São Paulo, terça-feira, 10 de dezembro de 2002

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JANIO DE FREITAS

O pepino inimaginável

Não há por que se esperar que a sinceridade seja sempre uma atitude consciente, o que se chamaria um ato de caráter. Como convém dizer hoje em dia, respeitemos as diferenças entre as pessoas. E, pois, entre as sinceridades, louvando também aquela que sai, involuntária e fugidia, pelo gargalo aberto em hora imprópria.
Não interessa, então, que gênero de sinceridade foi a de Fernando Henrique Cardoso, no correr dos vinhos e uísques a bordo do avião para Nova York, quando brindou alguns dos seus convidados com esta reflexão profunda:
- Lula ainda não se deu conta do tamanho do problema que terá de enfrentar.
Quando atenderam ao seu impulso mais natural, e foram depressa alimentar os repórteres da comitiva com a primeira intriguinha nova-iorquina, os deputados/convidados Geddel Vieira Lima, Moreira Franco e Arthur Virgílio explicaram que a reflexão de Fernando Henrique lhe saíra como crítica à reafirmação de Luiz Inácio Lula da Silva, em Buenos Aires, de que Armínio Fraga não ficará mesmo na presidência do Banco Central.
Mas que verdade admirável, e que oportunidade precisa, de Fernando Henrique. Não há dúvida: Lula da Silva "ainda não se deu conta do tamanho do problema que terá de enfrentar". A inflação que aí está outra vez acima dos 10%, e ameaçando fechar o ano lá pelos 13%, não é mais do que um sinalzinho do fracasso que o governo está deixando no lugar do que seria o seu único êxito. Só quando começarem a ser abertas as incontáveis caixas-pretas do atual governo é que Lula terá idéia "do tamanho do problema". Ou da mentira.
E que ocasião, a escolhida por Fernando Henrique, para deixar aberto o gargalo. Vai um departamento da ONU entregar um prêmio ao seu governo, e o que é antecipado pela confissão de que a herança do premiado será um problema de que nem o futuro presidente se dá conta. Nem ele nem ninguém, muito menos o PNUD, o premiador de um pepino com tamanho inimaginável.
Não, Fernando Henrique não fez comentário crítico. Ou, se quis fazer, parou na confissão.


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