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Cooperativa usa "títulos podres" para pagar dívida
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A Coagri (Cooperativa de Trabalhadores Rurais e Reforma
Agrária do Centro-Oeste do Paraná), gerida pelo MST, é protagonista de um negócio que deixaria
de cabelo em pé qualquer parlamentar do PT. A seguir, os detalhes da operação, passo a passo.
1) Em nome dos assentados, a
Coagri comprou fertilizantes da
empresa Heringer Ltda, de Paulínea (SP). Foram várias compras,
totalizando R$ 1.043.193,00;
2) A cooperativa recebeu os insumos. Mas não pagou a dívida;
3) Após muito negociar, convencida de que não receberia pelas vias normais, a Heringer recorreu à Justiça;
4) Verificando que a cooperativa dispunha de fundos no Banco
do Brasil, o juiz Pedro Henrique
Betio, de Laranjeiras do Sul (PR),
determinou, em decisão liminar,
no dia 7 de dezembro de 99, o bloqueio do dinheiro;
5) Para surpresa geral, a Coagri
decidiu discutir a dívida não em
Laranjeiras do Sul, onde funciona
uma de suas sedes, mas no longínquo município de Rondon do
Pará (PA);
6) Em ação nebulosa, a cooperativa reconheceu a dívida com a
Heringer. Mas pediu ao juiz Paulo
Cesar Pedreira Amorim que autorizasse o pagamento em papéis
podres da Petrobras, de 1956;
7) O juiz de Rondon do Pará
concedeu a liminar para a Coagri,
sustando o protesto dos títulos.
Na última sexta-feira, a reportagem da Folha telefonou para o
Tribunal de Justiça do Pará. Em
contato com a corregedora do tribunal, desembargadora Maria de
Nazareth Brabo de Souza, soube
que o juiz Paulo César, o mesmo
que atendeu ao pedido da Coagri,
encontra-se afastado de suas funções e sob investigação.
O motivo: suspeita de irregularidade na concessão de nada menos que 399 liminares como a que
beneficiou a Coagri. Além de Paulo César, há outros dois juízes sob
investigação. A desembargadora
Maria de Nazareth refere-se ao
grupo como "máfia". O dinheiro
continua bloqueado no banco.
Questionado sobre a operação,
Jaime Calegari, diretor da Coagri
e dirigente do MST no Paraná, foi
enigmático. Recusou-se a dizer
por que a cooperativa recorreu à
Justiça de Rondon do Pará: "É estratégia". Não disse também onde
foram obtidos os papéis da Petrobras: "É segredo" (leia entrevista
com Calegari na página seguinte).
A Coagri está no centro de outra
operação nebulosa. Na safra 97/
98, a cooperativa administrou R$
4 milhões em verbas destinadas a
agricultores assentados da reforma agrária.
O empréstimo contava com
subsídio oficial de 50%. Ou seja,
os assentados só precisariam pagar a metade do que retirassem na
boca do caixa.
A cooperativa reteve a parcela
referente ao subsídio oficial (50%
do dinheiro), a pretexto de honrar
o empréstimo no banco. Na data
do vencimento, 15 de agosto de
99, não pagou. O Banco do Brasil,
agindo em nome do governo, rolou o débito por mais um ano.
O gerente do Banco do Brasil
em Laranjeiras do Sul, Rui Sezar
Rocha, está ciente da situação
precária do balanço da Coagri. Ele
sente o problema em seu cotidiano. Não raro, a cooperativa emite
cheques sem cobertura em sua
agência. Ainda assim, não interrompe o fluxo de dinheiro para a
organização do MST.
Rui Sezar argumenta que não
cabe ao banco negar dinheiro à
Coagri. O problema, diz ele, é do
governo. Os recursos são "aprovados pelo Incra".
O governo contra-argumenta.
O Banco do Brasil recebe 3% sobre todo o dinheiro liberado para
a reforma agrária justamente para
fiscalizar a sua aplicação.
A Folha perguntou a Rui Sezar
se ele concederia um empréstimo
do Banco do Brasil para a Coagri.
"Não, dinheiro do banco eu não
ponho lá".
Enquanto isso, a cooperativa segue sendo irrigada com verbas do
erário. Na semana passada, recebeu novos R$ 250 mil para iniciar
um assentamento de 578 famílias.
Espera receber mais R$ 5 milhões
para despesas de custeio e investimento no mesmo assentamento.
O governo tomará a decisão nos
próximos dias.
(JOSIAS DE SOUZA)
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