São Paulo, Terça-feira, 10 de Agosto de 1999
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Anistiados têm direitos extintos

PATRICIA ZORZAN
da Reportagem Local

À véspera de completar 20 anos, a Lei da Anistia teve seus benefícios financeiros revogados com a publicação, pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, de uma ordem de serviço no ""Diário Oficial" da União que extingue a aposentadoria excepcional para anistiados políticos.
Publicada no último dia 8 de julho, a ordem de serviço determina que, a partir de 7 de maio deste ano, anistiados ""compelidos ao afastamento de atividade remunerada" terão como único benefício a contagem do período de ""afastamento" como tempo de contribuição para a previdência, ""vedada a adoção de requisitos diferenciados".
A medida vale também para processos em andamento, o que, segundo a Associação Brasileira de Anistiados Políticos (Abap), atingiria cerca de mil anistiados.
O direito à aposentadoria excepcional -ou seja, ao recebimento de salário integral corrigido até outubro de 88, acrescido da possibilidade de promoções e de mais cinco anos extras como indenização- foi reconhecido pelo artigo 8º das Disposições Transitórias da Constituição de 88 e regulamentado pela lei 8.213/91.

Mandado de Segurança
Com a publicação da ordem de serviço número 623, os anistiados passam a ser enquadrados na legislação que prevê aposentadorias concedidas com base em vencimentos depois de 30 anos de contribuição, no caso de mulheres, e de 35, no de homens.
A ordem de serviço é uma medida explicativa do decreto de regulamentação da Previdência que não tem valor de lei, mas que, de acordo com a Abap, já vem sendo cumprida.
""Postos do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) de todo o Brasil estão se negando a dar entrada em processos de anistiados", declarou o presidente da entidade, Carlos Fernandes.
A Abap pretende entrar com um mandado de segurança no STJ (Superior Tribunal de Justiça), solicitando a anulação dessa determinação.
A advogada Paula Sapir Febrot, encarregada de 70 processos de anistiados, afirma que aposentadorias que, em geral, variariam de R$ 4.500 a R$ 5.000 passarão a ser de cerca de R$ 1.360.
""Estão tirando a vantagem que era dada aos anistiados. Dos requerentes, 90% nunca mais conseguiram recompor sua vida profissional. Poucos conseguiram ser presidente da República, ministro ou deputado", disse Febrot.

Prisão e exílio
Membro do comando nacional da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), organização de esquerda que participou da luta armada contra o regime militar brasileiro no final dos anos 60, a bancária Inês Etienne Romeu, 56, desde 94 tenta a concessão da aposentadoria excepcional.
Presa durante 8 anos e 4 meses no Rio de Janeiro, Romeu foi torturada pelos militares, mas em 95 teve seu pedido de declaração de anistiada negado pelo governo.
Caso a ordem de serviço seja mantida, a aposentadoria de Romeu, que, de acordo com ela, variaria de R$ 1.000 a R$ 2.000, passaria a R$ 200.
Vivendo dos recursos de uma caderneta de poupança e da ajuda da mãe e de uma irmã, Romeu sofre de depressão e gasta R$ 200 apenas em medicamentos. ""Terei de vender meu apartamento", afirma ela, que pretende ir amanhã a Brasília para protestar no Senado contra a medida.
Exilado durante 12 anos, o jornalista e membro da ALN (Ação Libertadora Nacional, uma dissidência do Partido Comunista Brasileiro) Paulo Cannabrava Filho, 64, vive o mesmo problema desde 95. Dos R$ 8.000 previstos de aposentadoria, deverá receber, pelo novo cálculo, R$ 1.200. ""A lei vale para o presidente, mas para nós, não? Não quero nada diferente do que Fernando Henrique Cardoso recebe", declarou.
Aposentado compulsoriamente do cargo de professor da USP pelo regime militar em 69, aos 37 anos, FHC recebia, em maio de 98, uma pensão de R$ 5.450.
A assessoria do Ministério da Previdência informou que a ordem de serviço 623 será republicada na próxima segunda-feira, mas que o artigo referente aos anistiados será mantido.


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