanto que o esconderam de suas prestações de contas pessoais e eleitorais.
Cada um sabe com quê e com quem se solidariza. Mas a injustiça fere o sentimento público. E esse foi o pior aspecto da comunhão na Presidência da República. A ausência de Marcos Valério de Souza foi a ausência do patrono de toda a solidariedade ali celebrada, assim como de suas motivações e benefícios. Se alguns dos presentes embolsaram boas boladas, o maior beneficiário do mecenato de Marcos Valério foi mesmo Lula: os cheques do ausente e injustiçado Marcos Valério é que azeitaram a Câmara, para sujeitá-la ao Planalto, e, por intermédio de Professor Luizinho, João Paulo Cunha, Paulo Rocha e outros valerizados, fizeram a bancada petista curvar-se ao fernandismo de Lula e Palocci.
Mas a injustiça tem atenuante: ao solidaridar-se com os que embolsaram o dinheiro ilegal, Lula e Palocci solidarizavam-se inevitavelmente, no mesmo gesto, com o doador, Marcos Valério de Souza.
Tudo, portanto, acabou em casa. Ou, melhor, no Palácio. Onde, aliás, também começou.

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