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São Paulo, quinta-feira, 13 de março de 2003

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AGENDA PETISTA

Governo enfatiza benefício de redução de impostos sobre pobres para atenuar resistência a mudanças na Previdência

PT usa reforma tributária como "âncora social"

Bruno Stuckert/Folha Imagem
O ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) participa de encontro com prefeitos em hotel de Brasília


GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo Luiz Inácio Lula da Silva achou na reforma tributária o discurso que precisava para reafirmar os compromissos com a justiça social e a geração de empregos -caros à esquerda e base da campanha eleitoral- e refutar as acusações de continuísmo da era Fernando Henrique Cardoso.
Pela estratégia delineada na cúpula petista, a reforma tributária, embalada em promessas de redução da carga de impostos sobre os mais pobres e incentivo à contratação de mão-de-obra com carteira assinada, servirá para atenuar as resistências a projetos indigestos para a base aliada, caso das mudanças na Previdência e da autonomia do Banco Central.
A retórica pró-reforma começou a ser desenvolvida pelo ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) nesta semana, em audiências públicas com os senadores da Comissão de Assuntos Econômicos, anteontem, e com os prefeitos da Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios, ontem.
Nas duas ocasiões, Palocci não se limitou a falar das vantagens que uma alteração do sistema tributário pode trazer à produção e às exportações. Munido de estudos, cifras e gráficos, o ministro se empenhou em destacar o lado social das mudanças propostas.
Exemplo: os 10% mais pobres, segundo os dados da Fazenda, comprometem 25% de sua renda com o pagamento de impostos indiretos (aqueles embutidos nos preços dos produtos); para os mais ricos, a carga é de 12,5%.
Por isso, propõe-se a redução do ICMS incidente sobre os produtos da cesta básica e outros produtos de consumo popular. A idéia não é nova nem de fácil implementação, mas é bem mais sedutora do que defender aumentos de juros ou taxação de servidores públicos inativos. "Para que a política tributária seja progressiva [quem ganha mais paga mais], é preciso mexer não apenas no Imposto de Renda. É por isso que a proposta de nova legislação do ICMS pressupõe o compromisso de uma tributação reduzida sobre bens de consumo de massa", disse Palocci aos prefeitos.
Estão em pauta ainda medidas de menor impacto econômico, mas de efeito simbólico, como o aumento da tributação sobre a herança e, segundo a Folha apurou, a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas.
É verdade que Palocci e outras autoridades também repetem o argumento da justiça social para defender a redução de direitos -ou privilégios- previdenciários, mas, como já demonstrou a experiência do governo FHC, essa tese não basta para desfazer o mal-estar político de prejudicar aposentadorias e pensões.
O governo já detectou que os congressistas do PT e dos demais partidos aliados sentem-se muito mais à vontade defendendo a reforma tributária que justificando mudanças na Previdência. A primeira não tem, ao menos até o momento, perdedores definidos; a segunda tem: os servidores, uma das principais bases petistas.
Tudo isso ajuda a explicar por que a reforma tributária voltou ao topo da agenda parlamentar, depois de ter sido deixada em segundo plano nas primeiras semanas do mandato de Lula -o discurso de posse de Palocci, por exemplo, discorreu longamente sobre a reforma da Previdência e nem sequer citou a tributária.
Ainda é cedo, porém, para avaliar o quanto da retórica se converterá em medidas concretas. O projeto de reforma a ser enviado ao Congresso neste semestre conterá só regras gerais. "Estamos propondo uma reforma enxuta", disse Palocci. "Colocar na Constituição detalhes sobre tributos só complicaria a vida da sociedade."
A primeira etapa da reforma terá um sentido mais político e simbólico, marcando o compromisso de Lula com as mudanças às quais o governo anterior se opôs por temer a perda de receita.
A segunda etapa será a reforma para valer, quando se definirão setores beneficiados e prejudicados, e haverá pressões políticas de todos os lados.


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