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ENTREVISTA DA 2ª
Tasso quer governo "com cara do PSDB'
"É um constrangimento (ter Ciro
Gomes candidato), sem dúvida.
Somos parceiros, amigos, temos
uma história comum na política
do Ceará. Mas sou do PSDB e acho
que o nome ideal para tocar
adiante o projeto de país é o Fernando Henrique."
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"Eu discordo dessa declaração
(de Gustavo Franco, que faltam
recursos), porque esse governo já
fez muitos investimentos na área
social e tem plena condição de
fazer mais ainda. Precisa
aprofundar, consolidar e focar
mais num determinado grupo."
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ELIANE CANTANHÊDE
enviada especial a Fortaleza
O governador do Ceará, Tasso
Jereissati (PSDB), defende uma
ampla reforma ministerial caso o
presidente Fernando Henrique
Cardoso seja reeleito este ano.
Ele acha que um segundo governo deverá ficar "mais homogêneo, com caras mais parecidas
umas com as outras e falando a
mesma língua".
Na sua opinião, um eventual novo governo deverá ter "a cara do
PSDB", ser mais desenvolvimentista e mais focado no social. "Um
governo muito diferente desse que
está aí", disse.
Falou também de suas divergências com a equipe econômica do
governo FHC, mas não quis particularizar críticas a Gustavo Franco
(presidente do Banco Central) ou
a Pedro Malan (ministro da Fazenda).
O governador cearense admitiu
que é constrangedor ter seu afilhado político Ciro Gomes como adversário de Fernando Henrique
Cardoso na corrida presidencial.
Ciro, do PPS, está em terceiro lugar nas pesquisas de opinião, em
patamar bem inferior ao de FHC e
Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em entrevista à Folha, no seu
gabinete em Fortaleza, ele mostrou que apesar de disputar o terceiro mandato no Ceará continua
atento às questões nacionais. E
não descartou uma futura candidatura presidencial.
Seguem os principais trechos da
entrevista:
Folha - Se o presidente Fernando
Henrique Cardoso for reeleito, o
que se pode esperar do segundo
mandato?
Tasso Jereissati - A expectativa
de todos nós, acho que até do próprio presidente, é que seja um governo bastante diferente desse que
aí está.
O atual ficou muito preso às reformas e aos três quintos (dos parlamentares) para as votações no
Congresso. Em função disso, teve
suas ações bastante limitadas. O
próximo governo precisará ter
uma postura mais desenvolvimentista e uma aliança política mais
compacta e mais consolidada.
Folha - Quais foram os grandes
nós por causa dessa dependência
do governo às reformas e aos três
quintos?
Jereissati - O presidente foi
obrigado a ficar constantemente
correndo atrás das reformas e elas
exigiam alianças e negociações
muito amplas.
Folha - O sr. está falando em barganha?
Jereissati - Não propriamente,
mas é uma situação difícil. Em determinados momentos o governo
teve de ceder onde não queria ceder. As negociações eram sempre
específicas, em cima de temas e
projetos também específicos.
Eram negociações muito desgastantes.
Folha - Parte disso é pelo sistema
político, mas outra parte não é pela própria característica de um governo que ficou marcado pela
compra de votos?
Jereissati - Não concordo. Que
houve uma grande negociação política, sem dúvida nenhuma houve. Mas não houve compra de voto. Isso é uma expressão muito forte. E as negociações foram necessárias porque as reformas eram
fundamentais para o país, o governo tinha de enfrentar.
Folha - A reeleição também era
fundamental para o país?
Jereissati - A reeleição ficou
muito importante num determinado momento. Depois que ela foi
lançada, não tinha mais jeito. Ou
ela era aprovada ou o Brasil parava. Não dava para voltar atrás.
Folha - E agora, com as reformas
praticamente concluídas?
Jereissati - Agora, vencida a
etapa das reformas, mesmo que
elas tenham ficado capengas, está
na hora de fazer um governo mais
com a cara do PSDB.
Um governo que tenha o crescimento sustentável, com perspectiva de crescimento grande e constante, mas com uma perspectiva
de melhor distribuição de renda e
de melhor distribuição espacial
dos recursos, hoje muito concentrados no Centro-Sul.
Um governo que tenha no combate à miséria e à pobreza um de
seus objetivos principais,
Folha - É possível fazer esse governo com a cara do PSDB sem mudar a equipe econômica?
Jereissati - Acho que é possível,
sim. O problema não foi o Malan
(ministro da Fazenda, Pedro Malan) e o Gustavo Franco (presidente do Banco Central). Foi o governo ficar muito preso aos três quintos do Congresso (necessários para mudanças constitucionais).
Folha - O Gustavo Franco deu entrevista dizendo que não há recursos. O sr. concorda com ele?
Jereissati - Eu discordo dessa
declaração, porque esse governo já
fez muitos investimentos na área
social e tem plena condição de fazer mais ainda. Precisa aprofundar, consolidar e focar mais num
determinado grupo, desprezando
dentro do possível as políticas
compensatórias.
Hoje, o índice de crianças dentro
da escola, entre 7 e 14 anos, deve
ser mais de 90%. No Ceará, já podemos falar que não haverá analfabetos na próxima geração.
Folha - Com um déficit fiscal de
quase 7% do PIB ainda é possível
se pensar em prioridade para a
área social? Ou a prioridade é combater o déficit?
Jereissati - Uma coisa não exclui a outra. É possível fazer um
programa de ajuste fiscal e dar
prioridade a essas questões: saúde,
educação, saneamento básico.
Folha - Quando o sr. fala em pacote fiscal...
Jereissati - "Pera lá". Eu não
falei em pacote, falei em programa.
Folha - Foi um ato falho, porque
está se criando uma sensação de
que pode vir um pacote fiscal depois das eleições.
Jereissati - Não acredito nisso.
Seria insensato, não tem sentido,
não precisa. Acredito que, se houver alguma modificação de maior
profundidade, virá a partir do programa de governo montado para o
segundo mandato.
Folha - O sr. não acha que com o
déficit atual deve haver medidas
de choque, não só de longo prazo?
Jereissati - Não necessariamente. Já está comprovado que o
que dá certo não são medidas de
choque, são as medidas que tenham efeito gradual, constante,
seguro.
Folha - O que, por exemplo?
Jereissati - No caso de déficit, a
primeira tem que ser a queda dos
juros. Outra é definir prioridade
para os investimentos. O pacote
fiscal do ano passado foi uma dose
cavalar.
Reconheço que é melhor você
exagerar na dose para mais do que
fazer o mal sem ter o resultado.
Mas, na hora em que a credibilidade da economia está se restabelecendo, é preciso rever isso.
Folha - Sempre que se fala em
déficit, a área econômica põe a
culpa nos Estados. O sr. veste a carapuça?
Jereissati - Existe uma posição
comodista, principalmente da
área econômica, de botar sempre a
culpa nos Estados. Não é bem assim. Todos temos de fazer algum
tipo de corte, de sacrifício, de redução de alguns investimentos.
Mas isso não pode estancar os investimentos prioritários e tem de
ser trabalhado mais em conjunto
no segundo mandato.
O jogo de empurra não foi bom
para ninguém.
Folha - Na sua opinião, qual deve
ser o papel de cada um, governo
federal, Estados e municípios, no
esforço de cortar os gastos?
Jereissati - Até que se defina isso, que é mais complicado, é preciso definir melhor o papel de cada
um na educação, na saúde, no saneamento básico.
Até hoje, isso não está claro. Algumas prioridades que são nacionais devem ser assumidas pelo governo federal. Não adianta empurrar.
Folha - Essa falta de parâmetros
não vai dificultar, até impedir, a
reforma tributária?
Jereissati - Ela é extremamente
necessária, mas é dificílima de ser
feita exatamente por causa disso.
Ela não vai implicar somente no
que a maioria da pessoas pensa,
que é aumentar ou mudar esse ou
aquele imposto.
A maior dificuldade é a definição
do que vai caber a cada um, ao governo federal, aos Estados e aos
municípios. Mexer nisso é delicadíssimo, porque ninguém admite
perder.
Folha - O que o governo federal
diz é que os Estados querem descentralizar os recursos, não os encargos.
Jereissati - É por isso que é preciso discutir muito. Eu nunca vi a
proposta do governo. Acho que os
outros governadores também não.
Tenho até a impressão de que não
existe.
Folha - O sr. não falou nenhuma
vez a palavra desemprego, que está crescendo e é um dos maiores
flancos para os candidatos à reeleição.
Jereissati - Quando falo de
crescimento econômico estou falando de criação de empregos. Fala-se muito hoje do desemprego
como um problema estrutural e
blablablá.
Mas o ponto de partida para resolver a questão é o crescimento
econômico, uma política industrial mais agressiva e uma política
de emprego mais bem planejada.
Faltou isso ao país.
Folha - Ao país ou ao governo?
Jereissati - Bem, está se trabalhando nisso agora, sempre com
base no crescimento econômico.
Qualquer política de emprego fora
disso é apenas paliativa. E não pode existir um país socialmente justo sem estar fiscalmente ajustado.
Folha - Mas o governo teve esse
enorme ônus político para votar as
reformas, como o sr. mesmo disse,
e nem por isso resolveu a questão
fiscal.
Jereissati - Não resolveu porque nenhuma das reformas está
efetivamente tendo efeito. As reformas administrativa e da Previdência, além de muito capengas a
meu ver, só vão ter efeito prático a
médio e longo prazos.
Mas, do ponto de vista da economia, a primeira reforma, da quebra dos monopólios, está trazendo
resultados formidáveis e terá efeitos importantes para o próprio
crescimento econômico.
A próxima reforma tem que ser a
política. Sem a fidelidade partidária, em que as negociações são
com partidos, não com parlamentares individualmente, não vamos
a lugar algum.
Folha - O presidente tem a máquina, o favoritismo nas pesquisas, a boa vontade da elite. Por
que precisou fazer tantos acordos
nos Estados para a reeleição?
Jereissati - Fernando Henrique
vai ser reeleito, ou não, ainda pelo
Real.
Folha - Isso só reforça a pergunta
anterior. Então, por que ele precisou fazer tantos acordos políticos?
Jereissati - Esses acordos são
ainda consequência dos acordos
congressuais. Tanto que as alianças estaduais são tão confusas
quanto as do próprio Congresso.
Daí a necessidade da reforma política. Se a reforma não for aprovada, nós vamos ter de escapar o
mais rapidamente possível dos
três quintos, das reformas constitucionais.
Até lá, qualquer presidente, seja
o Fernando Henrique, seja eu, seja
o Lula, seja o Ciro, seja o Enéas,
qualquer um ficará refém do Congresso.
Folha - Já que o sr. se colocou entre os presidenciáveis...
Jereissati - Eu só quis dizer que
até eu, que sou radicalmente contra isso, não teria outra alternativa.
Folha - Como vai ficar um eventual segundo governo FHC com
Maluf ou Rossi em São Paulo, César Maia no Rio e Itamar Franco em
Minas?
Jereissati - Não imagino nem
quero imaginar. As pesquisas mudam. Não é possível, por exemplo,
que o voto em Covas não suba em
São Paulo.
Folha - Vários líderes governistas
vão sobrar da eleição. O sr. prevê
uma reforma ministerial no próximo ano se FHC vencer?
Jereissati - O presidente nunca
me falou, mas eu acredito que o
ministério do futuro mandato será
um ministério novo com essas características que lhe falei.
E também mais homogêneo,
com caras mais parecidas umas
com as outras e falando a mesma
língua.
Hoje, todo mundo reconhece
que, em função das circunstâncias, o governo é muito heterogêneo.
Folha - Quem deve ser trocado?
Jereissati - (Rindo) Não sei. Só
sei que não deve haver ministério
para acomodar pessoas. Isso não.
Folha - E o constrangimento de
ter Ciro Gomes candidato?
Jereissati - É um constrangimento, sem dúvida. Somos parceiros, amigos, temos uma história
comum na política do Ceará.
Mas sou do PSDB e acho que o
nome ideal para tocar adiante o
projeto de país é o Fernando Henrique.
Folha - Mas ele está perdendo
para o Ciro aqui no Ceará. Para o
sr. é bom ou ruim o Ciro ganhar no
Estado?
Jereissati - Não é bom que o Ciro perca, é bom que o Fernando
Henrique ganhe.
Folha - Criou-se uma sensação de
que o FHC já ganhou, mas o Lula
tem de 25% a 30% dos votos sem o
governo, sem a máquina, sem a
mídia, sem a elite. Não é muito significativo?
Jereissati - O Lula tem uma força eleitoral constante, é inclusive
maior do que o PT. Dependendo
do grau circunstancial de insatisfação, isso cresce. Esse negócio de
dinheiro, de divulgação, é importante, mas o Lula independe disso.
Ele já é nacionalmente conhecido.
Folha - E o Ciro? Se ele tivesse
tido tempo e recursos, poderia
ameaçar FHC e Lula?
Jereissati - Nesse caso, sim, os
recursos são muito importantes,
porque ele precisa ser conhecido.
De qualquer forma, com a segurança que o Real dá, dificilmente
qualquer candidato terá chance
contra Fernando Henrique.
Folha - O que, afinal, animou o
sr. a disputar um terceiro mandato
no Ceará e abdicar de uma liderança nacional?
Jereissati - Foram os grandes
projetos que podem definitivamente mudar o perfil do Ceará e
ainda estão no meio do caminho.
A nova refinaria no porto de Pecém, integralmente com recursos
privados, é um deles. Outro é o que
chamamos de Projeto de Águas, de
interligação de bacias, com o Banco Mundial, e que vai tornar o Estado muito resistente à seca. O
Ceará ainda é minha prioridade.
Folha - O presidente costuma dizer que a geração dele acaba com
ele. Quem são os novos presidenciáveis? Um governador do Ceará
tem chances?
Jereissati - Na política, quatro
anos são uma eternidade e não dá
para prever nada. Acho difícil um
governador nordestino ter chances nesse tempo, mas tudo é imprevisível.
Folha - E o parlamentarismo?
Jereissati - Essa é a grande reforma política do país.
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