São Paulo, Domingo, 12 de Setembro de 1999
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"Não tenho a mesma liberdade. Se tivesse, também sairia" , diz governador a prefeito de São Bernardo
Covas autoriza tucano a aderir ao PPS

MÔNICA BERGAMO
da Reportagem Local

Durante 40 dias, o prefeito de São Bernardo do Campo, Maurício Soares, esperou por um telefonema do governador de São Paulo, Mário Covas, pedindo para que ele ficasse no PSDB. Soares estava decidido a deixar o partido porque, segundo diz, as críticas à política econômica do presidente Fernando Henrique Cardoso se tornaram "insuportáveis" no ABC. De acordo com ele, pesquisas mostram que FHC é rejeitado por 80% dos eleitores da região.
Por isso, Soares diz que só ficaria no partido tucano se ouvisse um apelo de Covas. Depois de pedir "um tempo" para pensar, Covas telefonou e os dois se encontraram no Palácio dos Bandeirantes. "Entendo o seu drama. Acho que você deve sair", disse o governador. E completou: "Eu não tenho a mesma liberdade que você. Se tivesse, também sairia".
No próximo dia 19, Soares se filia ao PPS, partido que sustenta a candidatura de Ciro Gomes à Presidência da República.
A conversa entre os dois foi presenciada pelo deputado federal João Herrmann, do PPS. "O que o Covas nos falou a respeito dos ministros de Fernando Henrique é impublicável", diz o deputado.
O prefeito de São Bernardo é o segundo político de expressão ligado a Covas que deixa o PSDB paulista para ingressar no PPS. Há duas semanas, o deputado federal Emerson Kapaz, ex-secretário da Ciência e Tecnologia de Covas, anunciou a mesma decisão.
O governador não gostou. Ele acha que Kapaz não estava sofrendo tanta pressão quanto Soares e só foi para o PPS porque quer uma legenda para disputar a Prefeitura de São Paulo.
Ainda assim, Covas disse compreender e, na ocasião, também falou com Kapaz em tom de desabafo: "Você sabe muito bem das dificuldades que estou enfrentando com o governo federal e com o partido. Só que não posso sair".
As conversas mostram que, na intimidade, Covas se revela bem mais irritado com o governo federal do que é possível concluir a partir das críticas que faz em público. "Ele anda uma fera", disse à Folha um dos parlamentares mais próximos do governador.
Segundo o parlamentar, Covas até hoje "não engoliu" o episódio da Ford, em que o governo federal deu incentivos para que a montadora se instalasse na Bahia, no que o governador considera um incentivo à guerra fiscal.
Outra reclamação é a demora em privatizar o Banespa. O banco está sob administração do governo federal. Quando for vendido, uma parte do dinheiro, correspondente a 51% das ações ordinárias, vai para o governo de São Paulo, antigo dono das ações.
A assessoria do governador diz que ele não quer rivalizar com o governo federal e que faz dentro de casa as mesmas críticas que faz fora. Em público, o governador já disse que a política econômica "tem de mudar o rumo".

"Laranja"
As adesões de tucanos ligados a Covas e a outros governadores do PSDB já levaram o presidente do PMDB, Jader Barbalho, a afirmar que Ciro Gomes é candidato "laranja" dos tucanos, uma alternativa eleitoral para o caso de o governo de FHC naufragar.
O deputado João Herrmann, líder do PPS na Câmara, nega. "Jader é esperto. Ele já está prevendo uma desarticulação maior do governo e sabe que os ratos vão pular do navio. Por isso, quer desacreditar o Ciro Gomes", diz.
O PPS vem registrando um número recorde de adesões, principalmente de candidatos às eleições municipais do ano 2000. O partido elegeu 32 prefeitos e hoje tem 189. De 506 vereadores, pulou para 2021; de 23 deputados estaduais, para 38; de 3 federais, para 12; e de 1 senador, para 3.
Há de tudo um pouco: do ex-prefeito de Manaus Eduardo Braga, ex-aliado de Amazonino Mendes, governador do Amazonas, que já foi do PDS, PMDB, PDC, PPB e PSL; a políticos do PSB ligados ao ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes.
Há ex-tucanos paulistas e há também ex-quercistas, como o deputado estadual Arnaldo Jardim. Ciro Gomes já chamou Quércia de "síntese do político ladrão".
"Não vamos fazer patrulhamento", diz Herrmann, para quem o partido não está inchando. "Só aceitamos políticos democráticos, éticos e honestos."



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