São Paulo, terça-feira, 10 de agosto de 2004

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JANIO DE FREITAS

O avesso da CPI

Provável origem de algumas das suspeitas e acusações que atingem integrantes do governo Lula, a CPI do Banestado reúne-se hoje em condições originais: seus integrantes é que estão postos sob suspeita e a própria CPI passa de investigadora a investigada.
A inversão de papéis resulta de pesadas pressões que os petistas do governo e do Congresso jamais exerceram em defesa da possível inocência de outros investigados de CPIs passadas. Hoje na liderança às acusações e pressões sobre a CPI do Banestado, contra a qual propõe uma investigação formal, o senador Aloizio Mercadante foi, entre sua primeira eleição para deputado e o início do governo petista, um dos mais audaciosos e persistentes atiradores de acusações, nem precisando de CPIs para tal disposição.
A ira do governo e da cúpula petista, portanto, não se alimenta de princípios. Começa no compreensível incômodo de se ver como alvo de acusações semelhantes às que o petismo tanto fez. E ganha tamanho e força na constatação de que várias das suspeitas e acusações não têm respostas que as invalidem. A ira do governo tem muito mais de admissão que de negação.
Daí não decorre que se justifique a priori o vazamento de dados e fatos sob sigilo legal de investigação, como é o caso de grande parte do que interessa à CPI do Banestado. Mas, de saída, é o sigilo de investigação que se pode questionar em uma CPI. Mesmo se admitido o sigilo, o vazamento de um dado ou fato pode ser necessário à defesa do interesse público, à moralidade administrativa e a outras razões assim maiores. Nesse sentido, é muito significativo que magistrados, com freqüência, têm reconhecido como justificadas pelo bem público muitas notícias que geram ações judiciais.
Outro motivo para questionar-se o sigilo está na necessidade de lisura das iniciativas e conclusões de uma CPI. São conhecidos casos de parlamentares, em CPIs passadas, que usaram de convocações e de ameaças investigativas (de Imposto de Renda, contas pessoais, patrimônio) para vinditas e para extorsão. Motivos menos graves e mais numerosos são, por exemplo, conchavos parlamentares e operações do gênero "é dando que se recebe".
A pretexto de proteger a possível inocência de uns poucos investigados, o sigilo facilita o caminho a numerosas improbidades, talvez maiores e piores que o alvo da CPI. Com ou sem sigilo, o que governo e comando petista precisam é dar resposta convincente, se puderem fazê-lo, às suspeições e acusações, que não procedem só da CPI do Banestado.


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