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ARTIGO
Um grande banquete cívico-penal
MARCELO COELHO
COLUNISTA DA FOLHA
Os escândalos já não espantam muito, as revelações
se tornam rotineiras, os casos de
corrupção mais ou menos se misturam e confundem. Mas cada
nova figura humana que surge no
noticiário é uma surpresa e tanto.
Ontem foi o dia de Sebastião
Buani dar o melhor de si. Convenhamos que ele exagerou na dose.
Não sabia como dar solenidade
suficiente aos seus 15 minutos de
fama. Antes de apresentar a cópia
do cheque capaz de comprometer
definitivamente o mandato de Severino Cavalcanti, o dono do restaurante Fiorella conclamou os
repórteres presentes a um ato de
oração.
A idéia caberia numa casa de família tradicional, acostumada a
rezar antes do almoço ou do jantar. Mas o "look" de Buani era
mais o de um playboy do que o de
um austero patriarca republicano, e o que estava sendo servido
aos jornalistas numa bela bandeja
-melhor dizendo, num bandejão de luxo- era a apetitosa, embora não muito recheada, cabeça
do presidente da Câmara.
A fúria com que a imprensa
avançou sobre a mesa dissipou
rapidamente as aparências de cerimônia moral que Buani tentou
atribuir ao repasto. Por pouco a
disputa pelas cópias do famoso
cheque não degenerava em quebra-quebra. Havia, entretanto,
imagens e provas para todos:
Buani segurava para as câmeras
uma réplica tamanho-família do
cheque nominal, como naqueles
eventos em que alguém recebe o
grande prêmio de um concurso.
Tudo tem mesmo um ar de Big
Brother, da já remota secretária
Fernanda Karina, que quis posar
nua para uma revista masculina,
aos papéis de valentão briguento,
de rapaz inocente, de pateta comprovado, que este ou aquele deputado encarna para as câmeras
da CPI.
Sociedade do espetáculo? Seria
equivocado dar esse nome a uma
sucessão de notoriedades amadoras e de pretensões fugazes ao papel de candidato nas próximas
eleições. Enquanto o discurso de
Buani se alçava em defesas da moralidade republicana, sendo corroborado aos gritos por um cidadão entusiasta -ao que tudo indica, um intruso no local-, o advogado do empresário, sentado a
seu lado na entrevista coletiva, devolvia a cena a realidades e interesses bem mais prosaicos.
Assoprava ao ouvido de Buani
as respostas convenientes sem o
cuidado de tapar os microfones.
Percebia-se que todo o seu empenho, ali, era evitar que Buani fosse
visto como o corruptor de Severino. Insistiu-se na história de que o
dono do restaurante foi apenas vítima de uma extorsão imposta pelo parlamentar.
Sobraram, assim, dúvidas e suspeitas daquele grande banquete
cívico-penal. Que, para maior
desmoralização dos participantes, começou com um pedido de
gorjeta: face às dificuldades financeiras vividas por Buani, seu advogado quis divulgar o número
de uma conta bancária, destinada
a receber doações de empresários
interessados no bem do nosso
país. Proposta infeliz, claro. Os
empresários brasileiros devem
andar cansados de fazer doações
ultimamente.
Seja como for, depois da entrevista de Buani parece ter diminuído o cheiro de pizza no ar. Mas
também dá para sentir o gosto de
papelão de tudo aquilo.
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