São Paulo, domingo, 10 de julho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ PT X PT

Agravamento da crise provoca afastamento; Campo Majoritário aponta sucessor

Genoino deixa presidência do PT; Tarso Genro assume

FÁBIO ZANINI
EM SÃO PAULO

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Apesar do esforço do Campo Majoritário, ala que comanda o partido, José Genoino deixou ontem a presidência do PT.
A detenção de José Adalberto Vieira da Silva, assessor do deputado estadual José Nobre Guimarães (PT-CE), irmão de Genoino, com R$ 437 mil em notas, anteontem, foi o estopim da renúncia. Mas o ex-presidente já estava desgastado com as denúncias de seu suposto envolvimento no escândalo do "mensalão".
Em seu lugar, assume o atual ministro da Educação, Tarso Genro. Seu nome foi apresentado pelo Campo Majoritário (ala que domina o partido, com cerca de 60% dos votos), ontem, durante reunião do Diretório Nacional, em São Paulo. Foi considerado "inegociável".
Tarso deverá deixar o Ministério para assumir o partido. O mais cotado para assumir a pasta é o atual secretário-executivo, Fernando Haddad.
Outras modificações anunciadas ontem à noite são as escolhas do ministro demissionário do Trabalho, Ricardo Berzoini, para a Secretaria-Geral, do deputado federal José Pimentel (CE) para a tesouraria e do ex-ministro da Saúde Humberto Costa para a Secretaria de Comunicação.
Costa deve substituir Marcelo Sereno, que ontem à tarde também se afastou, tornando-se o quarto petista da cúpula partidária a cair em razão do escândalo do "mensalão".
Os novos integrantes da Executiva petista foram referendados pelo diretório -uma mera formalidade, uma vez que foram apontados pela ala majoritária.
Genoino pediu seu afastamento do cargo logo no início da reunião, o que foi imediatamente acatado. Houve choro e palavras de solidariedade ao agora ex-presidente da legenda.

"Dever cumprido"
"Deixo o partido com o sentido de dever cumprido", afirmou Genoino, olhos marejados, em um depoimento de oito minutos à imprensa, depois de anunciar sua decisão ao diretório.
Estava cercado pela cúpula do partido, como os líderes do governo no Senado, Aloizio Mercadante (SP), e na Câmara, Arlindo Chinaglia (SP) e o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil).
"Vamos dar a volta por cima", declarou, esclarecendo que sua saída poderia fortalecer a unidade do partido e preservar a governabilidade do presidente Lula. Genoino disse que estes "valores" estariam acima de sua carreira.
"Temos que colocar minhas pretensões e minhas opções em segundo plano e em segundo lugar", declarou.
Ele presidia o PT havia 30 meses, desde que Dirceu licenciou-se do cargo para ser ministro da Casa Civil. Era um dirigente próximo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sofreu críticas por atrelar excessivamente o partido ao Palácio do Planalto.

Imagem forte
A prisão do assessor parlamentar do irmão foi o que precipitou a saída. A imagem de notas de reais e dólares divulgadas pela imprensa foi avaliada como muito forte, independentemente da falta de responsabilidade pessoal de Genoino no episódio. Antes da prisão, a intenção era permanecer no cargo, mesmo debilitado.
Curiosamente, ele não citou o fato no discurso aos companheiros de partido. Emocionado, declarou que encarava a presidência do PT como uma "missão", que lhe teria sido confiada por Lula. "Meu projeto político era outro."
Também reconheceu que deveria ter feito do PT um partido mais presente no dia a dia do governo, uma crítica sobretudo da esquerda partidária, que diz que Lula virou refém de partidos da direita. "Talvez eu não tenha exercido o protagonismo necessário junto ao governo", afirmou.
Em um momento particularmente emotivo, declarou que sentia-se ontem como se sentiu em 1972, ao ser preso durante a guerrilha do Araguaia.
Os afastamentos de Genoino e Sereno seguem as renúncias de Delúbio Soares e Silvio Pereira, que ocupavam os respectivos cargos de tesoureiro e secretário-geral do partido.
Todos tiveram seus nomes envolvidos com o escândalo do "mensalão", suposto pagamento de mesada a parlamentares da base aliada em troca de apoio ao governo. As denúncias foram feitas pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), que apontou o publicitário Marcos Valério como operador do pagamento.
Recentemente, descobriu-se que Valério tinha sido avalista de dois empréstimos para o PT, estabelecendo um elo entre a legenda e o publicitário.
Genoino assinou os empréstimos obtidos pelo partido nos bancos Rural e BMG, tendo Valério como avalista.
"Certamente cometemos erros, mas não praticamos atos ilícitos. O PT não paga nem compra deputados", afirmou Genoino.
Uma questão em aberto é o futuro do próprio Genoino.
Ele é candidato a presidente do partido no processo de eleição interna, marcado para setembro, no qual votam 840 mil filiados. A decisão de permanecer ou não candidato terá de ser feita nesta semana, mas a tendência é que o nome escolhido para seu lugar o substitua também na eleição.
Ontem, o presidente demissionário respondeu a apenas uma pergunta a respeito de seu futuro. "A partir de agora serei José Genoino, ex-deputado federal, e tenho de cuidar da minha sobrevivência", disse ele, que está sem mandato e agora sem emprego.

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