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ENTREVISTA
Ex-governador do DF admite que disputará prévia do PT à Presidência caso Lula não concorra
Cristovam quer moratória negociada
MONICA BERGAMO
da Reportagem Local
O ex-governador de Brasília
Cristovam Buarque, 55, não esconde de ninguém a imensa vontade de ser candidato à Presidência do Brasil pelo PT. Derrotado
por Joaquim Roriz (PMDB) ao
tentar se reeleger para o governo
de Brasília, Cristovam viajou para
18 países em 1999, escreveu três livros e já disse que, se Lula não for
mesmo candidato, pretende disputar a indicação do partido.
Dificuldades, ele terá. Uma boa
parte do PT desconfia de sua personalidade conciliadora, capaz de
apoiar candidatos do PSDB e do
PFL ao governo em 1998 para obter o apoio desses partidos em sua
própria campanha eleitoral.
Por outro lado, mesmo derrotado nas eleições, o ex-governador
conseguiu dar visibilidade a projetos administrativos como o programa da Bolsa-Escola.
Nesta entrevista à Folha, o ex-governador criticou o PT, poupou o senador Antonio Carlos
Magalhães e radicalizou: defendeu a moratória negociada de
uma parte da dívida interna, para
que o dinheiro possa ser investido
num programa de erradicação da
pobreza do Brasil:
Folha - O sr. acaba de lançar
um livro, "A Segunda Abolição",
em que propõe que o governo
gaste R$ 40 bilhões num projeto
de erradicação da pobreza. Não
é uma proposta inviável? De onde virá tanto dinheiro?
Cristovam - Esse país tem uma
dívida financeira com banqueiros, com fundos de pensão e com
a classe média, que tem dinheiro
aplicado em bancos. Mas tem
também uma dívida com os pobres. Vamos discutir as duas dívidas em conjunto. Vamos dizer ao
credor: "Você é um homem rico,
que vive de juros. Mas não pode
andar na rua, gasta uma fortuna
com segurança, seus filhos talvez
vivam num país em guerra civil. A
gente quer pagar a você a dívida
financeira e essa outra dívida,
moral. Para isso, você vai ter que
abrir mão de uma parte dos juros
de suas aplicações".
Folha - Para simplificar: a pessoa coloca R$ 100 no banco. Depois de um ano, tem R$ 120,
graças aos juros. Ela abriria mão
desses R$ 20, que ficariam com
o governo, e continuaria apenas
com R$ 100. É isso?
Cristovam - Há outra alternativa: as crianças morrem, ou ficam
sem escolas, e a dívida financeira
é paga em dia. A segunda alternativa: pagamos essa dívida em 20
anos. É o alongamento da dívida,
que é basicamente o que propõe o
Ciro Gomes (PPS-CE). A minha
proposta é que, além desse alongamento, que provavelmente vai
acontecer, a gente faça até uma redução da dívida. A condição é que
o dinheiro seja aplicado no setor
social.
Folha - O sr., em seu livro, elogia a Coréia do Sul por ter aberto CPI para investigar as causas
da crise econômica de 1997. Se
houver uma CPI no Brasil para
investigar as causas da fome,
ACM, que tem poder há mais de
uma década, terá que prestar
depoimento?
Cristovam - Eu acho que 160
milhões de brasileiros precisariam prestar depoimento.
Folha - Até os que estão passando fome?
Cristovam - Quem está passando fome vota. Então tem responsabilidade.
Folha - E eles diriam o que na
CPI? Pediriam desculpas pelo
voto que deram?
Cristovam - Não é pedir desculpas. É dizer: eu errei também. O
problema do Brasil é ético. Não é
um problema de fulano, sicrano
ou beltrano. Jamais eu diria que a
culpa é de Fernando Henrique
Cardoso. O que eu critico no presidente é ele não ter feito gestos
concretos para erradicar a pobreza. Ele se orgulha de um programa de renda mínima que beneficia 180 mil crianças. Fiz o Bolsa-Escola em Brasília e beneficiei 50
mil crianças, que recebiam uma
renda para frequentar as aulas.
Estou dando consultoria para um
programa parecido no Equador
que beneficiará 600 mil crianças,
numa população de 13 milhões.
Folha - O sr. faria as alianças
que FHC fez para governar?
Cristovam - Se amanhã houver
aliança a favor de um projeto do
PT, eu não vejo por que ficar contra. Vamos supor que o Lula seja
eleito presidente e o PT não tenha
a maioria dos parlamentares no
Congresso Nacional. Ou ele faz
aliança, ou ele vira um ditador.
Folha - O sr. defenderia uma
aliança com o PFL de ACM, por
exemplo?
Cristovam - A pergunta é: aliança para quê? Se for para trair os
compromissos com o povo, não
se deve fazer com ninguém. Mas,
se for para levar adiante um projeto é claro que tem que fazer.
Acho absolutamente necessário.
Folha - O sr. acredita quando o
Lula diz que não quer ser candidato a presidente?
Cristovam - Eu acredito. Toda
conversa que tenho com o Lula,
ele diz que não quer ser. Mas acho
que ele vai ter que ser. É muito difícil livrar-se do peso de 30 milhões de votos. Em segundo lugar,
nenhum outro candidato unifica
o partido. O PT vai exigir que o
Lula seja candidato outra vez.
Mesmo contra a vontade dele.
Folha - O sr. quer ser candidato?
Cristovam - Se o Lula, de fato,
não for candidato, vou disputar
uma prévia dentro do PT.
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