São Paulo, quarta-feira, 16 de março de 2005

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QUESTÃO INDÍGENA

Entidade acusa Funasa de minimizar o problema nas aldeias, próximas da fronteira com Colômbia e Peru

Desnutrição afeta 19 kanamaris, diz conselho

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

O Civaja (Conselho Indígena do Vale do Javari, no Amazonas) divulgou ontem a relação de 19 crianças das aldeias dos kanamaris que estariam em estado grave de desnutrição. O comunicado é uma resposta às recentes declarações da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) minimizando o problema no vale, próximo da fronteira com Colômbia e Peru.
O comunicado traz a lista com nome, data de nascimento, peso e altura das 19 crianças. Os dados, segundo o coordenador-geral do Civaja, Jorge Marubo, foram coletados na terça da semana passada por técnicos do DSEI (Distrito Sanitário Especial Indígena, da Funasa) no Vale do Javari.
Uma das crianças citadas é um bebê de um ano, identificado como Dulce Kanamari, com 6 kg e 59 cm de altura. Segundo o médico Renato Yamamoto, da Sociedade Brasileira de Pediatria, especialista em saúde da criança indígena, os indicadores da menina apontam desnutrição grave.
Em alguns casos, o peso é tão baixo que o médico desconfia que tenha havido erro de digitação. Um menino de cinco anos e dois meses, Davi Kanamari, teria 79 cm e 9 kg. "Com esse peso, ele já teria morrido", diz Yamamoto.
O diretor nacional de Saúde Indígena da Funasa, Alexandre Padilha, confirmou que os indicadores de peso e altura foram medidos pela equipe do Ministério da Saúde. Segundo Yamamoto, parte dos dados da lista são coerentes com o quadro de desnutrição de moderado a grave, mas outros mostram incoerência entre altura e peso. Este seria o caso de Francisco Kanamari, de 13 meses de idade, 5 kg e 73 cm.
De acordo com o médico, a criança apresenta altura pouco abaixo do normal, de cerca de 77 cm, segundo o NCHS (Nation Center for Health Statistics), enquanto o peso está 50% abaixo do indicado. "Há uma correlação entre peso e altura. O baixo peso afetaria, necessariamente, o crescimento", diz ele.

Barcos parados
Os kanamaris vivem em aldeias dispersas e somam cerca de 900 pessoas, segundo o Civaja. Em todo o vale vivem 3.281 índios, de sete etnias. Jorge Marubo afirmou que em novembro de 2004 nove crianças kanamaris morreram de desnutrição. Ele disse que o Civaja desconhece o motivo do problema e que "certamente não é por falta de comida, porque há peixes, farinha, mandioca e açaí em abundância na região". Para ele, é preciso pesquisar as causas.
A Funasa sustenta que esse número refere-se ao total de mortes de crianças desnutridas em 2004, não apenas em um mês. O Civaja reafirma, porém, que ocorreram dentro de 15 dias, em novembro.
Segundo o coordenador, a desnutrição infantil está ficando dramática nas aldeias kanamaris. Marubo disse que o Civaja tem denunciado a situação, em vão, porque faltam remédios, equipamentos e meios de transportes. Ele disse que quatro barcos adquiridos pela Funasa no ano passado nunca saíram do cais da cidade de Atalaia do Norte.
O comunicado acusa a Funasa de não ter cumprido acordo firmado em junho de 2004 com os índios para melhoria da assistência médica e que há epidemia de malária em quase todas as aldeias, além de casos de hepatite. O texto diz que os cargos administrativos da Funasa são ocupados por pessoas sem experiência em saúde.


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