São Paulo, terça-feira, 15 de julho de 2008

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Mendes vê ação combinada de PF e Justiça

Presidente do STF diz que Tarso não tem poder para decidir inquéritos nem prisão preventiva e que cabe ao Judiciário julgar

Em ato de advogados em SP, Mendes afirmou que prisão preventiva tem sido usada em muitos casos "para punir", antes da condenação


Eduardo Knapp/Folha Imagem
Ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo, fala com jornalistas durante visita ao grupo Consultor Jurídico, em São Paulo

ANA FLOR
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Gilmar Mendes, disse ontem que o ministro da Justiça, Tarso Genro, não tem "competência para decidir inquéritos, muito menos prisão preventiva". Mendes afirmou que Tarso pode elogiar o trabalho da Polícia Federal e do juiz federal Fausto Martin De Sanctis "como cidadão".
"Cabe ao Judiciário julgar. Não cabe ao ministro da Justiça julgar (...) Ele pode fazê-lo [elogiar o trabalho da PF e do juiz] como cidadão, mas não é competência do ministro da Justiça decidir inquéritos, muito menos prisão preventiva."
Em entrevista à Folha publicada no domingo, Tarso disse que seria "muito difícil" para o banqueiro Daniel Dantas, dono do banco Opportunity e acusado de corrupção ativa, tráfico de influência, entre outros crimes, provar sua inocência. Sanctis decretou duas vezes a prisão do banqueiro.
O presidente do STF participou ontem de um ato de desagravo que advogados organizaram em seu apoio em São Paulo. Em entrevista exclusiva à Folha ontem, ele criticou a ação "concertada" entre polícia, Ministério Público e juízes. Disse ainda que a prisão preventiva está sendo usada em muitos casos "para punir" antes de uma condenação. "Quem está usando a prisão preventiva como julgamento está com a premissa errada."
O presidente do Supremo não quis comentar a Operação Satiagraha, da PF. Mas deu a entender que PF, Ministério Público e Justiça Federal podem estar erroneamente agindo de maneira combinada.
"Cabe à polícia investigar, ao Ministério Público oferecer denúncia e ao juiz, criticamente, aceitar ou não denúncia, pedidos de prisão, busca e apreensão. Se essa ação se faz de maneira combinada, ou de maneira concertada, nós já estamos num modelo distorcido e para isso nós precisamos ter cuidado", afirmou.
Mendes criticou o excesso de prisões preventivas, com as quais o STF tem sido "muito rigoroso". "Não devemos emocionalizar o tema, é preciso tratar com a devida cautela. Até porque depois a população se pergunta "e essas prisões espetaculares que levam à absolvições?" -exatamente diante de acusações malfeitas".
Sobre os ataques que sofre por ter concedido os dois habeas corpus que garantiram a liberdade de Dantas, Mendes afirmou que "críticas, aplauso, isso é rotina".
Participaram do ato de desagravo vários dos mais renomados advogados do país. Entre eles, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que defendeu o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, Antônio Corrêa Meyer, ex-secretário da Segurança de São Paulo, Arnaldo Malheiros, que defendeu o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o banqueiro Edemar Cid Ferreira, além de Manuel Alceu Affonso Ferreira, Arnoldo Wald, Celso Mori, Daniel Bialski, David Rechulski, Misabel Derzi e Igor Mauler Santiago.
Assinada por quase 150 advogados, a carta elogia Mendes, dizendo que eles "se sentem seguros por viver num país que tem no ápice de sua estrutura judiciária um magistrado que tem a coragem e a dignidade de manter a Constituição acima da gritaria".
No encontro fechado à imprensa, ao qual a Folha teve acesso, os criminalistas criticaram a atitude "messiânica" do delegado da PF Protógenes Queiroz, da Operação Satiagraha. Criticaram também a atitude do juiz Sanctis. Cauteloso, Mendes ouviu muito, mas fez poucos comentários.
Mais tarde, em coletiva à imprensa, Mendes rebateu a afirmação de que "quem não tem advogado bom fica preso": "O Tribunal tem recebido pedido de habeas corpus até em papel de pão. (...) É preciso encerrar com esse debate de que o tribunal celebra uma Justiça de classes. Agora, o dever de instituir defensorias públicas próprias é do Poder Executivo, não é do Poder Judiciário".


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