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São Paulo, sábado, 14 de junho de 2003

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ENTREVISTA

Presidente da Câmara dos Deputados afirma que haverá mudanças nas reformas propostas pelo governo

João Paulo diz que não é aliado nem hostil

RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Ao contrário do que deseja o governo, as reformas previdenciária e tributária sairão mudadas do Congresso. Quem assegura é o presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP), que afirma não ser "aliado nem hostil" ao governo.
Para ele, seriam inevitáveis mudanças nas regras de transição do atual para o futuro modelo da Previdência e na média de cálculo do benefício a ser recebido na aposentadoria.
João Paulo, 45, esteve no olho do furacão nas últimas duas semanas. Foi acusado de jogar contra o governo ao decidir instalar a CPI do Banestado e a comissão especial da reforma da Previdência. Mas diz que seu trabalho não é nem agradar nem atrapalhar o governo.
Ontem à tarde, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandou dizer a João Paulo que concluíra ser acertada sua decisão de mandar instalar logo a comissão da Previdência. Motivo: a falta de quórum para a comissão se reunir, pela manhã, o que deve se repetir com os feriados da próxima semana.
A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha:
 

Folha - As propostas de reformas são intocáveis?
João Paulo Cunha -
Várias coisas serão mudadas pela Câmara, tanto na tributária quanto na previdenciária. Algumas mudanças vão acontecer. Com certeza.

Folha - O quê, por exemplo?
João Paulo -
Na reforma da Previdência, a Câmara certamente vai buscar uma transição que seja mais justa. É fundamental. Um segundo aspecto: a média de cálculo do benefício a ser recebido na aposentadoria, que, segundo o projeto original, seria a média de 35 anos, vai ser alterado. Também vamos ter de garantir a regra que garantiu aos professores certa especialidade.

Folha - Em duas semanas, o sr. tomou duas decisões que deixaram muita gente no Planalto contrariada: instalar a comissão especial da reforma da Previdência à revelia do líder do PT e a CPI do Banestado, que o governo havia conseguido arquivar no Senado. Afinal, o sr. é aliado ou adversário do governo?
João Paulo -
Na realidade, eu não sou nem aliado nem hostil ao governo. Eu sou presidente da Câmara dos Deputados e tenho que cumprir a minha função de presidente.

Folha - Mas isso não reforça aquela idéia de que a coordenação política do governo bate cabeça no Congresso?
João Paulo -
Está errada essa idéia de que eu não conversei com o líder do PT. Eu conversei com ele. Foi uma coisa combinada.

Folha - E a CPI do Banestado?
João Paulo -
A mesma coisa. O governo e todos os líderes da oposição e da situação sabiam.

Folha - O sr. vai instalar essa CPI?
João Paulo -
Eu estou só esperando os partidos indicarem seus membros. Falta o PP. Se indicar no início da semana, provavelmente instalamos na quarta-feira.

Folha - E se o PP não indicar, o sr. indica?
João Paulo -
Indico.

Folha - O sr. pesou bem a possibilidade de o trabalho da CPI, que pode envolver congressistas, interferir no andamento das reformas?
João Paulo -
A determinação minha e dos líderes é que essa CPI não será palco. Não será uma CPI de espetáculo.

Folha - CPIs, em geral, adquirem dinâmica própria. Será possível controlá-la?
João Paulo -
Não sei se é possível nem pretendo controlar. Só pretendo que a CPI seja uma CPI séria. Ponto.

Folha - Mas expõe a divisão no governo, que encaminha de um modo no Senado e de outro na Câmara.
João Paulo -
Pode haver um problema de falta de comunicação e de articulação. Mas a dificuldade de articular não pode, em hipótese alguma, impedir que tanto o Senado como a Câmara trabalhem com suas condições.

Folha - Essas dificuldades são atribuídas a uma disputa política entre o sr. e o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (SP). Isso procede?
João Paulo -
Isso não procede. O senador Mercadante é meu amigo, meu companheiro. Tenho uma relação pessoal ótima com ele. Eu entendo perfeitamente o seu trabalho. Não corresponde à verdade esse negócio de que há uma disputa entre nós.

Folha - O que se diz é que o sr. tem assumido uma postura de independência porque tem como projeto político disputar o governo de São Paulo, assim como Mercadante.
João Paulo -
O meu projeto é dirigir bem a Câmara neste ano e meio que falta e ajudar o Brasil.

Folha - O sr. vai assinar a convocação extraordinária do Congresso em julho?
João Paulo -
Não está definido ainda. Estamos fazendo a pauta das matérias que serão apreciadas em julho e vou apresentá-la ao presidente [do Senado] José Sarney, que também deve preparar a pauta do Senado. Juntos, nós vamos conversar com o presidente da República.

Folha - O sr. prefere que ela seja feita pelo Executivo?
João Paulo -
Para mim, quem vai convocar, como vai ser, não é o mais importante.

Folha - O sr. pretende devolver os salários ou doá-los ao Fome Zero, como propõem deputados do PT?
João Paulo -
Eu vou ver o que faço com o meu salário pessoal. Eu vou garantir o que a lei determina -e a lei determina o que todos os deputados têm direito a receber. Eu não posso descumprir a lei. Cada deputado faz o que quer com o seu salário.

Folha - Três salários?
João Paulo -
Mas a determinação da lei é essa, infelizmente. Se alguém quiser mudar a lei, é só sugerir.

Folha - Os senadores querem mudar as atuais regras de tramitação das medidas provisórias, que permitem, no final do processo, que a Câmara mude tudo que foi votado e acertado no Senado. O sr. concorda com isso?
João Paulo -
Não. A mudança que fizemos no rito de tramitação das medidas provisórias é muito nova. Não tem nem um ano. Acho que devemos aguardar um pouco para fazer uma avaliação mais profunda disso. Mas pode, de fato, ter havido uma certa falta de sintonia entre Câmara e Senado na apreciação de algumas matérias. Por isso, estou combinando com o presidente [do Senado] José Sarney uma forma de resolver essa questão. Para isso, o Senado também precisa participar.


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