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Papa torna hoje frei Galvão 1º santo do país
Contrariando o que anunciou em 2005, Bento 16 faz canonização fora de Roma; cerimônia será hoje no Campo de Marte
De família rica, frei Galvão abdicou do luxo e seguiu vida religiosa, marcada por cura de enfermos por
meio de pílulas de papel
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Bento 16 vai quebrar a própria regra. Hoje, às 9h30, ele fará de Antonio de Sant'Anna
Galvão, o frei Galvão, o primeiro santo brasileiro. Contrariando o que havia anunciado ao assumir o cargo no Vaticano, em
2005, a canonização acontece
fora de Roma. No altar montado no Campo de Marte, em
frente a milhares de fiéis, o papa irá ler o decreto de santificação após a apresentação de uma
biografia do religioso. Difícil será, em poucos minutos, condensar a vida do franciscano
que construiu o mosteiro da
Luz com as próprias mãos e
criou as pílulas de papéis, milagrosas segundo seus devotos.
A missa no Campo de Marte,
na zona norte de São Paulo, deve durar duas horas. Para o
evento, 1 milhão de pessoas são
esperadas. Antes de iniciar o
ato religioso, o papa Bento 16
fará um giro dentro do papamóvel entre os fiéis.
Nascido em uma família rica
e influente em Guaratinguetá,
no ano de 1739, o menino Antonio cresceu em uma casa de dez
cômodos servido por 28 escravos. Mas não se deslumbrou
com o luxo e aprendeu com os
pais o ato da caridade. Ainda
criança, via a mãe dar o que tinha em casa aos pobres.
Aos 13 anos, seu pai o mandou estudar no Seminário de
Belém, escondido em Cachoeira, a 109 km de Salvador. Da ordem dos jesuítas, era o melhor
colégio religioso da época. Foi
um aluno notável e decidiu seguir a vida religiosa. Teve de
mudar de ordem, porém -os
jesuítas estavam sendo perseguidos no país e seus colégios
acabaram fechados.
Antonio abraçou a ordem dos
franciscanos, da qual seu pai já
fazia parte. Em 1762, foi transferido, já ordenado, para o Convento de São Francisco, no centro de São Paulo, onde permaneceu por 60 anos.
Terras paulistas
Em terras paulistas, realizou
seus feitos: tornou-se poeta e
membro-fundador da Academia dos Felizes, primeira academia de letras de São Paulo;
passou 28 anos construindo o
mosteiro e a igreja da Luz; peregrinou a pé pelo Estado em
busca de donativos; pagou dívidas de trabalhadores sem que
soubessem; começou, sem querer, a propagar sua fama de santo mesmo em vida.
Alguns episódios contribuíram para isso. Histórias da época contam que o frade teria o
dom da bilocação (capacidade
de estar em mais de um lugar ao
mesmo tempo) e, por várias vezes, teria sido visto por devotos
em dois locais na mesma hora.
Para reforçar a crença de que
ele era, no mínimo, alguém especial, casos de cura começaram a ser relatados.
Tudo por conta das pequenas
pílulas que, quase sem querer,
frei Galvão acabou criando nos
últimos anos do século 18.
Procurado por um pai que
não sabia mais o que fazer para
aplacar as dores de um filho
que sofria de pedras nos rins,
ele decidiu escrever em um pequeno pedaço de papel um trecho em latim do Ofício de Nossa Senhora. Enrolou o papel e
deu ao homem para que ele fizesse o filho tomá-lo. Ordem
cumprida, o doente expeliu as
pedras e não sentiu mais dor.
O fato se repetiu pouco tempo depois com uma mulher que
corria risco na hora do parto.
Pílula tomada, mãe e filho ficaram salvos. As histórias correram de boca em boca e, em pouco tempo, fiéis iam a procura
das pílulas. Ao morrer, em dezembro de 1822, elas já eram
feitas pelas freiras do mosteiro.
Mesmo após sua morte, a devoção continuou aumentando
e, em 1938, começou o primeiro
processo para a canonização do
frade, que não seguiu adiante.
Em 1986, o processo foi reaberto e o primeiro milagre atribuído a frei Galvão por causa das
pílulas (a cura de uma menina)
recebeu reconhecimento do
Vaticano em 1998. João Paulo
2º fez do frade um beato.
Oito anos depois, um segundo milagre (a salvação de mãe e
filho em uma gravidez cientificamente improvável) foi confirmado por Bento 16, que
anunciou a canonização.
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