São Paulo, domingo, 14 de julho de 2002

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ELEIÇÕES 2002/MÍDIA

  Dados mostram relação entre espaço editorial e intenção de voto

  Projeto vai incluir telejornais e propaganda eleitoral gratuita

Instituto mapeia cobertura dos jornais

RENATA LO PRETE
DA REPORTAGEM LOCAL

Enquanto os jornais monitoram cada passo dos candidatos, um grupo de pesquisadores esquadrinha cada edição dos jornais. O trabalho se estenderá por toda a campanha, mas seus resultados parciais já permitem esboçar um mapa do comportamento da mídia impressa nas eleições presidenciais deste ano.
O estudo do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro) mede a quantidade e a qualidade das menções a cada um dos postulantes ao Planalto nas páginas dos principais diários.
No que diz respeito à visibilidade, os dados coletados entre 20 de fevereiro e 28 de junho mostram estreita relação entre o espaço destinado a determinado candidato e seu desempenho nas sondagens de intenção de voto.
"Como acontece na imprensa norte-americana, o padrão geral é determinado pela "corrida de cavalos'", diz Marcus Figueiredo, coordenador do projeto. Mas não apenas por ela. No entender do cientista político, outros fatores interferem na "noticiabilidade" do presidenciável.
Para ele, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria lugar de destaque na cobertura mesmo se não liderasse a disputa, tanto por concorrer pela quarta vez quanto por ser o nome mais claramente identificado como de oposição.
Da mesma forma, Figueiredo acredita que a condição de candidato do governo contribui para explicar por que José Serra (PSDB) teve, em vários momentos do período analisado, espaço maior do que o conferido a adversários em posição semelhante nas pesquisas. "Da condição de governista deriva todo um noticiário que acaba por se agregar à candidatura", afirma.
Em sua avaliação, o loteamento baseado na "corrida de cavalos" se explica pela lógica de mercado que rege os jornais. "Não dá para ignorar o interesse do leitor pelo que tem audiência."

"Mecanismo Tostines"
A afirmação leva a crer que a cobertura está presa ao que poderia ser chamado de "mecanismo Tostines". Como saber em que medida o candidato tem mais exposição porque está na frente, e em que medida está na frente porque tem mais exposição?
Figueiredo reconhece o dilema, mas acha que, de maneira geral, a posição relativa na disputa determina o grau de visibilidade do personagem, não o contrário.
Ele lembra que Folha, "Estado" e "O Globo", os jornais de maior penetração nacional, competem por um público grande e heterogêneo, não podendo, sob pena de perder terreno para os concorrentes, encampar uma candidatura e eliminar as demais das páginas.
Ainda que se observe um padrão geral de divisão, as fatias de cada um dos candidatos não são iguais nos três diários.
De acordo com a primeira série horizontal de gráficos reproduzida nesta página, a Folha destinou a Serra um espaço relativo expressivamente maior do que o obtido pelo tucano nos outros dois jornais -a linha vertical do quadro indica o número de aparições do candidato nos textos.
Na segunda parte do estudo, destinada a qualificar o tratamento dispensado aos presidenciáveis, a Folha aparece com os mais elevados percentuais de reportagens consideradas "neutras", em proporções semelhantes para os quatro candidatos.
O "Estado", nas palavras de Figueiredo, "chama a atenção por ser mais benevolente com o candidato de sua preferência" -em editorial publicado há pouco menos de um mês, o jornal declarou apoio a Serra.
O "positivo" predomina e está em ascensão na cobertura do tucano. O "negativo", nas de Lula e Anthony Garotinho (PSB). O "neutro" só sobressai nos textos sobre Ciro Gomes (PPS).
No "Globo" se verifica um quadro geral de equilíbrio, mas com características diferentes das observadas no noticiário da Folha. Para os quatro candidatos, as taxas de "neutro" são menores. Porém, há mais semelhança entre as de "positivo" e "negativo".

Padrões de escolha
Figueiredo pondera que os percentuais de reportagens "positivas" e "negativas" não derivam necessariamente da intenção editorial de promover ou perseguir uma candidatura.
O movimento ascendente de Ciro nas pesquisas de intenção de voto é, em si, um fato "negativo" para Serra. Assim como o é, para Lula, a declaração do petista de que propina de R$ 40 mil é troco, em referência às investigações sobre a Prefeitura de Santo André.
Mesmo quando buscada e medida por uma série de parâmetros, a neutralidade jornalística é um conceito sujeito a debate.
O pesquisador também reconhece que desdobramentos da campanha -desde a escolha de um vice até a erupção de um escândalo- têm influência sobre a divisão de espaço, independentemente do quanto se planeje destinar a cada candidato.
Mais do que no destaque dado a notícias isoladas -"positivas" ou "negativas"-, Figueiredo acredita que a orientação editorial se faz perceber em padrões de escolha e hierarquização dos assuntos. "As decisões políticas da imprensa, um dos atores do processo eleitoral, começam com a seleção do que publicar", diz.
Inspirada em estudos semelhantes conduzidos nos EUA e na Europa, a avaliação dos jornais é parte de um projeto do Iuperj a respeito do papel da mídia na definição do voto.
A iniciativa tem precedentes no país. O Datafolha, por exemplo, realiza medições desse gênero desde o pleito de 1989. Também não é a primeira vez que o Iuperj se debruça sobre a cobertura jornalística de eleições, mas o trabalho este ano será mais amplo.
Além de veículos impressos (está em curso um capítulo sobre as revistas, ainda sem resultados consolidados), o projeto incluirá o noticiário dos telejornais, a propaganda eleitoral e uma pesquisa nacional com 2.000 entrevistas.


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