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São Paulo, terça-feira, 10 de junho de 2003

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ADMINISTRAÇÃO

Integrante da Comissão de Ética Pública receberá R$ 1,8 mi

BNDES apóia fábrica no ABC e beneficia aliado de Lula

RUBENS VALENTE
JULIA DUAILIBI
DA REPORTAGEM LOCAL

Apoiado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o empréstimo de R$ 25 milhões do BNDES a uma cooperativa de metalúrgicos de Diadema (SP) beneficiou um aliado do presidente e integrante da Comissão de Ética Pública, ligada ao gabinete da Presidência, Antoninho Marmo Trevisan.
Uma cláusula do contrato assinado entre o BNDES e a Uniforja (Cooperativa Central de Produção Industrial de Trabalhadores em Metalurgia) destinou, a fundo perdido, R$ 600 mil para o pagamento de "serviços de consultoria" da cooperativa.
O dinheiro -equivalente à sobra (lucro) obtida pela cooperativa no ano passado- pagará serviços de consultoria da Trevisan Consultores de Empresas, cujo sócio majoritário é Antoninho Marmo Trevisan. Além disso, o consultor receberá da Uniforja R$ 1,2 milhão ao longo de três anos.
O presidente do BNDES, Carlos Lessa, disse que o projeto foi aprovado pela área técnica do banco em 2002 (leia texto abaixo) e concluído na atual gestão. O banco já liberou R$ 22 milhões.
A Uniforja e o BNDES não permitiram acesso ao contrato (o banco prometeu-o para a próxima quinta-feira), mas a Folha localizou cópia do documento no cartório do Registro de Títulos e Documentos de Diadema.
A liberação dos recursos do BNDES foi anunciada por Lula em evento realizado na empresa no último dia 29. Trevisan estava no palanque ao lado dele. Lula agradeceu em público pelo estudo de Trevisan, mas não explicou que o consultor recebeu recursos oriundos dos cofres públicos.
Lula atuou desde o princípio a favor do projeto. Foi ele quem apresentou Trevisan aos cooperados, em agosto de 2000.
"A Trevisan foi uma grande parceira nessa construção. E o Lula ajudou muito, ao estimular o Trevisan a fazer [o estudo], estimular o próprio sindicato a estudar o assunto para valer, a investir nisso", contou o então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e recém-eleito presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Luiz Marinho.
Candidato de Lula à presidência da CUT, Marinho foi um importante elo entre Trevisan e Uniforja. "Eles assinaram um contrato de risco. Se saíssem os recursos, a consultoria receberia. Se não saíssem, não receberia", explicou.

Votos perdidos
O presidente da Uniforja, José Domingos dos Santos, disse ter ouvido de Lula, então candidato à Presidência, em 2002, que "Fernando Henrique Cardoso não sabia a quantidade de votos que estava perdendo" no ABC ao não fomentar projetos daquele tipo.
Lula fez comício na Uniforja durante a última campanha presidencial, em julho. Logo após, prometeu a seus diretores trabalhar pelo empréstimo. O contrato entre a Uniforja e a Trevisan, de São Paulo, foi assinado em janeiro.
Do valor total de R$ 1,8 milhão, a Uniforja tem assegurados os R$ 600 mil não-reembolsáveis. Os outros R$ 1,2 milhão -a serem pagos em parcelas trimestrais de R$ 150 mil- dependerão dos resultados que a empresa espera obter a partir do dinheiro recebido do BNDES. Só para o capital de giro ela receberá R$ 4,8 milhões.
Além de integrante da Comissão de Ética Pública, que julga casos de violação do Código de Conduta que orienta os 750 servidores da alta administração federal, Trevisan é membro do CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) e atuou na campanha de Lula, fazendo contatos com empresários.
Santos, da Uniforja, considerou a participação de Lula "essencial" na liberação dos recursos.
Sem o empréstimo, a Trevisan dificilmente seria contratada, segundo reconhecem Santos e a empresa. "A Uniforja não tinha dinheiro para pagar a consultoria", disse um dos sócios da Trevisan, Eduardo Pocetti. Ele afirma que o valor cobrado pela empresa está 50% abaixo do de mercado.
A Uniforja é considerada a mais bem sucedida experiência do cooperativismo. O grupo de funcionários enfrentou situações das mais adversas -como ameaças de corte de energia elétrica pela Eletropaulo, por causa do atraso do pagamento, e de despejo- até conseguir tirá-la do vermelho.
A empresa, que tinha faturamento de R$ 5 milhões há cinco anos, atingiu R$ 32 milhões no ano passado e deverá passar dos R$ 90 milhões em 2003, segundo projeções da Trevisan. A sobra ainda é pequena -R$ 2,3 milhões em 2001 e R$ 650 mil no ano passado-, mas tende a aumentar, com o empréstimo do BNDES.
A Uniforja gera 251 empregos diretos e cerca de 840 indiretos.


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