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São Paulo, domingo, 16 de fevereiro de 2003

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AGENDA PETISTA

Dos deputados petistas, 42% se opõem ao projeto de Palocci

Autonomia do BC divide a bancada do PT na Câmara

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Levantamento feito pela Folha mostra que a bancada do PT na Câmara está dividida -quase exatamente ao meio- em relação ao projeto de autonomia para o Banco Central, prioridade legislativa mais imediata da equipe econômica. Foram procurados, na semana passada, todos os 92 deputados petistas. Entre os 72 encontrados, 30 se manifestaram contra a proposta, 28 a apoiaram e 14 preferiram não opinar.
A partir dos números e dos nomes listados (ver quadro nesta página), o primeiro sinal é o de que as resistências à idéia de conceder mandatos fixos de quatro anos ao presidente e aos sete diretores do BC vão além de um pequeno grupo ultra-radical do partido.
A proporção dos contrários, quase 42% dos entrevistados, supera o peso usualmente atribuído a todas as correntes da esquerda do PT, estimadas em um terço da bancada. Nomes mais associados às alas moderadas engrossam a relação, casos de Luiz Eduardo Greenhalgh (SP), Doutora Clair (PR), Durval Orlato (SP), Eduardo Valverde (RO), Luiz Alberto (BA) e Zico Bronzeado (AC).
Ouvindo o que todos têm a dizer, os números ganham outro colorido. Parte dos críticos ressalva estar "aberta ao debate" -o que soa como uma obviedade, mas no dialeto petista indica um aceno para o governo. "Acho que não se deve dar autonomia [ao BC", mas não é uma questão de vida ou morte", afirma, por exemplo, Francisca Trindade, deputada mais votada no Piauí.
Tampouco é fácil encontrar grandes convicções do outro lado, especialmente entre os deputados mais distantes da cúpula. Entre os favoráveis, há argumentos que vão de "um voto de confiança em Lula" à compreensão sobre o "momento difícil em que vive o país". Na turma do muro, a maioria alega que é preciso aguardar os debates internos do partido. Outros, como Sigmaringa Seixas (DF), se preocupam com a repercussão de suas declarações: "Sou vice-líder da bancada. Tenho de pensar melhor sobre isso".

Apoio frio ou impasse
Tudo somado, na melhor das hipóteses para o governo, a bancada dará apoio à autonomia sem entusiasmo e com boa dose de constrangimento; na pior, discussões prolongadas exporão publicamente as divergências internas do PT, e o impasse terá de ser resolvido de cima para baixo.
A explicação para o mal-estar dos deputados está na própria origem da proposta, inspirada em estudos desenvolvidos no governo Fernando Henrique Cardoso pelo ex-presidente do BC Armínio Fraga. Até o nome que Armínio dava ao projeto -Lei de Responsabilidade Monetária- vem sendo usado pelo ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda).
Nos seus últimos dois anos, o governo FHC testou a aceitação do texto como forma de evitar turbulências financeiras durante as eleições. Em bom português, um mandato que garantisse a permanência de Armínio à frente do BC por mais algum tempo seria a garantia de que Lula, se eleito, não promoveria mudanças substanciais na economia.
De início, o PT rejeitou com veemência a idéia, considerada uma tentativa de dar continuidade às políticas ortodoxas que combatia. À medida que Lula se aproximava da vitória, a autonomia passou a ser tratada como medida a ser adotada após a mudança de governo. A aceitação, sem meias palavras, veio com a indicação de Henrique Meirelles para o BC.

Tarefa de Palocci
Palocci voltará na próxima semana a se reunir com a bancada, com a tarefa de convencer os deputados de que o objetivo da autonomia não é afastar o governo Lula das políticas de juros e de câmbio e, assim, acalmar o mercado financeiro.
O projeto é simples: os dirigentes do BC, após serem aprovados pelo Senado, ganham mandatos de quatro anos, não coincidentes entre si. A partir daí, só podem ser demitidos em situações especificadas em lei, como improbidade administrativa ou descumprimento de metas fixadas.
O ministro alega que não se trata de dar liberdade plena ao BC. De fato, diz, é precisamente o oposto. O BC seguiria regras determinadas pelo governo e teria de prestar contas regularmente ao Congresso e à sociedade. Os radicais não concordam. "A sensação é que estão tentando aprisionar o governo, tirar o poder do Lula", diz Lindberg Farias (RJ). "Isso é abrir mão da política econômica", reforça Ivan Valente (SP).
O ex-guerrilheiro Fernando Gabeira (RJ), considerado um independente no PT, é um dos que dão apoio mais convicto à idéia. "Considero o princípio correto", afirma, citando como exemplo positivo o do banco central alemão, um dos mais independentes do mundo. A independência plena é rejeitada por Palocci. (GUSTAVO PATÚ, LEONARDO SOUZA, RICARDO WESTIN e MÁRCIO PACELLI)


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