São Paulo, quarta-feira, 14 de março de 2001

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ELIO GASPARI

A trava fez de uma gripe um derrame

FFHH precisa destravar a sucessão presidencial. A menos que pretenda proclamar-se imperador e defensor perpétuo do Brasil, dentro de 21 meses ele deverá entregar seus palácios a um novo inquilino. Sua idéia de postergação das candidaturas governistas é inviável e absurda. Deve-se a ela, ainda que em parte, a transformação de uma gripe (a eleição das Mesas do Congresso) num derrame cerebral (a crise política em que se entrou). FFHH diz que o aparecimento das candidaturas paralisa a máquina administrativa. É um argumento débil e até comovente. Se fosse verdadeiro, a reeleição seria um anátema. A verdade está no contrário. Hoje é a trava que atrapalha a máquina.
Aos exemplos:
1) O ministro Pedro Malan mostrou-se favorável à devolução da tunga do FGTS para os trabalhadores que têm a receber até R$ 1.000. São 92% dos tungados e o dinheiro que lhes é devido corresponde a apenas 17% do que foi tomado. Nada mais razoável e decente. Pois basta que ele diga isso para que surja a interpretação: Malan é candidato. Se o preço da candidatura de Malan é a dissociação do Ministério da Fazenda do ataque ao bolso do andar de baixo, que seja feito Pedro 3º. Com um olho nos dois quilos de ouro e 639 brilhantes de seu antecessor, talvez ele pare de avançar sobre a renda do andar de baixo ao manter congeladas as faixas do Imposto de Renda.
2) O ministro José Serra lança uma campanha de prevenção da diabetes, que deverá resultar na descoberta de algo como dois milhões de brasileiros que sofrem da doença, e FFHH se vê obrigado a aturar as queixas de um ministro inconformado com o espaço que Serra ocupa na rede oficial de propaganda. Há mais tucanos torcendo por uma epidemia de febre amarela urbana do que toda a patuléia enraivecida durante a revolta contra a vacina obrigatória no início do século passado.
3) O governador Tasso Jereissati defende a manutenção da aliança com o PFL de ACM, descuida-se e, quando olha em volta, tomaram-lhe todos os pontos de apoio na burocracia do Congresso. Só não lhe tomaram o governo do Ceará porque o recebeu do eleitorado. Ora é considerado um cavalo-de-tróia em cuja barriga vem o senador baiano, ora é visto como um simples cavalo-de-macumba, encarnando Ciro Gomes. Nenhuma dessas acusações lhe é feita por oposicionistas. Tudo coisa de tucano.
Faltam ao PSDB a elegância política e o sentido de história que permitiram ao velho MDB ajudar a tirar o país da ditadura. Poucos políticos detestaram-se tanto quanto Ulysses Guimarães e Tancredo Neves. Por compostura, mas sobretudo por um sentido de grandeza, burilaram suas personalidades no resguardo da inveja, do ciúme e do ressentimento. Eram tipos históricos, como Rio Branco, um barão que se tornou monumento da República.
A tucanada parece-se mais com um grupo de líderes estudantis. Nela, FFHH diverte-se com a dissimulação de d. Pedro 2º e a astúcia de Getúlio Vargas. Difere dos dois num aspecto essencial: é mais arguto na percepção e na divulgação maledicente dos defeitos de seus colaboradores do que na exaltação de suas virtudes. É palmeira em campo de golfe.
Enquanto o Planalto segurar a trava da sucessão os candidatos tucanos terão tudo a perder e nada a ganhar. Estarão entregues à sanha de seus rivais e não poderão mostrar suas qualificações. Bastará um sorriso para carimbar uma candidatura.
Soltando a trava, FFHH perderá uma parte do poder que tem. Paciência. Em troca, liberará a energia de seu governo numa disputa lisa. Os candidatos estão no pleno uso de seus direitos políticos. É preferível haver um ministro ou governador mostrando serviço para ganhar votos do que ter o mesmo ministro ou governador trabalhando pela sua candidatura e fingindo que não quer ser presidente. Quando por nada, porque essa segunda postura é apenas mentirosa.


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