São Paulo, segunda-feira, 15 de novembro de 2004

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BRASIL PROFUNDO

Pelo menos oito empresas multinacionais são alvo do inquérito, que apura ações em quatro Estados brasileiros

PF investiga contrabando de diamantes

ELVIRA LOBATO
ENVIADA ESPECIAL A RONDÔNIA

A Polícia Federal investiga o envolvimento de empresas estrangeiras de mineração com o contrabando de diamantes em Rondônia, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. Pelo menos oito empresas estão sob investigação. O inquérito foi aberto em julho como conseqüência da operação Rondônia/Mamoré, iniciada no ano passado para apurar indícios de corrupção e de desvio de dinheiro público no Estado.
A primeira empresa intimada foi a Mineração Paraguaçu, que tem como acionista a empresa canadense Vaaldiam Resources. Ela despertou a atenção da PF em maio deste ano, quando transferiu sua sede para o município de Espigão do Oeste (RO), vizinho à reserva Roosevelt, dos índios Cintas Largas, onde 29 garimpeiros foram mortos em abril.
Segundo o delegado Mauro Spósito, coordenador da operação Rondônia/Mamoré, multinacionais se instalaram nas imediações da reserva indígena a pretexto de pesquisar a existência de diamantes, ouro e outros minerais. A PF desconfia que a pesquisa seja apenas fachada para atividades ilegais.
""A suspeita maior é a de que elas façam contrabando de diamante. Não acreditamos que estejam pesquisando", diz o delegado. Segundo ele, um fato comum às empresas investigadas é que elas têm sede em paraísos fiscais.
Spósito trabalha com mais duas hipóteses para explicar o interesse das multinacionais pelas áreas de garimpo: conter a produção para evitar a desvalorização da pedra no mercado internacional e assegurar a prioridade na exploração.
Citando o instituto de pesquisa ""US Geological Survey", o delegado diz que o Brasil aparece com apenas 0,96% da reserva mundial de diamantes nas estatísticas internacionais. ""Por que as empresas estrangeiras gastariam dinheiro para montar uma estrutura aqui, se o potencial fosse tão pequeno?", questiona.

Troca-troca
A Mineração Paraguaçu, segundo consta no inquérito policial, foi constituída em 2001, em Cuiabá (MT), por duas empresas brasileiras: Mineração Santa Elina e MSP Participações.
Em fevereiro do ano passado, a Mineração Santa Elina transferiu sua parte no capital para uma empresa registrada nas Ilhas Virgens Britânicas, paraíso fiscal do Caribe, de nome Santa Elina Mines Corporation. Sete meses depois, as ações foram repassadas para a Vaaldiam, com sede em Ontário, Canadá.
Assim que formalizou sua associação com a Santa Elina, a Vaaldiam anunciou que havia adquirido uma área para prospecção de diamantes de 176 mil hectares adjacente à reserva indígena, em Rondônia.
Com o alvará de pesquisa expedido pelo DNPM (Departamento Nacional da Produção Mineral, do do Ministério das Minas e Energia), ela emitiu ações e captou cerca de US$ 4 milhões no Canadá para financiar o empreendimento em Espigão do Oeste.
Segundo o consultor da Vaaldiam para o projeto, Luiz Bizzi -ex-diretor da CPRM (Companhia de Pesquisas de Recursos Minerais, do Ministério das Minas e Energia)- há mais três ou quatro firmas canadenses pesquisando diamantes nas imediações da reserva Roosevelt, mas ele nega que elas extraiam diamantes ou façam contrabando.

Canadá
As canadenses são as principais investigadas. Segundo especialistas, a legislação fiscal do Canadá estimula a prospecção de diamantes dentro e fora do país. O investimento em ações dessas empresas pode ser descontado do Imposto de Renda a pagar.
Desde 1994, há um crescente interesse de empresas daquele país pelo Brasil. Um estudo encomendado pelo DNPM, no ano passado, retratou o fenômeno.
O DNPM listou 12 empresas que captaram US$ 165 milhões no mercado de ações no Canadá para investir em pesquisa de diamante no Brasil. Os alvarás de pesquisa em poder delas abrangiam 738 mil hectares em 2001. O estudo chama a atenção para um outro fenômeno: os alvarás mudam de mãos com grande freqüência, e o mesmo acontece com o controle da empresas.
O alvará para pesquisa de diamante em Espigão do Oeste em poder da Paraguaçu pertenceu, até o ano passado, à Rio Tinto, uma das maiores mineradoras do mundo. Segundo o advogado da Santa Elina, Augusto Botelho, a Rio Tinto investiu US$ 20 milhões na região, e não chegou a resultado economicamente viável, mas sua cliente entende que deve insistir na busca.
O diretor-geral do DNPM, Miguel Cedraz Nery, entregou à Polícia Federal a relação das 30 empresas e pessoas físicas que obtiveram alvará de pesquisa mineral nos municípios próximos à reserva Roosevelt nos últimos três anos. Segundo Nery, o DNPM não expediu até hoje nenhuma autorização para extração de diamantes nos municípios próximos da reserva indígena. Portanto, toda produção local é ilegal. Na semana passada, a PF desativou um garimpo nas imediações de Espigão do Oeste, fora da reserva.


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