São Paulo, sexta-feira, 12 de novembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TODA MÍDIA

Até a morte

NELSON DE SÁ

A morte de Iasser Arafat permitiu aos porta-vozes da direita vitoriosa nos EUA (o canal Fox News, os jornais "The Washington Times" e "New York Post", o National Review Online, o blog Drudge Report) mostrar as suas garras.
Nenhum deu destaque maior a Arafat. Fox News e Drudge se apegaram à suposta nova fase da batalha de Fallujah, no Iraque. O "Washington Times" ficou com a indicação de Alberto Gonzales para ministro da justiça.
E não faltaram ataques, com virulência, no registro paralelo ao líder palestino. Um dos textos no NRO saudava a morte do "terrorista favorito da ONU". O "WT" foi além, com "rumores" escandalosos tirados da internet sobre a causa da morte.
A Fox News, quando abordou Arafat, foi sempre voltada ao que pode ocorrer de bom, agora. E trouxe coisas como:
- Arafat frustra até na morte. Por algum tempo, parecia que ele se recusava a morrer.
 
Nem a mídia americana mais tradicional, tachada de "liberal", escapou de certo excesso.
O "New York Times" destacou "bilhões escondidos" pelo líder em bancos pelo mundo. E o "Boston Globe" deu um artigo intitulado "Arafat, o monstro".
Para um tratamento menos agressivo, era preciso recorrer a sites e publicações da Europa, como "Financial Times", para o qual o palestino usou "tanto as armas quanto o ramo de oliveira pela causa de seu povo", ou o "Le Monde" (abaixo).
No Brasil, TV, rádio e internet seguiram mais a linha européia -com o Jornal Nacional, por exemplo, descrevendo que, "no campo de batalha ou na mesa de negociações, Iasser Arafat foi o líder dos palestinos pela criação de um estado independente".
 
E foi a Globo, como é regra, que trouxe a versão do governo brasileiro, já de manhã, ao vivo com o chanceler Celso Amorim. Arafat foi chamado de "grande líder", mas não o bastante para mudar a agenda de Lula:
- O presidente, se não tivesse visita de Estado, provavelmente iria ele próprio às exéquias.
Mas não, foi José Dirceu.

lemonde.fr/Reprodução
ESVANECER
Reverenciado na França, do "Libération" ao "Le Figaro", Arafat ganhou uma ilustração algo nostálgica, de Plantu, ontem na capa do "Le Monde"

O próximo
Enquanto especulava sobre o que vem aí, "depois de Arafat", como toda a cobertura dos EUA, a CNN saiu-se ontem com uma comparação entre o palestino e o cubano Fidel Castro.
Questionada sobre o que vai acontecer quando Fidel morrer, a correspondente em Havana foi direta e sincera:
- Ninguém sabe.

Conspiração
Os blogs "liberais" dos EUA, após o tombo dos números de boca-de-urna, vêm espalhando agora rumores sobre fraude com as urnas eletrônicas.
O "Washington Post", ontem, e a revista on-line Salon, dias atrás, já trataram de derrubar ponto a ponto a "teoria".

Ficção
O colunista Frank Rich, do "New York Times", referência dos "liberais" americanos, diz em seu texto desta semana que "uma nova expressão cunhada por um pesquisador anônimo" suplantou todos os outros temas do debate político, nos EUA: "valores morais".
Em suma, fixou-se o "spin" de que George W. Bush venceu a eleição com uma nova versão do mote hoje famoso -agora "é a cultura, estúpido", referência às "guerras culturais" que opõem conservador e "liberais". Mas ele enumera dados para afirmar que não é bem assim:
- Só tem um probleminha. Como tantas narrativas feitas hoje em dia na nossa mídia 24/7 [24 horas por dia, sete dias por semana], é uma ficção.

AO RITMO DA CHINA

mercopress.com/Reprodução
Foi chegar o presidente chinês, ontem, que o Jornal Nacional destacou o fim de uma novela de meses em Brasília:
- Governo e oposição fecham um acordo sobre o projeto das PPPs, as Parcerias Público-Privadas.
Como esperado, a visita de Hu Jintao recebe cobertura extensiva no exterior . O "Financial Times" dizia ontem em seu título que a "América Latina dança ao ritmo da China" e que "o chinês é hoje o mercado de exportação do Brasil que mais cresce".
A agência Dow Jones, ligada ao "Wall Street Journal", dizia em título que "As reuniões entre o Brasil e a China anunciam relações mais próximas entre os gigantes" e que os funcionários chineses "querem aumentar seu acesso a commodities importantes e já asseguraram os investimentos em projetos de larga escala".
Aqui e ali, nas diversas reportagens, menções às PPPs que não saem ou não saíam, até o acordo.
O jornal estatal chinês "Diário do Povo", de sua parte, deu longo editorial -ou coisa parecida- sob o título "Relações sino-brasileiras entram em uma nova era", destacando a cooperação em comércio, mas citando da tecnologia espacial à política externa.


Texto Anterior: Banestado: Suassuna liga caso a pressão do PMDB
Próximo Texto: Campo minado: MST invade mais duas áreas em Pernambuco
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.