São Paulo, sexta-feira, 13 de agosto de 2004

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MALHA FINA

Ministro da Justiça defende autorização judicial para a quebra e afirma que decreto proposto deve ser discutido

Quebrar sigilo é tema "tormentoso", diz Bastos

IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Diante do objetivo do governo federal de tentar ampliar a quebra do sigilo fiscal de pessoas físicas e jurídicas por meio de um decreto, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, defendeu ontem a necessidade de autorização judicial para a quebra de sigilo fiscal. Para ele, o assunto é "tormentoso" e "delicado".
"É claro que o controle judicial da quebra de sigilo é indispensável e não pode ser derrogado [anulado] ou transgredido", afirmou o ministro da Justiça.
"Essa é uma questão tormentosa, não está decidido ainda, são propostas que precisam ser discutidas. Uma coisa é fato: a lavagem de dinheiro no Brasil assume proporções gigantescas."
Anteontem, o GGI-LD (Gabinete de Gestão Integrada de Combate à Lavagem de Dinheiro), composto por 23 órgãos federais, entre eles o Ministério da Justiça, apresentou o anteprojeto de um decreto que flexibiliza o acesso a dados fiscais. O decreto serviria para regulamentar uma lei de 2001 que já havia tornado mais fácil a troca de informações entre o Banco Central e a Receita.
O objetivo do anteprojeto é ampliar essa troca de dados para outros órgãos federais, desde que haja um procedimento de investigação instaurado e que quem receba a informação assine um termo de responsabilidade sobre o sigilo do conteúdo.
O posicionamento do governo é público desde dezembro de 2003, quando os 23 órgãos federais firmaram com o Ministério Público e Judiciário a Encla 2004 (Estratégia Nacional de Combate à Lavagem de Dinheiro), com metas e responsabilidades compartilhadas. A íntegra do documento está disponível em www.mj.gov.br.

Movimentação bancária
O ministro deu seu aval a outro conceito do anteprojeto, de eliminar uma segunda quebra de sigilo bancário quando algum outro órgão já tiver recebido os dados. Se a Polícia Federal obtiver a autorização judicial sobre as informações de determinada empresa, por exemplo, o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) não precisaria fazer novo pedido judicial. Receberia o material da PF e assinaria o termo de responsabilidade.
"É preciso haver sempre uma autoridade judicial para a quebra de sigilo, depois disso, o que se está cogitando é a possibilidade de circular com menos formalidade. Mas, de qualquer maneira, é um tema tormentoso e que vai ser objeto de debate", disse.
O texto do anteprojeto também abre brecha para que a PF e outros órgãos federais tenham acesso a informações até agora restritas ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), do Ministério da Fazenda. Quando é detectada operação fora do perfil do cliente -depósito de R$ 1 milhão em conta assalariada que recebe R$ 50 mensais, por exemplo-, o Coaf deve investigar o caso.
Se o anteprojeto virar decreto presidencial, a PF poderá indagar diretamente ao Coaf se determinada empresa investigada teve operações irregulares detectadas. De acordo com a CGU (Controladoria Geral da União), isso já vem acontecendo de modo informal, e o objetivo é tornar o procedimento institucionalizado.
O projeto ainda será analisado pelo GGI-LD antes de ser submetido ao crivo do Planalto. Antes de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assiná-lo, portanto, pode sofrer modificações.
De acordo com o ministro da Justiça, é preciso discutir o tema antes de um formato final de proposta. "Esse não é um tema que possa ser decidido facilmente, precisa ser discutido, debatido, porque aí entram valores muito altos, tanto quanto a liberdade de imprensa. Entram valores como a privacidade, o sigilo fiscal, o direito de defesa", disse ontem.


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