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ESTRATÉGIA E TECNOLOGIA
Submarino é síntese do que há de bom e ruim no desenvolvimento tecnológico das Forças Armadas
S-34 Tikuna representa lento avanço
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O submarino S-34 Tikuna, lançado ao mar ontem no Rio, é
uma síntese do que há de bom e
ruim no desenvolvimento tecnológico das Forças Armadas.
Primeiro, as boas notícias. O
Tikuna representa um avanço. É
o quarto submarino construído
no Brasil a partir do projeto alemão IKL-209/1.400, do estaleiro
HDW, o mais popular submersível do mundo com propulsão
convencional (diesel e bateria).
O contrato, de 1982, previa a
entrega de uma unidade pronta,
o S-30 Tupi -que deu nome à
classe de submarinos mais moderna em operação no Brasil. O
principal ponto do acerto, porém, era a previsão de produção
de três aparelhos sob licença, o
que de fato ocorreu. Assim, a
frota incorporou, além do Tupi,
o Tamoio, o Timbira e o Tapajós. Cada um custou cerca de
US$ 200 milhões.
Versão aprimorada
Com a aquisição da tecnologia,
o Arsenal da Marinha capacitou-se a desenvolver, com assistência
alemã, uma versão aprimorada
do IKL-209, com sensores mais
avançados, como controles eletrônicos para tiro. Só 15 países
operam tecnologia similar.
A Marinha agora trabalha para
construir do SMB-10, uma versão maior e mais potente, com
design nacional. A idéia da Marinha é construir uma ou duas
unidades do aparelho, para torná-lo plataforma do seu grande
sonho: o submarino nuclear.
Por outro lado, há más notícias. O Tikuna consumiu nove
anos de trabalho, o dobro do
tempo planejado. A Marinha se
queixa da falta crônica de verbas, o que é verdade, também é
fato que os almirantes gastaram
muita energia no período com a
aquisição do porta-aviões São
Paulo.
"Pechincha"
O antigo Foch francês foi comprado para substituir o ainda
mais idoso Minas Gerais por
uma pechincha: US$ 12 milhões
em 2000. Só que ele veio ""pelado" e sem o principal, os aviões.
O governo então fez outro ""bom
negócio": US$ 70 milhões por
uma esquadrilha de caças A-4
usados do Kuwait.
O problema é que os A-4 não
possuem armamento operacional, ou seja, os que estiverem em
condição de vôo não teriam como participar de forma efetiva
de um combate. Ou seja, o São
Paulo praticamente só serve hoje
para treinar os pilotos a pousar e
decolar do deque.
A aquisição mostra uma mania de grandeza discutível do
ponto de vista estratégico. Porta-aviões são projeções de poder
-não por acaso, os colossos
americanos são a expressão da
capacidade de Washington de se
impor em todo o mundo.
Ocorre que o Brasil não consegue nem cuidar da chamada
""Amazônia Azul", a imensa área
(metade do tamanho do Brasil)
de mar sob sua alçada que compreende a região da plataforma
continental e a zona de exploração econômica que dista 200 milhas náuticas da costa.
Status
Há quem argumente que o
porta-aviões dá status de país
grande e, principalmente, credencia o Brasil para efetuar missões da ONU e assim turbinar
sua candidatura a um assento
permanente no Conselho de Segurança. Mas poucos discordam
que o submarino é uma arma
mais eficaz taticamente e estrategicamente, além de mais barata de operar.
Aí entram os problemas do
programa nuclear da Marinha.
Primeiro, a Força tomou para si
o processo em 1979. O controle
dos militares pôs o programa
numa redoma de segredo. Houve ganhos tecnológicos para o
país, que passou a dominar o
processo de enriquecimento de
urânio. Mas esses ganhos, além
de lentos pela descontinuidade
dos investimentos e dificuldades
técnicas, tiveram pouca interação com a sociedade a que deveria beneficiar.
Para seus defensores, o ganho
foi tão claro que houve até uma
crise diplomática, no ano passado, por conta das ameaças que o
programa poderia conter. Surgiram antigas suspeitas de roubo
de tecnologia européia que nunca foram confirmadas.
Há também a crítica de quem
considera esse tipo de gasto desnecessário num país de Terceiro
Mundo cheio de outras carências. Neste ano, deve consumir
cerca de R$ 57 milhões, valor
baixo se comparado a outros
programas do Ministério da Defesa -o novo avião presidencial
custou três vezes mais.
Se der certo, o aparelho brasileiro chegará ao mar depois de
torrar US$ 1,4 bilhão ou mais. A
mais recente classe nuclear americana, a Seawolf, sai por US$ 4,4
bilhão a unidade, mas trata-se,
no caso, do topo da cadeia alimentar desse tipo de predador.
De todo modo, os sucessivos
atrasos vão manter a discussão
em pé pelo menos até 2020, data
estimada para o lançamento do
submarino nuclear brasileiro.
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