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São Paulo, quinta-feira, 14 de agosto de 2003

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JANIO DE FREITAS

A quieta inquietude

O governo está incomodado com o governo. Convenhamos que é uma sensação bem pouco original, nas atuais circunstâncias. Ainda assim, diferentemente de muitos petistas ilustres e de outros nem tanto, o governo reconhece que é preciso fazer alguma coisa para atenuar a percepção generalizada de que é um governo que não se mexe. Ou, como diz um ex-conselheiro de Lula, posto à distância porque não esquece o que dizia e o que ouvia, só se mexe para jogar as peladas palacianas. Injusto exagero, porque volta e meia um dos ministros está com algo fraturado no lado esquerdo e barrado por essa coerência ortopédica, à falta de outra melhor.
O que importa é a providência do presidente, de reunir os ministros para pedir-lhes a relação das obras paradas ou em faz-de-conta, que possam ser concluídas em futuro próximo para mostrar realizações governamentais. A bem dizer, é a terceira reunião que o presidente faz com a mesma finalidade e as mesmas pessoas, o que é mais uma prova de governo que se mexe. Poderia ser ainda a 2ª, já a 15ª ou a 23ª, sem haver a menor diferença. Porque as reuniões dão primeiras páginas e telejornais, mas delas não decorre o fundamental.
Eis, a propósito, algumas palavras bem recentes de Joelmir Beting, comentarista, presumo, não alvejado pelos petistas em desespero de causa: "O governo Lula aprumou-se para investir, neste seu primeiro ano de estrada, R$ 630 milhões na malha rodoviária. Até julho, investiu nada além de R$ 2,7 milhões". Com esse dinheiro, nota Joelmir, não dá nem "para repintar as placas da sinalização rarefeita nos 52 mil quilômetros de pistas supostamente pavimentadas".
Cada qual com os seus problemas, os ministérios todos estão sufocados e inutilizados pela recusa do ministro da Fazenda de liberar-lhes as verbas. São centenas ou já milhares de prefeituras, pelo país afora, que aderiram forçadamente ao estilo Brasília atual: não se mexem mais - por falta das verbas que lhe devidas, mas não lhes são repassadas pelo governo federal. As novidades mais recentes, nesse sentido, vêm da área da Saúde: verbas de programas tão importantes como o de redução da catarata e do diabetes na população, para combater os altos índices de cegueira e outras desgraças, entram na linha dos cortes.
Somadas, as recusas à liberação de verbas explicam o grande êxito do ministro Antonio Palocci, o tal superávit de 5,41% em relação ao PIB, muito acima dos 4,25% que prometeu espontaneamente ao FMI, cuja exigência era de 3,75%. E, o que tudo indica ser do seu agrado na mesma medida, quanto mais sejam retidas as verbas, menos o governo se mexe. Fica todo ele igualzinho ao recessivo Ministério da Fazenda.

Relativa
A marchinha carnavalesca do genial Max Nunes dizia assim:
"Tamanduá, e, i, o, u
galinha preta
não tem nada com peru".
Bem, agora, depende.


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