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SEGUNDO TURNO
Líder do PSB diz que não vai à TV pedir votos, rejeita participar de gestão petista e revela ser candidato à Presidência em 2006
Garotinho declara voto, mas ataca Lula e o PT
PLÍNIO FRAGA
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
O candidato derrotado à Presidência pelo PSB, Anthony Garotinho, 42, decidiu ontem apoiar
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no
segundo turno, mas rejeita sua
participação ou de seu partido em
um eventual governo petista.
Prega que a bancada socialista
no Congresso seja "independente", sem fazer parte da base de
apoio de Lula, caso este se eleja.
"Já rompemos o cordão umbilical
com o PT", afirmou à Folha.
Apesar do apoio, mantém discurso crítico sobre o petista. "Disse durante o tempo inteiro da
campanha que o Lula, para chegar ao poder, fez concessões demais. Minha expectativa é que ele
está enganando alguém."
O ex-governador do Rio diz que
não pretende participar dos programas de televisão do PT: "Para
quê? Ele [Lula] também vai aparecer ao lado do [José] Sarney".
O candidato do PSB obteve
mais de 15 milhões de votos no
primeiro turno, grande parte do
eleitorado evangélico. Mas avalia
que Lula tem de "esclarecer diversas dúvidas" se quiser o apoio deles. "Fomos maltratados por muitas administrações petistas, como
a do Cristovam Buarque quando
governou o Distrito Federal."
Como exemplo, ele cita dificuldades para a aprovação de construção de igrejas e problemas com
a lei do silêncio durante cultos
evangélicos.
Garotinho diz que não aceita ser
ministro de Lula, não indica ministros e não integrará o governo
de sua mulher, Rosinha, eleita governadora do Rio no primeiro
turno, tendo como principal adversária a petista Benedita da Silva. Rosinha ontem recebeu um telefonema do presidente Fernando
Henrique Cardoso, parabenizando-a por sua vitória. É o máximo
de diálogo que a família diz aceitar com os tucanos.
"Fiz a campanha inteira criticando o modelo econômico que
eles implantaram. Não faz sentido
conversar agora", declara Garotinho. Ele nega que o ex-ministro
do Trabalho Francisco Dornelles
tenha tentado aproximá-lo do
candidato do PSDB à Presidência,
José Serra.
O projeto de Garotinho é assumir a presidência da Fundação
João Mangabeira, responsável pela formação política e elaboração
de estratégias para o PSB. Aposta
que o partido terá candidatos nos
200 maiores municípios do país
na eleição municipal de 2004, de
olho em seu projeto futuro. "Pretendo disputar a Presidência em
2006", revela. Na sua análise, o
que mais prejudicou seu projeto
neste ano foi a ausência de dinheiro: "Em um cálculo preliminar,
nossa campanha custou apenas
R$ 2 milhões".
Folha - Por que o sr. vai apoiar Lula e que condições estabeleceu para tal?
Anthony Garotinho - As condições que estabelecemos ainda não
foram respondidas. Queremos
uma posição clara do PT sobre alguns pontos, nos quais Lula, durante toda a campanha, não foi
objetivo. Ele é contra ou a favor da
entrega da Base de Alcântara
(MA) para ser operada pelos americanos? Ele é contra ou a favor da
Alca (Área de Livre Comércio das
Américas), que significa a destruição do parque industrial brasileiro? Ele é contra ou a favor do acordo com o FMI (Fundo Monetário
Internacional) nos moldes em
que está feito, que impede a retomada do crescimento econômico? Ele é contra ou a favor da atual
política de enfraquecimento da
defesa nacional que destruiu as
Forças Armadas brasileiras, deixando-as em situação de miséria?
Por último, queremos um compromisso de recomposição do salário mínimo, já em 1º de maio de
2003, para R$ 280.
Folha - E se alguns desses pontos
não forem respondidos, na sua opinião, satisfatoriamente?
Garotinho - Uma coisa é o apoio
entusiasmado. Outra é a declaração apenas de voto. Uma resposta
clara e objetiva o quanto antes seria melhor para que pudéssemos
externar a esses brasileiros que
confiaram em nossa candidatura
a nossa posição.
Folha - "Apoio entusiasmado" incluiria comícios, viagens e aparições no programa eleitoral gratuito da televisão?
Garotinho - É isso que será discutido [hoje na reunião da Executiva Nacional do PSB, em Brasília]. Não fizemos ainda uma avaliação. Vamos dar uma resposta
política ao PT. Diferentemente do
que o PT fez em toda a sua história, quando se omitiu de tomar
posições. Nós não ficaremos
omissos. Na minha campanha de
1994, pelo governo do Estado,
contra Marcello Alencar, o PT
pregou o voto nulo no segundo
turno. Não quis votar em mim.
Não faremos isso agora. Temos
consciência da responsabilidade.
Mas vamos deixar bem claro: o
PSB não será mais um apêndice
do PT. Teremos identidade própria. Esse entendimento não significa adesão.
Folha - O sr. apóia Lula, mas não
aceita participação no governo?
Garotinho - Não. Porque o governo do PT, e digo isso agora,
quando talvez meu apoio possa
ser apenas uma declaração de voto, nada mais do que isso, porque
as alianças que o Lula fez levam a
crer num governo de grandes
problemas. Lula sinaliza com
uma área econômica conservadora e uma área social progressista.
Na hora em que a área social quiser gastar os recursos necessários,
a área econômica vai dizer: "Esses
recursos não existem". Como o
Lula vai decidir? Não será fácil.
Como brasileiro, torço para que
dê certo. Ele precisa deixar de ser
o "Lulinha paz e amor", porque
um presidente da República tem
de tomar decisões. Que vão agradar a uns e desagradar a outros.
Folha - Se o eleito for Lula, o sr.
defende que o PSB vá para a oposição?
Garotinho - Minha opinião pessoal, que vou defender na reunião
[hoje", é que o partido não participe do governo e fique numa posição de independência em relação
ao PT. Ou seja, naquilo que considerarmos certos, votamos a favor.
Naquilo que considerarmos errado, votamos contra.
Folha - O PT pretendia levar à televisão o sr. e Ciro Gomes (PPS), ao
lado de Lula, para simbolizar a
união de uma frente de oposição
que obteve 76% dos votos. O sr.
aceitará?
Garotinho - Não. Para quê? Ele
também vai aparecer do lado do
Sarney. Do lado do Antonio Carlos Magalhães.
Folha - O PT diferencia apoio
-caso de Sarney e ACM- de
aliança, o que estaria sendo proposto a PPS e PSB.
Garotinho - O PT me lembra
uma expressão: faço o que digo,
mas não faça o que eu faço. A vida
inteira o PT criticou isso que está
fazendo. O PT dizia que o grande
equívoco do FHC foi fazer o que o
partido está fazendo agora.
Folha - O sr. fez todas essas críticas na conversa que teve com o Lula, anteontem?
Garotinho - Não. Foi muito rápida.
Folha - É verdade que o PSDB
mandou emissários para tentar, se
não o seu apoio, mas ao menos que
se declarasse neutro na disputa?
Garotinho - Não. Ninguém do
PSDB me procurou. Fiz a campanha inteira criticando o modelo
econômico que eles implantaram.
Não faz sentido conversar agora.
Modelo que achatou os salários,
diminui o poder de compra da
classe média e não deu ao país
uma inserção soberana no mundo globalizado. Não poderia, de
forma alguma, ter a menor possibilidade de apoiar José Serra.
Folha - Grande parte de seus votos veio dos evangélicos. O sr. pretende trabalhar em favor de Lula
nesse segmento?
Garotinho - O apoio do PSB não
significa o apoio dos evangélicos
ao Lula. Existem muitas questões
que preocupam as lideranças
evangélicas e que o PT precisa esclarecer. Não me considero líder
evangélico, sou um político que é
evangélico. A minha posição como membro do PSB não significa
transferência de voto evangélico
para o Lula.
Folha - Que questões precisariam
ser esclarecidas para os evangélicos?
Garotinho - Prefiro que Lula
converse pessoalmente com eles,
como eu fiz. Se o Lula me pedir,
possa até ajudar de alguma maneira.
Folha - A tendência dos evangélicos hoje é Lula ou Serra?
Garotinho - Não sei. Mas há
muita resistência em relação ao
Lula, não há dúvida. Em alguns
governos petistas, o relacionamento com os evangélicos foi
muito difícil, especialmente em
Brasília, no governo Cristovam,
em temas como construção de
igrejas, lei do silêncio etc.
Folha - O sr. enfrentou pressões
durante toda a campanha, de
membros do seu próprio partido,
para renunciar. O sr. venceu a queda de braço interna e tornou-se a
principal liderança do partido?
Garotinho - Quem tem de fazer
essa avaliação é a direção partidária. Fizemos uma bancada aquém
da que esperávamos por falta de
recursos. Ela é maior do que tínhamos, mas não quanto esperávamos. Mas rompemos o cordão
umbilical com o PT. O PSB é a segunda força oposicionista da esquerda brasileira -maior do que
o PDT e o PPS. Vamos nos preparar para as eleições municipais de
2004 e teremos candidatos nas
200 maiores cidades. Fazer uma
campanha com a falta de recursos
que enfrentei foi uma vitória. Numa primeira estimativa, gastamos
pouco mais de R$ 2 milhões. Vai
ser a campanha mais barata da
história. Só gastamos com avião.
Para as circunstâncias -setores
do partido indo contra, pouco
tempo na TV etc.- foi um resultado excepcional.
Folha - O sr. está pavimentando
sua candidatura para presidente
em 2006?
Garotinho - Sim. Eu pretendo ser
candidato a presidente da República em 2006. E vou começar
num patamar bem diferente do
que comecei neste ano, quando só
tinha voto no Rio. Fui o primeiro
candidato do Rio que conseguiu
penetrar em São Paulo, onde tive
quase 3 milhões de votos.
Folha - Até lá, o sr. não é ministro,
não participa do governo de Rosinha e só vai dirigir a Fundação João
Mangabeira.
Garotinho - Vou estudar mais,
escrever mais, viajar pelo Brasil,
conhecer experiências administrativas de outros países, dar palestras.
Folha - O Brasil pode eleger um
presidente que não sabe o que é Cide (Contribuição sobre Intervenção
no Domínio Econômico) e que o sr.
apóia. O país corre risco de ter um
presidente que não sabe o que é essa taxação ou a pergunta que o sr.
fez no debate da Rede Globo não tinha importância?
Garotinho - Gostaria de esclarecer que não foi "pegadinha". A
pergunta era para falar sobre pedágio. Queria que o Lula me dissesse o que achava da Cide para
que, na minha réplica, eu afirmasse que, com R$ 10 bi que o governo tem em caixa, as estradas continuam esburacadas e o governo
enchendo as estradas de pedágio.
Quando ele não falou o que era
Cide, num primeiro momento, fiquei sem saber a continuidade
que iria dar. O Lula sabe o que é
Cide. Ele se esqueceu.
Folha - O sr. já definiu o Lula como "docinho de coco" dos banqueiros. O que ele precisaria fazer para
mudar, na sua opinião?
Garotinho - Gostaria que o Lula
compreendesse que a arte de decidir é muito difícil. Só quem já ocupou cargo público sabe disso. Toda assinatura de um presidente
agrada alguém e desagrada a alguém. Vou dar um conselho,
usando uma linguagem que conheço bem, que é a bíblica: "Não
pretenda servir a dois senhores".
Ou sirva ao povo brasileiro, ou
aos que exploram o povo brasileiro.
Folha - O sr. parece menos entusiasmado com a candidatura Lula
do que Miguel Arraes, presidente
de seu partido.
Garotinho - É correta sua impressão. Disse durante o tempo
inteiro da campanha que o Lula
para chegar ao poder fez concessões demais. Minha expectativa é
que ele está enganando alguém.
Essa a minha opinião. Ele está falando a verdade quando conversa
com a embaixadora americana ou
quando conversa com a CUT?
Folha - Sua opção agora seria pelo menos pior?
Garotinho- Sim, é isso. Nós não
vamos ser avalistas cegos de ninguém.
Folha - Se o Lula for derrotado no
segundo turno, a oposição pode ser
responsabilizada por não ter se
unido ainda no primeiro turno?
Garotinho - Se o Lula perder, ele
é o culpado. Fez tanta concessão
que já ouvi tanta gente: um é, outro parece que é.
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