|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Eleito era peça que FHC movia no tabuleiro
RAYMUNDO COSTA
DO PAINEL, EM BRASÍLIA
Antes de viajar para o Timor
Leste, Fernando Henrique Cardoso convidou líderes tucanos ao
Palácio da Alvorada para discutir
as eleições do Congresso.
Aécio Neves (MG), líder do
PSDB na Câmara, chamou Teotonio Vilela Filho (AL), presidente
da legenda, e pediu: "Diga a ele
que eu não vou e que ele vai entender por quê".
Neto e filho de tradicionais políticos mineiros, desde cedo Aécio
se iniciou nos códigos da política.
Se fosse à reunião -imaginava- deixaria a impressão de que
FHC apoiava sua candidatura à
Câmara, o que era verdade, mas
não podia ser dito, ou que fora
chamado para ser retirado da disputa, suspeita que permeou todos
os lances da eleição. Recado dado,
FHC respondeu a Teo Vilela: "Já
entendi. Fez muito bem".
No jogo eleitoral da Câmara, havia uma certeza: Aécio era uma
peça que FHC moveu no tabuleiro para sacrificar mais adiante,
quando fosse necessário compor
os interesses de PFL e PMDB, seus
eventuais aliados para 2002.
Aécio também supunha que essa era uma opção nos cálculos políticos de FHC. Mas tinha certeza
de uma coisa: o presidente não seria o engenheiro de sua saída. Afinal, entrara no jogo com o aval e a
promessa FHC de enfrentar as
consequências que adviriam dele.
Aécio virou um peão no xadrez
eleitoral da Câmara no Alvorada,
em reunião de FHC com a cúpula
do PSDB que atravessou uma madrugada da primeira semana de
setembro de 1999.
Eleitos em maio para comandar
a legenda, os dirigentes tucanos
exibiram um quadro dramático
do PSDB. Pesquisas internas revelavam que a sigla era vista pela população como à direita do PFL.
O PSDB sentia-se espezinhado
pelos aliados, especialmente o
PFL, temia vir se transformar numa força média no Congresso e
chegar a 2002 sem condições de se
impor na aliança que vai indicar o
sucessor de FHC. O rosário de
queixas era imenso.
Nas eleições de 98, tiveram de
abrir mão de candidatos próprios
em oito Estados em favor da
aliança com os aliados. Por imposição do Planalto.
Nos dois Estados em que se rebelaram, Espírito Santo e Goiás,
se deram bem, elegendo o senador Paulo Hartung (ES) contra Elcio Álvares( ES) e o governador
Marconi Perillo (GO) derrotando
o ex-ministro da Justiça Iris Resende (PMDB).
FHC ouvia pacientemente.
Em setembro, a popularidade
do presidente estava em baixa e o
senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) em franca ofensiva pelo salário mínimo de US$
100. O clima político no Congresso era tenso.
Poderia estar muito pior -lembrou Teo Viela- se os três líderes
do governo fossem Luís Eduardo
Magalhães, Benito Gama e Elcio
Álvares, todos pefelistas, como fora até recentemente, em vez dos
atuais tucanos Arthur Virgílio,
Arnaldo Madeira (SP) e José Roberto Arruda (DF).
Coube a Aécio Neves o lance final: o PSDB era o único partido
que não tinha outro candidato
que não fosse tucano. Ou o governo privilegiava a aliança, deixando-o isolado e sem forças para defender FHC no Congresso e se impor na eleição de 2002, ou conquistava uma das Casas, desmontando o tripé pelo qual PMDB e
PFL se revezavam nos comandos
do Senado e da Câmara e o PSDB
tinha a Presidência da República.
Estava claro que a vítima seria o
PFL. Mas também que o jogo se
restringiria às eleições no Congresso. A eleição de 2002 será outro jogo, no qual o PMDB larga
em vantagem, mas não sozinho.
-Temos a chance de disputar a
presidência da Câmara - arriscou Aécio.
FHC arbitrou:
- Isso vai provocar fraturas,
mas estou disposto a enfrentá-las!
Aécio não perdeu tempo:
- Posso avançar?
- Vá adiante.
Na reunião do Alvorada estavam os parlamentares que viriam
constituir o núcleo da campanha
de Aécio (Teo, Sérgio Machado,
Arthur Virgílio, Nelson Marchezan e Arnaldo Madeira), e três ministros (José Serra, Pimenta da
Veiga e Aloysio Nunes Ferreira).
Alguns parlamentares, mas sobretudo os ministros, achavam
que Aécio era uma peça a ser removida adiante em nome do tripé. Mas, também, que, viabilizado
o PSDB na Câmara, outro nome
seria chamado para o lugar: Pimenta da Veiga (Comunicações),
Alberto Goldman (SP) ou Aloysio
Nunes Ferreira (Secretaria Geral).
Cabia a Aécio ser o engenheiro e
o mestre-de-obras da própria
candidatura. A geração tucana
mais antiga o achava imaturo. De
fato, quando Tancredo Neves
morreu, em 1985, esse mineiro de
40 anos, economista, divorciado,
pai de uma uma menina de 9
anos, não sabia o que fazer.
Aceitou um cargo na Caixa Econômica Federal e candidatou-se a
deputado federal em 1986. "Teve
atuação tímida nos dois primeiros mandatos (em 14 anos, apresentou 21 projetos, nenhum deles
vingou). Eleito líder, revelou-se
bom articulador, ativo na defesa
do governo e do partido", diz o
perfil de Aécio traçado pelo o
Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar).
Na opinião de FHC, Aécio é um
político que "sabe perceber as
oportunidades". De imediato, o
mineiro percebeu que precisava
vencer o descrédito e as resistências do PSDB. Em junho passado
foi a São Paulo conversar com
Mário Covas:
- Você conta com a unidade
da bancada?
- Conto.
- Se for preciso, terá coragem
de enfrentar o governo?
- Terei
- Então, conte comigo.
Mais difícil era Tasso Jereissati.
Pré-candidato a presidente, o governador cearense não via e não
vê com bons olhos o acordo do
PSDB com o PMDB, necessário
para eleger Aécio, mas que trazia
embutia a eleição de Jader no Senado, inimigo do principal aliado
do cearense no PFL, ACM.
Aécio foi a Fortaleza. Conversaram um pouco no Palácio do
Cambeba e depois Tasso o levou
até sua casa, dirigindo o próprio
carro. Aécio argumentou que ele,
Tasso, era o candidato de ACM,
mas antes precisava ser candidato
do PSDB e não podia jogar contra
sua candidatura à Câmara.
Tasso foi reticente. Não garantiu votos a Jader, mas mandou
que os dois senadores tucanos do
Ceará assinassem a lista que referendava o acordo entre as duas legendas.
Auxiliado pelo tio Francisco
Dornelles, ministro do Trabalho,
Aécio acertou um acordo com Severino Cavalcanti (PE), o candidato do PPB. Se FHC não o retirasse da disputa, o que Severino
sinceramente acreditava, o PPB o
apoiaria, como de fato apoiou.
Aécio viria cumprir a promessa
de "enfrentar o governo" feita a
Covas quando uma reunião de
ministros com Jorge Bornhausen
(PFL) tentou "zerar" o jogo no
Congresso. Partiu para o ataque,
junto com os outros parlamentares tucanos presentes na reunião
de setembro no Alvorada.
Foi um dos momentos de maior
perigo para Aécio, mas a articulação acabou abortada por quem os
tucanos menos esperavam: Michel Temer (PMDB), que até ali
vivia pedindo para FHC intervir
para pacificar a base aliada.
Difícil foi convencer o PMDB de
que FHC não o retiraria do jogo.
As desconfianças só acabaram
quando Jader Barbalho percebeu
que ACM não deixaria o PFL fazer
um acordo, o que era desejo do
peemedebista, que o elegesse presidente do Senado.
FHC parece ter abandonado de
vez a hipótese de sacrificar Aécio
quando ACM disse que ele tolerava a corrupção. O presidente sempre absorvera (mal) os questionamentos de sua autoridade feitos
pelo pefelista. Mas, a partir do
momento em que ele duvidou de
sua moral, sentiu-se descompromissado de fazer qualquer acordo
com o líder baiano.
Texto Anterior: Tucano levará projeto contra MPs ao plenário Próximo Texto: Vencedor prega independência do Legislativo Índice
|