São Paulo, sexta-feira, 13 de janeiro de 2006

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QUESTÃO AGRÁRIA

Governo quer comprar três propriedades por R$ 6,7 mi; técnicos do próprio instituto suspeitam de sobrepreço

Incra pode pagar mais por fazendas em PE

JOSIAS DE SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Incra está prestes a fechar um negócio danoso para os cofres públicos em Pernambuco. Num instante em que o agronegócio está em crise, o governo quer adquirir três fazendas no sertão pernambucano por R$ 6,687 milhões. Desse total, R$ 5,551 milhões (83% do total) serão pagos em dinheiro vivo. O resto será liquidado em TDAs (Títulos da Dívida Agrária), negociáveis em Bolsa.
Ouvidos pela reportagem, técnicos do próprio Incra estimam que a avaliação das fazendas está superfaturada. O sobrepreço seria de cerca de 40%. As terras foram oferecidas ao governo pelo deputado Ricardo Fiúza (PFL-PE), morto em dezembro. A aquisição será feita com base no decreto número 433. Prevê a compra direta de terras, sem desapropriação.
Das três fazendas que o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) tenciona comprar, a mais valiosa chama-se Santa Rita/Cacimba de Baixo/Vitória. Mede 2.320 hectares. Foi avaliada em R$ 3,179 milhões. Os avaliadores do governo sustentam que as benfeitorias assentadas no imóvel, que pela lei devem ser pagas em dinheiro vivo, valem R$ 2,803 milhões. Ou 88,15% do total a ser desembolsado.
Pelo segundo imóvel, Fazenda São Boa Ventura (3.603 hectares), o Incra irá oferecer R$ 2,548 milhões. De novo, as benfeitorias compõem a maior parte do preço: R$ 1,994 milhão (78,27% do total). Chama-se Fazenda Porteiras (1.257 hectares) o terceiro imóvel. Foi avaliado em R$ 958,515 mil -R$ 753,761 mil (78,63%) em benfeitorias.
As três fazendas oferecidas por Fiúza ao Incra, localizadas nos municípios de Custódia e Betânia, pertencem a duas empresas: Agropecuária São Boa Ventura e Agropecuária Jaçanã, das quais o ex-deputado era acionista. De acordo com os registros do Incra, as duas firmas funcionam no mesmo endereço: o número 244 da Rua João Eugênio de Lima, no bairro de Boa Viagem, em Recife.
O decreto 433 foi editado pelo então presidente Fernando Collor de Mello numa época em que a desapropriação de terras, prevista na Constituição de 1988, ainda estava pendente de regulamentação. Hoje, as desapropriações são reguladas pela lei 8.629, de 1993.
Curiosamente, porém, o Incra planeja fazer as aquisições por compra direta, valendo-se do decreto. O que faz presumir que esteja tratando as terras como produtivas, tonificando as dúvidas sobre a conveniência do negócio.
A Folha tentou ouvir durante os dois últimos dias a superintendente do Incra em Pernambuco, Maria de Oliveira, mas ela não telefonou de volta. Ontem, em nota, o Incra informou que os processos de aquisição ainda estão "em fase preliminar de avaliação".


Josias de Souza escreve o blog "Josias de Souza - Nos Bastidores do Poder": www.folha.com.br/blogs/josiasdesouza

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