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LEGISLATIVO X JUDICIÁRIO
CCJ só recomenda repasse de dados se juiz não puder obtê-los diretamente do órgão que o produziu
Câmara veta acesso de juiz a CPI inacabada
SILVANA DE FREITAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara criou ontem uma dificuldade para o acesso de juízes a documentos obtidos
por CPIs por meio de quebra de
sigilos bancário e telefônico: eles
não deverão receber da Câmara
dados de comissões de inquérito
inacabadas, como a da Nike e a do
Banestado.
Desde 1995, já vigora outro obstáculo: a Câmara se considera desobrigada de liberar, para investigações judiciais, documentos que
não constem do relatório final, ou
seja, que atinjam pessoas que não
foram apontadas como suspeitas
de praticar crimes.
Ontem, a CCJ aprovou parecer
do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), o candidato derrotado do governo à presidência
da Câmara, que só recomenda o
repasse de dados se o juiz não puder obtê-los diretamente do órgão de origem que o produziu, como a instituição financeira no caso do sigilo bancário.
A questão é polêmica porque
cabe à Justiça aprofundar as apurações iniciadas no Congresso, e o
juiz, em tese, sempre pode requisitar os dados diretamente à operadora telefônica ou ao banco,
mas isso pode atrasar as investigações e permitir a prescrição do
crime (fim do prazo em que é possível haver condenação), favorecendo a impunidade.
O parecer foi aprovado em votação simbólica, por 19 votos contra
9. O PT ficou dividido. De um lado, Greenhalgh e José Mentor
(SP), relator da CPI do Banestado,
foram a favor da restrição, dizendo que o Legislativo não é subordinado ao Judiciário e que não é
papel da Câmara ajudar na instrução criminal.
De outro, o deputado José
Eduardo Cardozo (PT-SP) foi
contrário. "A decisão é equivocada. A Câmara não pode jamais se
recusar a acatar uma decisão judicial", disse Cardozo. Na mesma linha, o deputado Sérgio Miranda
(PC do B-MG) disse que a Câmara
está contrariando o princípio da
economia processual. "Trata-se
de uma questão de interesse público, e o interesse público é uno e
indivisível."
A CCJ respondeu a uma consulta da Comissão Especial de Documentos Sigilosos, da própria Câmara. Em princípio, a resposta da
CCJ não precisará ser apreciada
pelo plenário e servirá apenas de
orientação para a comissão, segundo Greenhalgh.
A consulta foi motivada por decisões da Justiça Federal do Rio de
Janeiro, que quer documentos da
CPI da Nike para aprofundar investigações contra a CBF (Confederação Brasileira de Futebol).
A CPI da Nike encerrou os trabalhos em 2001 sem a aprovação
do relatório final. Em dezembro
último, terminou o prazo de funcionamento da CPI do Banestado,
também sem a votação do relatório final. As duas ficaram inacabadas por problemas políticos.
A do Banestado obteve documentos da quebra do sigilo de instituições financeiras dos Estados
Unidos. Por problemas burocráticos entre o Poder Judiciário dos
dois países, a Justiça brasileira pode, em tese, demorar a conseguir
os mesmos dados.
Os investigados pela CPI da
Terra, que está em curso, também
serão beneficiados se for confirmado o risco de ela terminar sem
a aprovação do relatório final. Entre os investigados estão duas entidades ligadas ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra) e defendidas judicialmente por Greenhalgh.
STF critica
Dois ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) ouvidos pela Folha criticaram o parecer de
Greenhalgh. Eles falaram em caráter reservado, porque disseram
que poderão examinar essa polêmica no julgamento de algum caso concreto. Um deles disse que o
juiz poderá buscar uma liminar
contra a recusa da Câmara em enviar dados.
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Nicolao Dino, também protestou. "A busca do documento
na fonte pode demorar. Se já existe a prova produzida [na CPI],
por que criar nova dificuldade?"
Autor do parecer que recomenda à Câmara não repassar a juízes
documentos sigilosos obtidos por
CPIs inacabadas, o deputado Luiz
Eduardo Greenhalgh (PT-SP) negou que isso vá prejudicar investigações judiciais relacionadas a fatos apurados pelas CPIs da Nike e
do Banestado.
Greenhalgh disse que a posição
firmada ontem pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) é
coerente com a anterior, de 1995,
em que a Câmara ficou desobrigada de fornecer dados de pessoas não indiciadas no relatório
final de cada CPI.
Ele disse ainda que "o Legislativo tem o mesmo nível de autonomia e de independência que o Judiciário e o Executivo". Por isso,
não pode ficar "subordinado" a
outro Poder.
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