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São Paulo, domingo, 10 de agosto de 2003

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REFORMA SOB PRESSÃO

Ministro prefere fundo privado, sem fins lucrativos, a ter União, Estados e municípios gerindo recursos

Berzoini vê risco de ingerência nos fundos

MARTA SALOMON
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Caracterizados como "públicos" na atual versão da reforma da Previdência, os futuros fundos de pensão dos servidores civis precisam de regras que impeçam a ingerência dos governos federal, estaduais ou municipais na sua gestão. O risco de ingerência preocupa o ministro Ricardo Berzoini (Previdência), que preferia fundos privados e sem fins lucrativos, como os fundos das empresas estatais. Para ele, "onde há muito dinheiro, há risco".
Uma análise do comportamento de fundos de previdência de municípios indica o tamanho do problema que poderá surgir em decorrência do novo modelo de aposentadoria e pensão dos servidores. Dos 2.145 fundos administrados por prefeituras, 451 estão em situação irregular, ou seja, não cumprem a legislação e podem apresentar desequilíbrios. Segundo Berzoini, a ingerência política é um dos fatores de desequilíbrio.
Esses fundos geridos por prefeituras não seguem exatamente o modelo daqueles que serão criados após a reforma da Previdência. No caso das cidades, eles não complementam o valor da aposentadoria acima do teto do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), mas bancam toda a aposentadoria a partir de contribuições dos servidores e das prefeituras.
Para evitar a ingerência política, o ministro quer alterar a lei (complementar número 108) que trata da relação entre os governos e os fundos. Uma emenda definirá o que significa um fundo público: não terá fins lucrativos, embora possa investir, por exemplo, no processo de privatização ou em ações de empresas privadas. Ficará claro que os fundos não serão extensão dos governos, e seus administradores poderão ser responsabilizados por má gestão. "Isso dará maior segurança política", argumenta.
Embora os detalhes de funcionamento dos futuros planos sigam indefinidos, Berzoini diz que eles não correrão o risco de entrar em colapso, como ocorre atualmente com fundos semelhantes nos Estados Unidos. Lá, a crise foi gerada pela excessiva concentração de investimentos em ações e pelo modelo de benefício definido, descartado no próprio texto da emenda constitucional. O dispositivo é tido no governo como o principal avanço obtido na mais recente versão da reforma.

Aplicações
Pelo modelo de contribuição definida, o valor da aposentadoria vai depender da rentabilidade das aplicações do fundo. A principal diferença é que, nesse modelo, a União não terá de cobrir um eventual rombo nos fundos para bancar um certo valor de aposentadoria previamente definido.
Os futuros fundos de previdência complementar dos servidores civis podem vir a ser os maiores do país. Mas não há cálculos no governo, por ora, de quantos bilhões esses fundos terão para movimentar investimentos.
O acúmulo de reservas vai demorar. Isso porque a adesão será voluntária tanto para os atuais servidores como para os futuros. "A Previ (fundo do Banco do Brasil, o maior do país) demorou muitos anos até chegar aos seus primeiros R$ 10 bilhões", observa Berzoini, do qual ele participa. "No curto prazo, será muito pouco para sustentar uma política de desenvolvimento do país."
Ele não tem dúvidas de que os fundos, tão combatidos pelos servidores públicos, representarão mecanismo importante de poupança interna no futuro. Esse é, aliás, o principal argumento em favor da criação da previdência complementar, tão importante quanto atenuar o peso das aposentadorias dos servidores nos cofres públicos.
Paralelamente à votação da reforma no Congresso, o governo prepara mudanças nas regras de investimentos dos fundos de previdência complementar. A principal delas estimulará investimentos em obras de infra-estrutura, que têm prazos de maturação mais longos. "Podemos abrir para investimentos em infra-estrutura desde que sejam bem amarrados e tenham retornos garantidos", disse o ministro.
Atualmente, a resolução 2.829 do Banco Central fixa limites rígidos para investimentos em ações e imóveis. A idéia é permitir investimentos de maior risco (maior exposição, no jargão técnico) aos fundos que só pagarão aposentadorias num futuro mais distante.

Modelo indefinido
O governo ainda não definiu se, após a aprovação da emenda constitucional no Congresso, vai criar um ou vários fundos de pensão dos servidores civis. As duas alternativas têm vantagens e desvantagens, segundo Ricardo Berzoini, como ganhos de escala num grande fundo único ou maior controle em vários fundos.
O ministro sinaliza uma preferência pessoal por mais de um fundo, separando integrantes de carreiras, ou, por exemplo, reúna as carreiras típicas de Estado. O governo não abre mão, no entanto, de que a iniciativa dos projetos de criação dos fundos seja do Executivo. Os juízes pressionam para propor as regras do seu fundo, o que é entendido como uma forma de escapar do teto de R$ 2.400 dos benefícios bancados pela União.
Segundo Berzoini, não há hipótese de a contribuição dos governos (União, Estados e municípios) para os fundos ultrapassar o valor da contribuição do servidor.



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