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ENTREVISTA
Presidente da Câmara dos Deputados afirma que haverá mudanças nas reformas propostas pelo governo
João Paulo diz que não é aliado nem hostil
RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Ao contrário do que deseja o governo, as reformas previdenciária
e tributária sairão mudadas do
Congresso. Quem assegura é o
presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP),
que afirma não ser "aliado nem
hostil" ao governo.
Para ele, seriam inevitáveis mudanças nas regras de transição do
atual para o futuro modelo da
Previdência e na média de cálculo
do benefício a ser recebido na
aposentadoria.
João Paulo, 45, esteve no olho
do furacão nas últimas duas semanas. Foi acusado de jogar contra o governo ao decidir instalar a
CPI do Banestado e a comissão
especial da reforma da Previdência. Mas diz que seu trabalho não
é nem agradar nem atrapalhar o
governo.
Ontem à tarde, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva mandou
dizer a João Paulo que concluíra
ser acertada sua decisão de mandar instalar logo a comissão da
Previdência. Motivo: a falta de
quórum para a comissão se reunir, pela manhã, o que deve se repetir com os feriados da próxima
semana.
A seguir, trechos da entrevista
concedida à Folha:
Folha - As propostas de reformas
são intocáveis?
João Paulo Cunha - Várias coisas
serão mudadas pela Câmara, tanto na tributária quanto na previdenciária. Algumas mudanças
vão acontecer. Com certeza.
Folha - O quê, por exemplo?
João Paulo - Na reforma da Previdência, a Câmara certamente
vai buscar uma transição que seja
mais justa. É fundamental. Um
segundo aspecto: a média de cálculo do benefício a ser recebido
na aposentadoria, que, segundo o
projeto original, seria a média de
35 anos, vai ser alterado. Também
vamos ter de garantir a regra que
garantiu aos professores certa especialidade.
Folha - Em duas semanas, o sr. tomou duas decisões que deixaram
muita gente no Planalto contrariada: instalar a comissão especial da
reforma da Previdência à revelia
do líder do PT e a CPI do Banestado,
que o governo havia conseguido
arquivar no Senado. Afinal, o sr. é
aliado ou adversário do governo?
João Paulo - Na realidade, eu não
sou nem aliado nem hostil ao governo. Eu sou presidente da Câmara dos Deputados e tenho que
cumprir a minha função de presidente.
Folha - Mas isso não reforça aquela idéia de que a coordenação política do governo bate cabeça no
Congresso?
João Paulo - Está errada essa
idéia de que eu não conversei com
o líder do PT. Eu conversei com
ele. Foi uma coisa combinada.
Folha - E a CPI do Banestado?
João Paulo - A mesma coisa. O
governo e todos os líderes da oposição e da situação sabiam.
Folha - O sr. vai instalar essa CPI?
João Paulo - Eu estou só esperando os partidos indicarem seus
membros. Falta o PP. Se indicar
no início da semana, provavelmente instalamos na quarta-feira.
Folha - E se o PP não indicar, o sr.
indica?
João Paulo - Indico.
Folha - O sr. pesou bem a possibilidade de o trabalho da CPI, que pode envolver congressistas, interferir no andamento das reformas?
João Paulo - A determinação minha e dos líderes é que essa CPI
não será palco. Não será uma CPI
de espetáculo.
Folha - CPIs, em geral, adquirem
dinâmica própria. Será possível
controlá-la?
João Paulo - Não sei se é possível
nem pretendo controlar. Só pretendo que a CPI seja uma CPI séria. Ponto.
Folha - Mas expõe a divisão no
governo, que encaminha de um
modo no Senado e de outro na Câmara.
João Paulo - Pode haver um problema de falta de comunicação e
de articulação. Mas a dificuldade
de articular não pode, em hipótese alguma, impedir que tanto o
Senado como a Câmara trabalhem com suas condições.
Folha - Essas dificuldades são
atribuídas a uma disputa política
entre o sr. e o líder do governo no
Senado, Aloizio Mercadante (SP).
Isso procede?
João Paulo - Isso não procede. O
senador Mercadante é meu amigo, meu companheiro. Tenho
uma relação pessoal ótima com
ele. Eu entendo perfeitamente o
seu trabalho. Não corresponde à
verdade esse negócio de que há
uma disputa entre nós.
Folha - O que se diz é que o sr. tem
assumido uma postura de independência porque tem como projeto
político disputar o governo de São
Paulo, assim como Mercadante.
João Paulo - O meu projeto é dirigir bem a Câmara neste ano e
meio que falta e ajudar o Brasil.
Folha - O sr. vai assinar a convocação extraordinária do Congresso
em julho?
João Paulo - Não está definido
ainda. Estamos fazendo a pauta
das matérias que serão apreciadas
em julho e vou apresentá-la ao
presidente [do Senado] José Sarney, que também deve preparar a
pauta do Senado. Juntos, nós vamos conversar com o presidente
da República.
Folha - O sr. prefere que ela seja
feita pelo Executivo?
João Paulo - Para mim, quem vai
convocar, como vai ser, não é o
mais importante.
Folha - O sr. pretende devolver os
salários ou doá-los ao Fome Zero,
como propõem deputados do PT?
João Paulo - Eu vou ver o que faço com o meu salário pessoal. Eu
vou garantir o que a lei determina
-e a lei determina o que todos os
deputados têm direito a receber.
Eu não posso descumprir a lei.
Cada deputado faz o que quer
com o seu salário.
Folha - Três salários?
João Paulo - Mas a determinação
da lei é essa, infelizmente. Se alguém quiser mudar a lei, é só sugerir.
Folha - Os senadores querem mudar as atuais regras de tramitação
das medidas provisórias, que permitem, no final do processo, que a
Câmara mude tudo que foi votado
e acertado no Senado. O sr. concorda com isso?
João Paulo - Não. A mudança
que fizemos no rito de tramitação
das medidas provisórias é muito
nova. Não tem nem um ano. Acho
que devemos aguardar um pouco
para fazer uma avaliação mais
profunda disso. Mas pode, de fato, ter havido uma certa falta de
sintonia entre Câmara e Senado
na apreciação de algumas matérias. Por isso, estou combinando
com o presidente [do Senado] José Sarney uma forma de resolver
essa questão. Para isso, o Senado
também precisa participar.
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