São Paulo, domingo, 13 de outubro de 2002

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JANIO DE FREITAS

Os donos da especulação

A imediata queda da especulação com o dólar, na sexta-feira, é insuficiente para atestar o grau de eficácia do pacote baixado pelo governo contra a disparada especulativa movida pelos bancos, para fazer lucro fácil e grande lucro com crescentes desvalorizações do real. Mas o pacote já prestou alguns serviços.
Antes de haver essa reação, foi preciso que a chegada do dólar aos R$ 4 tornasse a especulação desmoralizadora para o governo, e ameaçasse um final patético para a Presidência de Fernando Henrique Cardoso, com o real arrasado, a volta da inflação e os preços em desatino. Por que isso?
O pacote, como foi prontamente notado, apareceu apenas 24 depois que os jornais publicavam Armínio Fraga sustentando que os meios do Banco Central, por ele presidido, para agir contra a especulação são limitados, no sentido de insuficientes. Mostra o pacote que havia, sim, o que fazer para refrear os bancos, enquanto o BC de Armínio Fraga só fazia vender as reservas em dólar, a pretexto de deter a alta com maior maior oferta da moeda.
Em fevereiro, quando José Serra deixa o ministério e a disputa eleitoral ganha impulso, o dólar estava na casa dos R$ 2,30. Ao chegar maio, ainda não entrara na casa dos R$ 2,40. Começa então uma subida lenta, que fica mais intensa a partir de junho. Era mais do que hora de reprimir a especulação. E nem seria necessário pacote algum, como à época foi dito por vários dos que não estavam, na política e na imprensa, aceitando a alta do dólar como arma contra Lula da Silva e Ciro Gomes.
Os bancos são os grandes movimentadores do dólar, como detentores de fundos imensos. O BC sempre teve à sua disposição um instrumento simples e eficaz para refrear neles a voracidade especulativa: é investigar quem está agindo para depreciar a moeda nacional e com isso lucrar -o que comporta um senhor processo. Tal investigação inscreve-se mesmo entre as funções do Banco Central.
Se Pedro Malan e Armínio Fraga atribuíam alta do dólar à posição de Lula e, por certo tempo, também à de Ciro, com isso dizendo, também, que era uma depreciação fabricada da moeda brasileira. O dever de ambos, em tal situação, é óbvio. O presidente do Banco Central ficou alimentando a especulação com dólares a bom preço. O ministro da Fazenda não moveu um dedo. Moveu apenas a boca para difundir a idéia, entre ridícula e atrabiliária, de que "os candidatos da oposição" eram os responsáveis pela alta do dólar por não indicarem seus escolhidos para o BC e não assumirem um compromisso de continuidade. Compromisso com os que agiam e agem contra o país e continuidade quando a ansiedade manifesta da grande maioria nacional é pela mudança do rumo, ou falta de rumo, dado ao país pelo atual governo.
É reconhecimento corrente que os bancos jamais foram tão beneficiados quanto nos últimos oito anos, o que se comprova por terem, balanço após balanço, os maiores lucros proporcionais no mundo. O sistema beneficente chamado Proer, de socorro a banqueiros estourados como pessoa jurídica e endinheirados como pessoa física, complementa as evidências de que este governo jamais teria a atitude de investigar a ação de bancos contra a moeda nacional. Mas os banqueiros não deviam ir tão longe, esses mal agradecidos, e expor o governo à desmoralização, não bastasse já a condenação expressa nas urnas.


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