São Paulo, quarta, 10 de junho de 1998

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ELIO GASPARI
FFHH não se deixará fritar

Ao seu estilo, FFHH tomou uma decisão: não se deixará fritar. Ele sabe que chegou ao poder amparado na perna gorda do conservadorismo nacional e que essa astuciosa jibóia, capaz de digerir ditaduras e democracias, demagogos e doutores, frita presidentes debilitados com a naturalidade com que mulher de bodegueiro frita sardinha.
Fritaram o general Figueiredo (aquele que saiu pelos fundos do palácio) e José Sarney (aquele que na última semana de governo nem passaporte diplomático conseguiu). Fernando Collor, que não quis ficar na frigideira, foi para a máquina de moer carne e serviram-no como almôndega.
FFHH pode vir a ser frito se o conservadorismo que com tanta competência encantou vier a descobrir que ele deixou de ser a melhor opção para impedir uma vitória de Lula.
Seu enfraquecimento e a ressurreição de Lula indicam que a eleição terá um segundo turno. Até aí não aconteceu muita coisa, pois Lula é visto como perdedor experimentado. Se isso fosse pouco, carrega consigo a mala de intolerância e mistificação do engenheiro Leonel Brizola. Se a derrota petista fosse realmente inexorável, estaria tudo bem, mas há alguns fatores inquietantes.
Tanto em 1989 quanto em 1994, Lula foi derrotado por adversários ascendentes. Desta vez, ele está em alta, enquanto o presidente está em queda. Apostar numa queda de Lula é coisa fácil, mas ter que apostar também numa ascensão de FFHH pode ser muito risco para uma jibóia conservadora.
Uma das esperanças dos marqueteiros do Planalto é o medo de última hora da classe média. Ela ameaça votar em Lula, mas, quando chega a hora decisiva, prefere qualquer coisa a ele. Assim foi em 1989 e em 1994, mas desta vez há um complicador. Chama-se Ciro Gomes.
Os votos que não tiverem coragem de acompanhar Lula até a urna não precisarão voltar para FFHH. Poderão parar no meio do caminho, num candidato capaz de se apresentar como depositário das virtudes dos dois (o Real de FFHH e o oposicionismo de Lula). É verdade que, enquanto FFHH e Lula saíram da luta contra a ditadura, Ciro nasceu no PDS e, enquanto ocupou o Ministério da Fazenda, foi feliz condômino da fase de manipulação eleitoral do Plano Real. Infelizmente, recordações desse tipo acabam se tornando irrelevantes numa campanha eleitoral.
Por enquanto, Ciro Gomes está disputando a lanterna com Enéas, mas bastará uma faísca para que sua candidatura apareça como terceira via, onda rosa, novo rosto ou seja lá o que for.
Essa faísca pode estar sendo produzida pelo próprio Planalto, pois a sua tática de satanização de Lula chega a ser infantil. Está claro que o candidato petista vem sendo engordado por eleitores que resolveram se afastar de FFHH. Esse pessoal não está zangado porque ficou fora do Proer, mas porque lhe ofereceram mais empregos e puseram-lhe a pecha de trambolho sem condições de empregabilidade.
Mudaram de ponto de vista muito mais por decepção do que por revolta. Se alguém os convencer de que o sapo barbudo é a encarnação de Asmodeu, eles não precisarão voltar para a sala de aula do professor Cardoso. Têm um Ciro à mão.
Bastará um murmúrio da rua indicando que esse movimento está em curso para que todas aquelas forças que se aliaram a FFHH (e Collor) para barrar o caminho de Lula passem a ver no ex-ministro da Fazenda um novo Messias.
FFHH acredita na sua capacidade de recuperação e tudo indica que ela seja muito maior do que se supõe. Teme, porém, que seus aliados resolvam fazer um seguro de suas vidas à custa de sua existência. Teme sobretudo que esses aliados o deixem a pé caso a situação econômica do país venha a exigir mais pílulas amargas. Resulta claro que hoje lhe falta suporte político para continuar candidato e baixar um pacote semelhante ao que produziu em outubro passado. Nesse caso, entre o pacote e a candidatura, fica com o pacote e sai do palácio como o presidente que governou com as menores taxas de inflação da segunda metade do século.



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