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JANIO DE FREITAS
As vias de fato
Sem querer nem saber, tive
um artigo meu atirado pelo
deputado Severino Cavalcanti
como um petardo direto aos peitos do deputado Alberto Goldman, na sessão de terça-feira da
Câmara. O efeito parece ter sido
perturbador, porque os berros de
Goldman que se seguiram, além
de um tanto desconexos, incluíram uma frase que denotava colapso da memória. Tal como nas
situações em que o juiz pergunta
ao pugilista atingido qual é o seu
nome, e ele se confunde.
Deu-se que o incidente levou
meu artigo, citado em vários jornais, até a suprema glória de
aparecer (de esguelha, é verdade) na TV. O que me fez experimentar por um instante a sensação de ser quase tão importante
no Brasil quanto o Ratinho, entre outras das maiores eminências públicas da vida nacional.
Mas, dadas as características
dos contendores na Câmara e,
depois, a habitual rapidez do noticiário, algumas pessoas não entenderam o que fazia o artiguinho no bafafá. Incompreensão
acentuada por esta frase zonza
de Goldman: "Vossa Excelência
(lá o Severino) faz uma acusação
sem mais nem menos de um jornalista que um dia citou uma
privatização feita há 15 anos".
A privatização não seria há 15
anos, mas há 12, quando Alberto
Goldman era ministro dos
Transportes no governo Itamar
Franco. O título do artigo, publicado em 16 de junho de 93, sugere o seu teor: "No rastro dos escândalos". Expunha as distorções aplicadas ao edital, para direcionar seu resultado, da concorrência de privatização da via
Dutra, a primeira da série de privatizações articulada por Goldman.
Ao artigo seguiram-se, no dia
17, um editorial da Folha, "Mais
um" (escândalo nas concorrências públicas) e, claro, as declarações de Goldman negando o dirigismo do edital. No dia 18, o artigo "A derrapagem de Goldman"
desfazia, parte por parte, o artifício com que suas pretensas explicações distorceram a legislação
das concorrências. Nada se salvou da sua defesa.
Cinco dias depois, Alberto
Goldman teve que comunicar a
suspensão de todos os editais de
privatização de rodovias, juntamente com o da Dutra. E admitir
que nem previsão havia mais para reabertura das licitações. Não
disse, mas estava cumprindo ordem definitiva de Itamar Franco.
Quando Severino Cavalcanti
recomendou que Goldman "olhe
o seu passado", logo lembrando
"critérios duvidosos sobre a privatização da via Dutra" (e sacou
o artigo), não falava apenas de
"um jornalista que um dia citou
uma privatização feita há 15
anos". Referia-se ao responsável,
quando ministro, pelo episódio
assim descrito no editorial da
Folha: "terrível espetáculo do
conluio entre a sobranceira e
fornida máfia de contratantes
do serviço público e autoridades
que "dão um jeitinho" para eliminar a saudável concorrência".
Se recuperado da sessão na Câmara, Alberto Goldman já pode
vir com os mesmos insultos que
usou no passado, como suas melhores respostas aos citados e outros artigos.
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