São Paulo, quarta-feira, 14 de agosto de 2002

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JANIO DE FREITAS

Caixas-pretas

O convite de Fernando Henrique Cardoso aos quatro principais candidatos, para tratar do novo acordo com o FMI, é, em velha e branda imagem, um convite para salto no escuro. Em terreno absolutamente desconhecido.
Se as únicas exigências do FMI fossem as divulgadas pelo governo e, vá lá, o acordo pudesse justificar as celebrações de Pedro Malan e da mídia, não haveria motivo para as conversas. Nem para a urgência com que Fernando Henrique deseja fazê-las.
Não faz sentido, também, o argumento de que os candidatos devem entender-se com o governo porque o acordo se estende ao futuro mandato. A posição do futuro presidente, em relação ao acordo e mesmo ao FMI, será decidida segundo as políticas que considere mais adequadas aos seus objetivos, e isso tanto admite a confirmação como a reforma dos termos aceitos pelo atual governo.
Ao que está divulgado, o acordo empresta US$ 6 bilhões até o final do ano, para que Fernando Henrique e Pedro Malan disfarcem a grandeza da crise que vão deixar ao futuro presidente. Trata-se menos de um socorro ao Brasil do que ao governo posto a nu na sua hora final. Aproveitar o socorro, deixando-o como dívida a ser paga por nós outros, é o máximo que o governo tem o direito de fazer em relação ao acordo. E nada que ultrapasse, seja em que medida, o 31 de dezembro em que expiram os seus poderes.
Até tossir será perigoso ao candidato que esteja em conversa com Fernando Henrique sobre o acordo: correrá o risco de ver na TV e nos jornais que deu um assentimento sucinto, porém claro, ao compromisso que lhe foi pedido com o FMI. E, ainda que surpreendentemente pudessem concordar com as exigências verdadeiras do Fundo, Luiz Inácio Lula da Silva, Ciro Gomes e Anthony Garotinho cometeriam imprudência irreparável. Não é só o acordo que se afigura como caixa-preta.
O próximo presidente vai receber uma caixa-preta com dimensão nacional. O verdadeiro estado do país só será conhecido pelo novo presidente, se puder sê-lo, depois de empossado e posta a sua equipe a desvendar as entranhas da máquina de governo e do país mesmo. A começar do Banco Central e da Fazenda, a escuridão é muito maior do que a clareza. Só depois de algum conhecimento do quadro o futuro governo estará em condições de definir políticas em relação à dívida recebida, a mais endividamento ou não, e portanto ao acordo e ao FMI.
Em tempo: José Serra não foi citado acima porque, embora não desfrutasse da confiança da equipe econômica para saber mais do que o óbvio, já deu apoio pleno ao acordo, qualquer que sejam os seus termos.



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