São Paulo, domingo, 10 de janeiro de 1999

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tasso critica e vê risco de "anarquia'

ELIANE CANTANHÊDE
Diretora da Sucursal de Brasília

O governador Tasso Jereissati (PSDB-CE) criticou duramente a moratória da dívida mineira e advertiu que o governo federal não pode aceitar, em hipótese alguma, renegociar nessas condições: "Seria o princípio da anarquia".
Na sua opinião, o presidente Fernando Henrique Cardoso tem "obrigação" de exigir o cumprimento do contrato de renegociação da dívida mineira.
Se abrisse o precedente de renegociar sob ameaça da moratória, todos os demais Estados e até os municípios se sentiriam à vontade para usar a mesma forma de pressão. "Seria o fim da autoridade, da hierarquia, do bom-senso", disse.
Jereissati classificou a decisão do governador Itamar Franco (MG) de "impensada e inconsequente" e anunciou que ela receberá o repúdio dos demais governadores governistas.
Quinze deles, incluindo o vice-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, confirmaram presença numa reunião, na terça-feira, em São Luiz (MA).
"Nós vamos mostrar à opinião pública nacional e à comunidade internacional que (a decisão de Itamar) se trata de uma atitude totalmente isolada", antecipou Jereissati, por telefone.
"A grande maioria dos governadores vai dizer que vai cumprir suas obrigações contratuais, dentro das leis e das regras democráticas", acrescentou.
Ele admitiu que muitos desses governadores estão insatisfeitos com a situação econômica e defendem a renegociação com o governo federal: "Mas ninguém concorda com a moratória".
²
Crise federativa
Não há unanimidade entre os governadores aliados ao Palácio do Planalto sobre como conduzir a renegociação, e os de oposição vão se reunir à parte, no dia 18, justamente em Belo Horizonte.
É por isso que setores do governo federal temem uma "crise federativa", com governadores brigando contra governadores. Nesse caso, o espírito bairrista poderia levar as populações a defenderem seus próprios Estados.
O efeito seria no comportamento das bancadas do Congresso. Se configurada a defesa de Minas, por exemplo, como os deputados mineiros poderiam se posicionar a favor do Planalto?
Jereissati antecipa-se a essa dúvida, classificando a atitude de Itamar Franco como personalista, não como de defesa dos interesses do Estado.
"A moratória não é de Minas, não é do governo, não é da população mineira. É simplesmente do governador. Só se explica como ação pessoal, não administrativa. Ninguém ganha, todos perdem."
²
Contratos vantajosos
Ele lembrou que os contratos de renegociação das dívidas entre o governo federal e os Estados foram institucionais. Foram aprovados pelas Assembléias Legislativas e depois pelo Congresso Nacional.
Além disso, destacou que eles foram "altamente vantajosos" para os Estados, que deixaram de pagar juros de mercado em torno de 30% ao ano e passaram para patamares entre 6% e 7%. Também conseguiram alongar os pagamentos para até 30 anos.
Um exemplo é o Estado do Maranhão, que será sede da reunião de governadores. O peso da dívida com a União era de 19% da receita líquida nos dois primeiros anos de mandato da governadora Roseana Sarney. Agora, é de 13%.
Em compensação, Roseana pagou R$ 565 milhões em dívidas com a União nos quatro anos do primeiro mandato. Esse valor é mais da metade do que todos os governantes pagaram entre 1974 e 98. Nesses 24 anos, já convertidos em real, o Maranhão pagou um total de R$ 1,65 bilhão.
Se todos os Estados convivem com dívidas acumuladas, juros altos, um processo considerado recessivo, Jereissati pergunta por que, então, só Itamar Franco se sentiu no direito de decretar moratória. "Não há análise racional possível", afirmou.
Ele disse admitir que um cidadão comum possa achar que o governo federal tem dinheiro para tudo, pode resolver tudo, "mas não um ex-presidente da República".
"Dinheiro não nasce no chão nem cai do céu. A única maneira de gerar mais dinheiro é aumentando imposto. Se o governo federal ceder, mais cedo ou mais tarde a conta vai cair sobre a população", disse.
Opinou, também, que "a conta" da moratória mineira vai recair primeiro e concentradamente na população mineira, "que vai ficar sem dinheiro, sem crédito e sem credibilidade".



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.