São Paulo, sexta, 14 de fevereiro de 1997.

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DESAPARECIDOS POLÍTICOS
Famílias reclamam de `grosseria'
Governo quer de volta parte de indenizações

DANIELA FALCÃO
PAULO SILVA PINTO
da Sucursal de Brasília

Três famílias de desaparecidos políticos que receberam indenizações do governo federal no ano passado foram convocadas a devolver parte do dinheiro. O motivo teria sido um ``erro de cálculo'' do Ministério da Justiça.
Todas as três reclamam da maneira ``grosseira e chantagista'' com que o ministério cobrou o dinheiro que teria pago a mais.
Das três famílias, duas já haviam recebido a indenização quando chegaram telegramas do ministério pedindo a devolução de R$ 12 mil. Segundo os telegramas, caso não devolvessem o dinheiro, as famílias seriam processadas.
A terceira família indenizada, da desaparecida Isis Dias de Oliveira, só ficou sabendo que houve erro no cálculo quando foi retirar o dinheiro da indenização no banco.
``Não me avisaram nada. Fui ao banco esperando retirar R$ 124 mil e só achei R$ 111 mil. Primeiro, pensei que o banco estava enganado, mas, quando pedi explicações ao ministério, me informaram que o valor da minha indenização que havia sido publicado no `Diário Oficial' é que estava errado'', afirmou Felícia Oliveira, mãe de Isis.
João Carlos Grabois, filho do desaparecido político André Grabois, também havia recebido R$ 124 mil de indenização e teve de devolver R$ 12 mil.
Segundo uma amiga da família, João Carlos só devolveu o dinheiro porque ``já havia sofrido o suficiente'' e não queria brigar por dinheiro por se tratar da vida de seu pai. ``Mas o ministério fez tudo de uma forma muito grosseira. Nos enviaram telegramas grosseiros e com ameaças.''
A família do líder estudantil Honestino Guimarães também reclama da maneira como o governo cobrou o dinheiro e diz que só devolverá os R$ 12 mil se for explicado qual foi o erro.
``Não bastassem todos os anos em que tivemos de lutar para o governo assumir a responsabilidade pelos mortos e desaparecidos, agora temos de conviver com esse tipo de incidente'', diz Isaura Guimarães, viúva de Honestino.
Ela reclama do teor dos telegramas e do fato de nunca ter recebido uma explicação oficial.
Isaura recebeu R$ 124 mil em setembro, e, duas semanas depois, chegou um telegrama sem assinatura do ministério cobrando os R$ 12 mil. ``Como não havia assinatura nem explicação, resolvi esperar por uma posição mais digna.''
Em dezembro passado, Isaura voltou a receber um telegrama do ministério, cobrando o dinheiro e ameaçando com pagamento de juros se os R$ 12 mil não fossem devolvidos em 72 horas.
``A indenização deveria ter saído no início de 96, mas só recebemos em setembro, sem qualquer correção. Agora eles alegam ter errado e exigem que paguemos juros.''
Tanto Grabois quanto Isaura reclamam do teor do telegrama que estaria condicionando a devolução do dinheiro ao pagamento da indenização para outras famílias beneficiadas pela lei 9.140.
``Foi chantagem o que fizeram. E sem o menor fundamento, porque, mesmo que somassem o valor supostamente pago em excesso das nossas três indenizações, ainda assim não daria para pagar nem sequer uma família'', diz Isaura.

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright 1996 Empresa Folha da Manhã