São Paulo, segunda-feira, 14 de fevereiro de 2005

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BRASIL PROFUNDO

Entidades denunciam violência na região; UDR diz que Estado não apurou as ameaças contra Dorothy

MST e ruralista apontam omissão do governo

DA REPORTAGEM LOCAL

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Cada um à sua maneira, o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e a UDR (União Democrática Ruralista), organizações de interesses opostos, responsabilizaram ontem o governo pela violência no campo e pelo assassinato de sua mais nova vítima, a freira Dorothy Stang.
Gilmar Mauro, da coordenação do MST, diz que a estrutura agrária aliada a "um histórico de impunidade" alimenta o conflito no campo. Segundo ele, o problema não é localizado, mas nacional, produto da omissão do poder público, e só será resolvido com a reforma agrária. "Estamos entristecidos e revoltados porque essa situação [de concentração de terra] perdura. Esperamos do governo uma punição exemplar. Mas não é isso que tem acontecido no país", afirmou o sem-terra.
A Secretaria Nacional da CPT (Comissão Pastoral da Terra) informou que apresentará dados segundo os quais a submissão do governo aos interesses do agronegócio estimula a violência no campo. Dom Tomás Balduíno diz que "a melhor forma de manifestação da CPT é dar repercussão à denúncia de irmã Dorothy".
Segundo ele, o governo estimula o agronegócio como fonte de divisas, mas, "onde floresce, o agronegócio aumenta a violência". Ainda segundo ele, irmã Dorothy denunciava "um poder paralelo".
O presidente da UDR, Luiz Antônio Nabhan Garcia, chama o governo de parcial e unilateral, "escancaradamente aliado de um lado". "Por que o governo não apura a denúncia que ela [Dorothy] forneceu arma para o assassinato de um segurança?"
Repetindo que nada justifica assassinato, Nabhan alega, porém, que o governo é incompetente por não concluir a reforma agrária dentro da lei.
O presidente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), Rolf Hackbart, visitou ontem Anapu e disse que o clima no assentamento onde a freira foi morta é tenso. Ele anunciou o reforço da unidade do Incra em Altamira.
Ao lamentar a morte de irmã Dorothy, organizações da sociedade civil sugeriram ao governo intervenção federal no sul e no sudeste do Pará. Defensor da intervenção, o coordenador-executivo da ONG Terra de Direitos, Darci Frigo, diz que o governo federal cede à pressão dos madeireiros.
"Não dá mais para o ministro Nilmário Miranda ir a Belém fazer uma audiência [para organizar um sistema de proteção aos defensores de direitos humanos] enquanto o presidente Lula cede à pressão dos madeireiros."
O advogado afirma que o recente acordo do governo com os madeireiros locais, que abriu a possibilidade de autorizar 17 planos de manejo "ilegais" no Pará, "provou que, com pressão, é possível conseguir o que se quer".
A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) divulgou nota do arcebispo metropolitano de Belém, dom Orani João Tempesta, temendo que "o crime fique como apenas mais um em nossa história". A nota diz ainda que "o ocorrido neste sábado em Anapu desafia as autoridades diante da impunidade".
A Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) exigiu, em nota, que o presidente Lula tome ações "duras" contra os assassinos e mandantes.
A Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB disse que "é chegado o momento de o Estado brasileiro, que já viola os direitos humanos, passar a dar garantias e adotar providências".
Também em nota, a Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) pediu "urgência" na instalação da Vara Federal de Altamira, prevista desde 2003.
O Greenpeace enviou carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao governador Simão Jatene (PSDB-PA), na qual diz que o episódio é "escandaloso. Mais um triste exemplo da impunidade e da ausência do governo em regiões remotas da Amazônia".

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