São Paulo, sábado, 15 de julho de 2000


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CASO TRT
Para ministro do Planejamento, quem deveria conhecer irregularidades da obra em SP é o Tribunal Superior do Trabalho
Não fiscalizo o Judiciário, afirma Martus

ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro Martus Tavares (Planejamento, Orçamento e Gestão) disse ontem que o TST (Tribunal Superior do Trabalho), autor do pedido de verbas suplementares para o TRT-SP, é que deveria conhecer as suspeitas de irregularidade e o relatório de 1995 do TCU (Tribunal de Contas da União) contrário à obra.
"O TRT-SP e o TST, que encaminhou o pedido, é que tinham que saber. Não eu. Eu não fiscalizo obra do Judiciário", disse, garantindo que não tinha informação sobre o relatório nem sobre as suspeitas. À Folha, o ministro alegou que nem os deputados paulistas sabiam, tanto que aprovaram emenda aumentando o crédito da obra um ano depois da sua exposição de motivos.

Folha - Por que o sr. assinou a exposição de motivos favorável à verba suplementar do TRT-SP, uma obra superfaturada?
Martus -
Antes, eu gostaria de dizer que isso tudo é uma coisa de louco. Estou chocado, indignado, tenho o trabalho de toda uma vida, um nome, uma imagem, uma reputação. Em 15 anos de governo, nunca estive sob suspeita. Como é que podem insinuar que eu tenha alguma relação com um foragido? Onde é que a gente está, que ninguém te dá ouvidos, você não consegue nem se explicar?

Folha - Como não consegue se explicar?
Martus -
Você, da imprensa, deve saber melhor do que eu.

Folha - Qual é a sua explicação?
Martus -
Quem tem iniciativa constitucional em matéria orçamentária é o Executivo, que envia as propostas para o Legislativo, inclusive as propostas de verbas para o próprio Legislativo e para o Judiciário. No caso do TRT-SP, o Executivo recebeu pedido e relatório técnico do TST. Nas páginas 7 e 8, o relatório relaciona nove consequências caso a obra fosse interrompida.
Olha aqui (mostrando uma cópia): dispensa generalizada de funcionários, deterioração de todas as máquinas e motores de tração e multas de fornecedores.

Folha - O TCU já investigava irregularidades desde 1992 e informou à Comissão Mista de Orçamento do Congresso no final de 1995, bem antes de sua exposição de motivos.
Martus -
Eu não sabia. Eu disse claramente na nota (divulgada na quinta-feira) e repito: não sabia de investigações do TCU, muito menos de irregularidades.

Folha - Como o sr. não sabia, se o deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA) conseguiu cortar verbas da obra com base no TCU?
Martus -
O Executivo não foi notificado, não foi comunicado. Não houve correspondência, não houve nada do TCU avisando de irregularidades. O próprio presidente do TST na época diz que ele não tinha sido comunicado pelo TCU.

Folha -E o alerta do deputado?
Martus -
Eu não tenho obrigação de saber o que disse o deputado tal ou qual, no dia tal, na sessão qual. São mais de 500 deputados e há em torno de 10 mil emendas ao Orçamento. O deputado diz que a Comissão de Orçamento tinha a informação. Ao que eu saiba, cortaram só uma parte da emenda. O Congresso só tirou um pedaço. Então, era só uma meia irregularidade? Como uma meia gravidez?
E como é que todo mundo sabia, se os deputados de São Paulo aprovaram uma emenda para um crédito de R$ 10 milhões para a obra em 7 de outubro de 1997? Isso foi cerca de um ano depois da minha exposição de motivos. Se nem a Marta Suplicy, o José Genoino e o Delfim Netto sabiam de TCU, de Giovanni Queiroz, por que eu tinha que saber? Eles são gente de bem e estavam dentro do Congresso. Não sabiam. Eles não estavam fazendo nada de errado. Nem eu.

Folha - O sr. não sabia, os deputados não sabiam e o sr. diz que ninguém tinha que saber. Então, quem tinha que saber e fazer algo?
Martus -
O TRT-SP e o TST, que encaminhou o pedido, é que tinham que saber. Não eu. Eu não fiscalizo obra do Judiciário.

Folha - O sr. não acha que ao assinar embaixo o pedido de tanto dinheiro para uma obra do Judiciário ou de qualquer outra coisa assim tão sem informação é um risco?
Martus -
O Executivo não fiscaliza obra do Judiciário. Não tem competência para isso. Aliás, nem tinha mesmo porque ser notificado pelo TCU sobre as irregularidades. Os créditos foram em 1995 e 1996, e só depois de 1997 as obras de curso irregular identificadas pelo TCU passaram a fazer parte da lei orçamentária, proibidas de receber créditos suplementares. Especificamente, a do TRT-SP só apareceu ali como irregular em 98. Aí, não teve mais crédito.

Folha - Por que, apesar da falta de dinheiro, do discurso do ajuste fiscal, o sr. aprovou verbas para um prédio de tribunal?
Martus -
As pessoas não entenderam isso na nota do ministério, mas é assim mesmo: é usual atender pedido do Judiciário e do Legislativo. Até porque cabe ao Executivo apenas encaminhar. Quem aprova ou não é o Congresso.
Vamos ser sinceros? Vem um pedido do Supremo, de um outro tribunal, e você não atende? Já é difícil dizer "não" para um outro ministro ali do lado, imagine para um outro Poder.

Folha - O sr. pensa em sair do governo?
Martus -
Não. E não entendo por que estacionou aqui.

Folha - O que estacionou onde?
Martus -
Isso tudo, esse problema de TRT. Por que estacionar aqui no Planejamento?

Folha - Onde deveria estacionar?
Martus -
Não sei. Só sei que não é aqui. Não temos responsabilidade sobre contratação, empenho, pagamentos e fiscalização do Judiciário.

Folha - O sr. conhece o ex-juiz Nicolau dos Santos? Falou com ele, pessoalmente ou por telefone?
Martus -
Desde ontem (anteontem) mandei rastrear tudo, telefone, agenda, para saber se teve telefonema ou audiência. Hoje, mandei rastrear tudo de novo, para ter certeza. Só acharam uma ligação, do dia 11 de novembro de 1996 (na época, era secretário-executivo do Planejamento) quando o crédito já tramitava no Congresso. Mesmo que eu tivesse falado mais, recebido em audiência, não teria problema nenhum. Ele era um juiz. Eu recebo muitos juízes e falo com muitos juízes por telefone.
Agora, sinceramente, eu não me lembro dele. Você não tem idéia da quantidade de gente que eu recebo aqui. Ele não era um foragido, não era famoso, como é hoje. Como é que eu me lembraria imediatamente se tinha ou não recebido ou falado com ele?

Folha -Nas gravações publicadas pela revista "IstoÉ", o ex-juiz diz que falou várias vezes com o sr. e que o sr. inclusive se referiu a Eduardo Jorge como "pistolão".
Martus -
Essas fitas... Elas estão esquisitas. O que eu posso dizer é que é mentira. Evidentemente, não falei com ele várias vezes. Evidentemente, é uma mentira.

Folha - O ex-ministro Eduardo Jorge interferiu a favor da obra?
Martus -
Comigo? Nunca.

Folha - Qual é e qual era sua relação com ele no governo?
Martus -
Normal. Igual à que tinha com outros ministros e secretários-executivos. Nada especial.


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