São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 2006

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ELIO GASPARI

De Dr.Antunes@com.br para RogerAgnelli@gov.br


Os senhores jogaram dinheiro pela janela. Vossas doações não fazem sentido político nem empresarial

PREZADO DOUTOR Roger Agnelli,
Felicito-o pela maneira como vem presidindo a Companhia Vale do Rio Doce. Quando o senhor nasceu, em 1958, eu era um cinqüentão, dono de uma grande mineradora privada. Em 1996, quando vim para cá, o senhor ainda trabalhava no Bradesco. Fundei a Caemi em 1950 e a MBR em 1965. Hoje ambas estão sob seu comando. O senhor é tudo o que quis ser: executivo da grande mineradora, livre da peste estatista. Sou tudo o que o senhor gostaria de ser, um magnata que silencia auditório. Um garoto que começou como postalista e foi chamado de "doutor Antunes" por 11 presidentes.
Desde o início do ano, acompanho a extravagante distribuição de dinheiro da Vale para políticos. Inquieta-me a dimensão da vossa prodigalidade com o patrimônio dos acionistas. Pelos meu cálculos, os senhores distribuíram uns US$ 15 milhões. (Vamos fazer de conta que não sei das pesquisas presenteadas. As coisas que a gente ouve aqui não pode revelar aí.) Contei o caso da Vale ao John Kennedy e ele duvidou, pois nos Estados Unidos nenhuma empresa praticou tamanha filantropia política. O moço se lembrou do dinheiro que jogou no Brasil no início dos anos 60. Foram menos de US$ 10 milhões.
Nunca desembolsei quantias parecidas com as suas. Sempre fui um organizador. Quando o senhor Luiz Inácio apareceu com suas greves no ABC, vi nele uma reedição dos agitadores do peleguismo janguista. Mudei de idéia quando visitou uma das minhas empresas e derramou-se em elogios aos meus netos. (Queira Deus que tenha aprimorado sua acuidade analítica.)
Surpreendeu-me também a dispersão das doações. Os senhores jogaram dinheiro pela janela. Financiaram dois candidatos a presidente e contribuíram para a eleição de 48 deputados. A vossa lista não faz sentido ideológico, político e muito menos empresarial. A maneira tortuosa usada para repassar as doações leva-me a suspeitar que a decisão saiu da iniciativa de algum diretor bem relacionado em Brasília, capaz de resolver quaisquer problemas. Saiba, dr. Agnelli, que imensos são os problemas que essa espécie cria.
Permita-me um conselho: tire a Vale das páginas políticas dos jornais. Se possível, tire-a de todas as páginas. O Glycon de Paiva, glória de nossa geologia e um dos mais ativos articuladores da relação do empresariado com os políticos sempre repete: "Opinião pública significa dinheiro". Como o senhor viu, dinheiro demais. Respeitosamente, Augusto Trajano de Azevedo Antunes
P.S. - Sugiro-lhe que passe os olhos num livro que saiu aí, a meu respeito. Chama-se "Mineração no Brasil - Augusto Antunes, o homem que realizava". Foi patrocinado pela MBR e é informativo. Para meu modo de ser, um pouco derramado nos elogios.

O SUAVE MINIMALISMO DE MARINA SILVA

O comi$$ariado quer fritar Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, miúda militante de causas antipáticas às empreiteiras da filantropia política. Diante da frigideira, ela entrou para a galeria dos ministros que fazem história com uma frase saída da alma. Quando o repórter Gerson Camarotti perguntou-lhe se afrouxaria os seus critérios, respondeu:
"Eu perco o pescoço, mas não perco o juízo".
Ecoou Simões Filho, demitido por Getúlio Vargas, quando recusou-se a atacar o governo: "Perdi o ministério, mas não perdi a educação". Ou Eduardo Portela, em 1980: "Não sou ministro, estou ministro".
Marina Silva é uma das mulheres mais elegantes do Brasil. É uma instalação de minimalismo pessoal, administrativo e político. Suas falas são gentis, curtas e claras. Num governo velho, ainda é o que há de novo.

ALÍVIO
Lula já ouviu de um sábio que pode fazer o arranjo que bem entender, mas ficará em minoria no Senado. Essa é a notícia ruim. A boa é que para ter maioria precisa do PSDB. Como se sabe, os senadores tucanos são como os petistas: só fazem oposição a eles mesmos.

MERCADO TIRANO
Vai ao martelo hoje na casa de leilões Sotheby's de Nova York um manuscrito de Stálin. Está avaliado entre US$ 30 mil e US$ 50 mil. Trata-se de um bilhete de 1930, escrito a lápis, comutando a pena de morte do general Andrei Snesaryev, um matemático que falava 14 idiomas e, nos anos 20, escreveu um livro explicando que a URSS não devia se meter com o Afeganistão.
No mercado americano de autógrafos só existem dois manuscritos de Stálin. Comutando pena de morte, deve ser um dos poucos no mundo. (Snesaryev foi mandado ao Gulag por dez anos e lá morreu.)
Uma carta de Napoleão, do tempo em que se assinava "Buonapart", está avaliada em até US$ 25 mil.

INÉPCIA IMPERIAL
Se as empresas do embaixador americano Clifford Sobel tivessem o desempenho de seus consulados, ele nunca teria conseguido sair da lista dos empreendedores anônimos de Nova Jersey. Em agosto, quando chegou ao Brasil, o consulado no Rio de Janeiro impunha 49 dias de espera aos nativos que pediam visto de entrada nos Estados Unidos. A demora subiu para 72 dias. Em São Paulo, a fila passou de 73 para 86 dias. Em Brasília, de 32 para 49. Em Assunção a rotina continua civilizada: dois dias.

DILMÊS
O apagão aéreo trincou o encanto de gerentona da ministra Dilma Rousseff. Há gente que fala e faz. Até agora, a doutora não fez e, quando falou, maltratou o idioma. Ela promete a "eficientização" do governo.
Há um mês, a ministra divulgou uma nota informando que seriam tomadas "as medidas necessárias" para resolver o problema dos aeroportos "no menor espaço de tempo possível".
Sua contribuição eficientizante no setor aéreo foi o co-patrocínio da nomeação de Milton Zuanazzi para a Agência Nacional de Aviação Civil. O doutor revelou-se um completo ineficientista.
O único avião que pousa e decola nos horários previstos é o AeroLula.

NATASHA E O LULÊS
Madame Natasha tem horror a Nosso Guia. Quando está zangada, acusa-o de planejar o reconhecimento do nheengatu como língua oficial dos brasileiros. A senhora prefere ouvir Borat Sadiyev, jornalista da Gloriosa Nação do Cazaquistão.
Outro dia Natasha ouviu Lula dizer o seguinte:
"Como é que a gente vai educar a sociedade brasileira de que as coisas boas acontecem em maior número que as coisas ruins no país?"
Madame acredita que Lula deve baixar uma medida provisória isentando-se do cumprimento das regras de regência dos verbos. Não é a sociedade quem precisa de melhor educação. É ele.
(Quem quiser ouvir Borat, ele está disponível na internet, no Official Borat Homesite.)


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